MARC BLOCH - “Apologia da História”
O escritor francês Marc Bloch (1886-1944) escreveu o livro “Apologia da História” ou “O Ofício do Historiador”, imprimindo a legitimidade desta Ciência. Com suas buscas, análises, observações, questões e críticas, ele produziu interessantes e inovadoras propostas teóricas e metodológicas para o entendimento da mesma. Suas convicções: “a obrigação de o historiador difundir e esclarecer”, e “é preciso ter gosto apaixonado pelas origens, pela gênese para se ter alma de historiador”.
A História trata em si da trajetória do Homem acima de tudo, e por incrível que pareça, a sua gênese só se deu após o estudo das Ciências da Natureza.
No primeiro capítulo “A História, os homens e o tempo” o autor explica a escolha do historiador, o seu tempo histórico e o homem presente em todas as eras. “Os gregos e os latinos, nossos primeiros mestres, eram povos historiográficos. E, as religiões encarregaram-se de contar a História; sobretudo a História religiosa Católica tratou de contar e recontar os feitos dos séculos passados”(p.02). Quando queremos descobrir alguma realidade de hoje, nada mais certo que buscar o que se passou, as suas causas, ou seja, é imprescindível a educação da sensibilidade histórica e a compreensão do passado. “Por trás dos grandes vestígios sensíveis da paisagem (os artefatos ou máquinas), por trás dos escritos aparentemente mais insípidos e as instituições aparentemente mais desligadas daqueles que a criaram, são os homens que a história quer capturar”(p.54).
No segundo capítulo: “A observação histórica” o autor nos diz que há a exigência de uma apurada análise dos documentos sobre fatos antigos que existam e persistam, e que testemunhem fatos de determinadas épocas. “O historiador, por definição, está na impossibilidade de ele próprio constatar os fatos que estuda. Nenhum egiptólogo viu Ramsés; nenhum especialista das guerras napoleônicas ouviu o canhão de Austerlitz. Das eras que nos precederam, só poderíamos, portanto, falar segundo testemunhas. [...] Que haja nessas observações uma parte de verdade, ninguém pensará em negá-lo. Elas exigem, no entanto, serem sensivelmente nuançadas”(p.69). O conhecimento da humanidade é baseado em testemunhas e resquícios do passado que nos oferecem histórias, testemunhos escritos e não-escritos do que tanto queremos desvelar.
No terceiro capítulo “A Crítica” Bloch ressalta que não podemos ser ingênuos, pois as palavras das testemunhas ou de testemunhos históricos nem sempre são dignas de crédito. Relatos podem ser falsos, vestígios materiais podem ser falsificados. É natural que acreditemos no narrador que traz por caminhos diversos os rumores e acontecimentos de terras longínquas, mas é preciso investigar. Portanto, “A crítica do testemunho, que trabalha sobre realidades psíquicas, permanecerá sempre uma arte da sensibilidade”(p.109) A sociedade em seu concerto social é tecido de uma malha ruidosa e complexa, e assim a crítica deve mover-se entre a similitude que justifica e a que desacredita, para então, investigar e descobrir a verdade dos fatos.
No quarto capítulo “A análise histórica” vemos que é necessário a imparcialidade como historiadores, pois fazemos o papel de cientistas e também de juízes de determinados fatos ou ocorrências que compõem uma história. Nada de distorções nas narrativas, nossa finalidade é a verdade e a compreensão dos fatos.
“Não digamos que o historiador é alheio às paixões; ao menos, ele tem esta. Palavra, não dissimulemos, carregada de dificuldades, mas também de esperanças. Palavra, sobretudo, carregada de benevolência. [...] Ela é uma vasta experiência de variedades humanas, um longo encontro de homens” (p.128).
Bloch fala de uma constante evolução da linguagem que pode transformar a realidade, e também, de seus temores quanto aos eflúvios emotivos de que tantas das palavras nos chegam carregadas, ou seja, o poder dos sentimentos humanos pode favorecer a imprecisão da linguagem. Existe a peridiocidade das gerações que são bem irregulares, as vicissitudes humanas que são muito diversas, as vivências de cada ser que são muito únicas, e as sociedades que são estruturas bastante complexas, isto tudo com tonalidades e padrões próprios.
No quinto capítulo foram agregadas cinco folhas de manuscritos do autor. Bloch argumenta da necessidade do entendimento das relações de causa e efeito.
“Se a metafísica da casualidade está aqui fora de nosso horizonte, o emprego da relação causal, como ferramenta do conhecimento histórico, exige incontestavelmente uma tomada de consciência crítica”(p.155). As longas peripécias, a presença de vários acontecimentos, a existência da dinâmica da vida, as leis e os fenômenos do Universo, tudo nos conduz a um desfecho, a uma História. Temos que admitir, de boa-fé, uma subordinação de nossas perspectivas ao ângulo próprio da investigação para a conclusão de uma verdade histórica. Nas palavras de Bloch: “A partir do momento em que uma reação da inteligência ou da sensibilidade não for natural, ela exige, por sua vez, caso se produza, que nos esforcemos por descobrir suas razões. Resumindo tudo, as causas, em história como em outros domínios, não são postulados. São buscadas” (p.159).
Marc Leopold Benjamin Bloch foi fuzilado na França pelos nazistas em 1944.
Editado por Jorge Zahar Editor, 2001.
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__Izabella Pavesi__
O escritor francês Marc Bloch (1886-1944) escreveu o livro “Apologia da História” ou “O Ofício do Historiador”, imprimindo a legitimidade desta Ciência. Com suas buscas, análises, observações, questões e críticas, ele produziu interessantes e inovadoras propostas teóricas e metodológicas para o entendimento da mesma. Suas convicções: “a obrigação de o historiador difundir e esclarecer”, e “é preciso ter gosto apaixonado pelas origens, pela gênese para se ter alma de historiador”.
A História trata em si da trajetória do Homem acima de tudo, e por incrível que pareça, a sua gênese só se deu após o estudo das Ciências da Natureza.
No primeiro capítulo “A História, os homens e o tempo” o autor explica a escolha do historiador, o seu tempo histórico e o homem presente em todas as eras. “Os gregos e os latinos, nossos primeiros mestres, eram povos historiográficos. E, as religiões encarregaram-se de contar a História; sobretudo a História religiosa Católica tratou de contar e recontar os feitos dos séculos passados”(p.02). Quando queremos descobrir alguma realidade de hoje, nada mais certo que buscar o que se passou, as suas causas, ou seja, é imprescindível a educação da sensibilidade histórica e a compreensão do passado. “Por trás dos grandes vestígios sensíveis da paisagem (os artefatos ou máquinas), por trás dos escritos aparentemente mais insípidos e as instituições aparentemente mais desligadas daqueles que a criaram, são os homens que a história quer capturar”(p.54).
No segundo capítulo: “A observação histórica” o autor nos diz que há a exigência de uma apurada análise dos documentos sobre fatos antigos que existam e persistam, e que testemunhem fatos de determinadas épocas. “O historiador, por definição, está na impossibilidade de ele próprio constatar os fatos que estuda. Nenhum egiptólogo viu Ramsés; nenhum especialista das guerras napoleônicas ouviu o canhão de Austerlitz. Das eras que nos precederam, só poderíamos, portanto, falar segundo testemunhas. [...] Que haja nessas observações uma parte de verdade, ninguém pensará em negá-lo. Elas exigem, no entanto, serem sensivelmente nuançadas”(p.69). O conhecimento da humanidade é baseado em testemunhas e resquícios do passado que nos oferecem histórias, testemunhos escritos e não-escritos do que tanto queremos desvelar.
No terceiro capítulo “A Crítica” Bloch ressalta que não podemos ser ingênuos, pois as palavras das testemunhas ou de testemunhos históricos nem sempre são dignas de crédito. Relatos podem ser falsos, vestígios materiais podem ser falsificados. É natural que acreditemos no narrador que traz por caminhos diversos os rumores e acontecimentos de terras longínquas, mas é preciso investigar. Portanto, “A crítica do testemunho, que trabalha sobre realidades psíquicas, permanecerá sempre uma arte da sensibilidade”(p.109) A sociedade em seu concerto social é tecido de uma malha ruidosa e complexa, e assim a crítica deve mover-se entre a similitude que justifica e a que desacredita, para então, investigar e descobrir a verdade dos fatos.
No quarto capítulo “A análise histórica” vemos que é necessário a imparcialidade como historiadores, pois fazemos o papel de cientistas e também de juízes de determinados fatos ou ocorrências que compõem uma história. Nada de distorções nas narrativas, nossa finalidade é a verdade e a compreensão dos fatos.
“Não digamos que o historiador é alheio às paixões; ao menos, ele tem esta. Palavra, não dissimulemos, carregada de dificuldades, mas também de esperanças. Palavra, sobretudo, carregada de benevolência. [...] Ela é uma vasta experiência de variedades humanas, um longo encontro de homens” (p.128).
Bloch fala de uma constante evolução da linguagem que pode transformar a realidade, e também, de seus temores quanto aos eflúvios emotivos de que tantas das palavras nos chegam carregadas, ou seja, o poder dos sentimentos humanos pode favorecer a imprecisão da linguagem. Existe a peridiocidade das gerações que são bem irregulares, as vicissitudes humanas que são muito diversas, as vivências de cada ser que são muito únicas, e as sociedades que são estruturas bastante complexas, isto tudo com tonalidades e padrões próprios.
No quinto capítulo foram agregadas cinco folhas de manuscritos do autor. Bloch argumenta da necessidade do entendimento das relações de causa e efeito.
“Se a metafísica da casualidade está aqui fora de nosso horizonte, o emprego da relação causal, como ferramenta do conhecimento histórico, exige incontestavelmente uma tomada de consciência crítica”(p.155). As longas peripécias, a presença de vários acontecimentos, a existência da dinâmica da vida, as leis e os fenômenos do Universo, tudo nos conduz a um desfecho, a uma História. Temos que admitir, de boa-fé, uma subordinação de nossas perspectivas ao ângulo próprio da investigação para a conclusão de uma verdade histórica. Nas palavras de Bloch: “A partir do momento em que uma reação da inteligência ou da sensibilidade não for natural, ela exige, por sua vez, caso se produza, que nos esforcemos por descobrir suas razões. Resumindo tudo, as causas, em história como em outros domínios, não são postulados. São buscadas” (p.159).
Marc Leopold Benjamin Bloch foi fuzilado na França pelos nazistas em 1944.
Editado por Jorge Zahar Editor, 2001.
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__Izabella Pavesi__