Nas comemorações rituais da Páscoa, os rabinos faziam muitas representações que buscavam refletir antigas tradições e transmitir ensinamentos considerados fundamentais para a educação dos jovens de Israel. Usavam-se parábolas, como as do filho pródigo, do filho obediente, do filho sensato, do homem temente a Deus, do ímpio, do homem que confia acima de tudo, nos desígnios do Senhor, etc., como recurso pedagógico para ensinar à juventude as coisas que deviam aprender. Uma dessas representações era o drama de Jó, um clássico entre essas peças. Seu objetivo era mostrar que os desígnios de Jeová são insondáveis e que é inútil ficar procurando causas para as dores e os fracassos que colecionamos na nossa jornada pela terra. Tanto quanto as alegrias e os sucessos, elas fazem parte do quinhão que nos é dado junto com a vida. São respostas colocadas na própria natureza, na forma de leis imutáveis e eternas, que às criaturas humanas cabe cumprir sem questionar.
A idéia inserta nesse pressuposto é a de que não há justiça nem injustiça nas coisas que acontecem conosco, por que esses conceitos, quando estão afeitos ao julgamento da Divindade, não se prestam a ser analisados à luz da sabedoria humana. A sabedoria do homem vê como bom e justo apenas aquilo que lhe serve, que lhe causa prazer e alegria, e proclama como mau e injusto tudo aquilo que não lhe trás os resultados que almeja. Assim, bem e mal, justiça e injustiça, certo e errado, tudo acaba sendo uma questão de opinião, finalidade e resultado – obter prazer e evitar a dor, enfim –, pois tudo se resume numa forma de sentir-se bem ou mal com aquilo que nos é dado obter na vida. Destarte, aceitar tudo que nos vem, de boa mente – apenas como resultados, bons ou ruins, das nossas ações –, é a melhor sabedoria que se pode cultivar.
Boa parte das parábolas e metáforas que fizeram a fama do filho de Maria foi extraída dessas narrativas, que refletiam a sabedoria singela e natural do homem simples do campo e da gente humilde da cidade. O abandono à Providência Divina, a confiança cega e irrestrita na intervenção de Jeová, a incapacidade do homem em modificar a lei por Ele posta na natureza, etc., coisas que ele ensinou em seu ministério, estavam todas refletidas naquelas figurações que se faziam nas sinagogas.
E estavam presentes, também, nos contos e nas parábolas que os velhos contadores de histórias narravam a um público atento e contrito, junto às fogueiras que se acendiam nas praças públicas e nos acampamentos dos peregrinos que erguiam suas tendas nos hortos vizinhos a Jerusalém naquelas ocasiões.
Para o filho de Maria, essa parecia ser a melhor forma de transmitir sabedoria. Pelos menos essa era a maneira pela qual ele melhor entendia o que queriam dizer os arautos da Vontade de Jeová, tanto aqueles que escreveram a lei e a história do povo que Ele escolhera para o seu favor, quanto os profetas e os rabis que surgiam de tempos em tempos para não deixar o povo esquecer-se dela.
Diga-se que a cabeça do adolescente estava cheia dessas histórias e era delas que ele mais gostava. Guerreiros, heróis, juízes, reis, profetas, eclesiásticos, enfim, todos que faziam história ou formavam opinião em Israel, eis os focos de interesse do menino. Foi por isso que, afastando-se dos demais membros da família, que procuram o ofício no Templo para ali fazer as oferendas da tradição, o menino acaba indo parar numa sinagoga onde um rabino fala da lei e dos escritos proféticos a um grupo de estudantes, usando parábolas, metáforas e comparações para explicar a eles o sentido desses escritos. Ali, sua atenção é presa pelo discurso do eclesiástico que preside aquela assembléia, e então ele entra e senta-se no meio deles para ouvir, esquecendo tudo o mais.

Convergência de interesses é o que parece acontecer entre o menino galileu e o rabino que oficia naquela sinagoga. A impressão que o garoto tem é que tudo aquilo que seu coração sempre procurou está na fala daquele eclesiástico. Nada mais tem nenhuma importância, além do fato de estar ali, ouvindo as lições daquele professor. Um fala com uma incontida ênfase, o outro escuta com extasiado interesse. Os olhos dos dois, entretanto, não se afastam um do outro, como se somente eles estivessem presentes naquele encontro.
Olhando para o filho de Maria e José de Arimatéia, porquanto esse é o nome do professor daquela sinagoga onde o menino agora está, dir-se-ia que eles se conhecem de longa data. O professor sequer cogitou de perguntar-lhe por que está ali, nem quem era aquele menino desconhecido, que não fazia parte do seu quadro de alunos. Sua presença naquele local lhe parece natural, da mesma forma que ao menino, a sensação é que há muito tempo faz parte daquele grupo.
José de Arimatéia explica, com singelas figurações, a sabedoria das escrituras a um grupo de jovens sentados nos bancos da sinagoga, e estes o escutam com particular reverência. Fala das esperanças de Israel e da vinda do Libertador. Um ser poderoso em palavras e ações, que fortalecerá o espírito e os braços do povo de Deus. Busca nas escrituras os trechos que confirmam as profecias e pede a cada um dos estudantes que faça a leitura.

– Eis aqui o meu servo escolhido, em quem a minha alma se compraz: sobre ele estará o meu espírito para anunciar aos gentios o verdadeiro juízo. Não contenderá nem clamará, nem fará ouvir a sua voz pelas ruas. Não esmagará a cana quebrada nem apagará o fogo da acha que arde, até que o juízo seja triunfante. Em seu nome os gentios esperarão – lê o primeiro.
– Porquanto, já um pequeno se acha nascido para nós e um filho foi dado a nós; e foi posto o principado sobre seu ombro. E o seu nome será admirável: conselheiro, Deus forte, pai do futuro século, príncipe da paz (...) – continua o segundo.
– Eis que uma virgem conceberá e dará luz a um filho e será chamado seu nome Emmanuel: Ele comerá manteiga e mel até que aprenda a rejeitar o mal e escolher o bem – fala o terceiro.
E assim prosseguem os estudantes, um a um, recitando os oráculos messiânicos.
– E sairá uma vara do tronco de Jessé e uma flor brotará da sua raiz; e descansará sobre ele o espírito do Senhor: espírito de sabedoria e de entendimento, espírito de conselho e fortaleza, espírito de ciência e de piedade (.....) mas julgará os pobres com justiça, e argüirá com equidade em defesa dos mansos da terra; e ferirá a terra com a vara da sua boca e matará o ímpio com o assopro dos seus lábios. E a justiça será o cinto dos seus lombos e a fé o talabarte dos seus rins (...)
– Eis aí está que meu servo terá inteligência, ele será exaltado e elevado e ficará em alto grau, sublimado. Assim como pasmaram muitos à vista de ti, assim será sem glória o seu aspecto, entre os varões, e sua figura diante dos homens (...)
– Verdadeiramente, ele foi o que tomou para si as nossas fraquezas e ele mesmo carregou com as nossas dores. E nós o tratamos como um leproso e foi ferido e humilhado (...)
– Aquele mesmo justo meu servo justificará a muitos com sua ciência e ele tomará para si as suas iniqüidades. Por isso lhe darei por sorte uma grande multidão de pessoas: e ele distribuirá o despojo dos fortes, porque entregou sua alma à morte, e foi posto no número dos malfeitores: e ele carregou com os pecados de muitos e rogou pelos transgressores da lei (...)
– O espírito do Senhor repousou sobre mim porque o Senhor me encheu da sua unção: Ele me enviou para evangelizar os mansos, para curar os contritos de coração, para pregar remissão aos cativos e soltura aos encarcerados –, lê o filho de Maria, para quem o Livro Sagrado havia sido passado.
E os olhos da assembléia se voltam para ele, pois ninguém ali o conhece. Somente naquele momento os estudantes se dão conta de que há um estranho na classe. Um constrangido silêncio segue-se ao ato.
– Continuem a leitura –, comanda José de Arimatéia, quebrando o clima que se instala no recinto. O menino desconhecido passa o livro para outro estudante, que dá prosseguimento à leitura.
– Eis ai, vem os dias, diz o Senhor: e eu suscitarei a Davi um germe justo. E reinará um rei que será sábio, e obrará segundo a justiça e a equidade na terra –, continua outro estudante.
– E vós, filhos de Sião, exultai e alegrai-vos no Senhor vosso Deus: porque ele vos deu um doutor, que vos ensinará a justiça e fará descer sobre vós, como no princípio, uma chuva temporã e sadia (......), – recita o próximo.
– E tu Belém, Efrata, és pequenina entre os milhares de Judá! Mas é de ti é que deverá sair aquele que há de reinar em Israel e cuja geração é desde o princípio, desde os dias da eternidade (....) –, lê o seguinte.
– Salta de extremado prazer, ó filha de Sião, enche-te de júbilo, ó filha de Jerusalém! Eis aí, o teu rei virá a ti, justo e salvador! Ele é pobre, e vem montado sobre uma jumenta, e sobre o potrinho da jumenta (...)
E dessa forma o livro continua passando de mão em mão até que o último dos oráculos messiânicos é lido. Então José de Arimatéia torna a falar e a explicar o que significam esses oráculos e nenhum dos estudantes volta a se preocupar com o estranho que se intrometera entre eles. A partir daquele momento, tudo se passa como se ele tivesse se tornado um deles. Mas a José de Arimatéia não passara despercebida a presença daquele garoto em sua classe e nem o fato de justamente aquele versículo ter caído para leitura dele.

Quem um dia já passou por uma praça pública, ou pela porta de uma igreja onde um pregador faz o seu discurso, e sentiu que as palavras que estão sendo ditas ali são para ele, pode entender o que se passa na cabeça daquele rapazinho, naquele momento. As palavras do oráculo, que ele leu, lhe causam uma estranha impressão. Era o único, entre as profecias messiânicas, que estavam escritas na primeira pessoa, como se o próprio executor da ação as tivesse escrito. Por que justamente a ele, um estranho entre aqueles candidatos ao rabinato, teria cabido justamente aquele oráculo? Mas as coisas que ali se dizem, a sabedoria que ali se ensina logo desviam sua atenção e ele abandona suas cismas, para participar, de corpo presente, daquela assembléia.
Ali está ele, naquela sinagoga, no segundo ano do governo do prefeito romano Ânio Rufo, no sexto dia da Páscoa judaica, a ouvir um professor que se chama José, fariseu natural de Arimatéia, também galileu como ele, mas de muito nome e prestígio entre os judeus. Além de ser um dos mais respeitados rabinos de Jerusalém, é também irmão de um famoso patriota, que nesse momento passa por ser o mais ferrenho dos inimigos de Roma: Judas Galileu.
De certo que o filho de Maria desconhece esses pormenores e se os conhecesse talvez pouca diferença fizesse, porquanto ele sequer suspeita dos laços que o ligam a esses personagens. E enquanto o restante da sua família aproveita as festividades do Pessach, o menino deixa-se ficar entre os estudantes do Templo e de nada mais se ocupa senão do que é discutido ali.
A tenda onde eles estão acampados está armada em um horto de oliveiras que cobre toda a enorme colina que fica a cerca de um quilômetro, ao norte de Jerusalém. Dali é possível avistar toda a parte baixa da cidade e a extensão total da muralha ocidental. Desse ponto se tem uma vista maravilhosa do majestoso Templo de Herodes, imponente sobre a Rocha do Domo, e do soturno castelo que a ele está ligado através do grande pátio onde se realiza a feira. O castelo é a fortaleza chamada Antônia, onde os soldados da guarda romana do atual prefeito, Ânio Rufo, ficam aquartelados. Essa fortaleza também foi construída por Herodes, o Grande, com o objetivo de aquartelar tropas capazes de reprimir, com o máximo de rapidez e eficiência, qualquer motim que pudesse acontecer em Jerusalém. Não era, pois, sem motivo, que ela ficava bem em frente ao átrio do Templo, pois qualquer rebelião, quando acontecesse, certamente começaria ali.
O Horto onde eles estão acampados se chama Getsemâni e dali se pode ter uma vista geral de Jerusalém. É um amontoado de construções sobre uma colina, cercada de muros por todos os lados. Seu desenho assemelha-se a um alce encurralado sobre um morro, esperando a hora de ser abatido. Cruel metáfora que tem sido cumprida com rigorosa regularidade! Assim tem sido ao longo do tempo.
Ali está a cidade altaneira, derramada sobre as colinas, renovada, agora com a nova administração romana erguendo novas obras, como o circo que o prefeito anterior, Mário Ambívio, mandou construir na cidade alta para dotar os bons cidadãos de Jerusalém desses lazeres tão agradáveis aos frívolos romanos e tão desprezíveis aos austeros judeus, como são esses jogos onde gladiadores lutam contra feras e contra outros gladiadores, e onde outras competições, como corridas de bigas, briga de galos, corrida de cães e outros espetáculos, acontecem. Dali se vê, também, que as muralhas foram reconstruídas e ampliadas para incluir os novos bairros que se derramam para o sul e para o oeste, onde os prósperos cidadãos de Jerusalém, comerciantes em sua maioria, que enriqueceram com a vinda dos romanos e o cosmopolitismo que invadiu a cidade depois disso, constroem suas espaçosas e ricas vivendas, ao estilo das que se vêem em Roma, Èfeso, Corinto, Alexandria e nas outras grandes cidades do império. Dali se vê também os novos edifícios construídos para abrigar o tribunal e o fórum, e também o formoso palácio que foi construído por Herodes para lhe servir de moradia em Jerusalém, prédio que agora está sendo ocupado pelo atual prefeito romano.
Eis uma cidade que vivera e viveria ainda uma sucessão de ascensões e quedas, uma urbe que morreria a cada par de séculos e ressuscitaria no ano seguinte à sua morte, cada vez maior, mais vigorosa, mais febricitante. Porque ela não era simplesmente um conglomerado de pessoas e edifícios, mas uma alma, um coração, um sonho e um símbolo que vivia, menos nas instituições que a governavam, ou na importância política que representava, mas no próprio espírito de um povo que se recusava a ser extinto, como já o foram tantos outros, mais fortes, mais poderosos, que haviam atingido o seu apogeu e agora eram apenas registros nas páginas da História.

Jerusalém talvez fosse um pensamento na mente de Jeová, como diziam os judeus; e um pensamento, uma vez gerado, não se extingue, porque fica gravado para sempre na memória de quem o gerou e na daqueles a quem foi comunicado. Pode ser esquecido, pode ser desprezado, superado, negligenciado, mas sempre estará vivo quando for recuperado e quando isso acontecer, renascerá mais forte, mais encorpado, mais vibrante. E deles é feita a nossa história sobre a terra, pois somos todos pensamentos que superam a si mesmos cada vez que nos manifestamos em obras.
Mais uma vez é preciso informar que essas meditações não vêm da cabeça de Maria, é claro, que de ordinário não tem condições para fazê-las, desprovida que é da capacidade especulativa que a mente das pessoas de muitas letras adquire, por conta das tantas informações que registra diariamente. Nem foram do seu filho que, entrando nos seus tenros treze anos de idade, se tanto, não as poderia fazer, ainda que sensibilidade para isso já tivesse. E talvez informação também, porquanto ele sabe que essas escadarias íngremes que sobe correndo, na excitação que lhe provoca a curiosidade, essas ruas estreitas pelas quais anda, e que um dia percorrerá em condições extremamente dramáticas, já foram pisadas por egípcios, caldeus, persas, sírios, partas, romanos e outros tantos exércitos gentios, que não se cansam de calçar com seus pés o orgulho dos filhos de Israel, talvez para castigo destes por ousar reivindicar a condição de povo escolhido Daquele que eles pensam ser o único e verdadeiro Deus do universo. Eis ai uma afronta que irmão nenhum pode suportar, pois coisa mais revoltante não há, que essa de um filho que tenta usurpar para si, somente, o amor de um pai.
Também é preciso que se repita que quem faz tais elucubrações é o cronista que essa visão registra, pois ele vê na saga dessa cidade a metáfora viva da própria humanidade, que gera e mata seus deuses, mutila seus profetas, atraiçoa seus heróis e desterra seus santos, sempre sabendo que morrerá e renascerá, tantas vezes quantas forem necessárias, para cumprir seu ignoto destino. Se a história desse aglomerado de construções plantadas sobre as colinas e das gentes que as construiu e as destruiu, e as reconstruiu de novo, não for suficiente para explicar o eterno conflito em que vive esse nosso mundo, na procura do seu destino, pelo menos faz pensar ao observador sensível, que nada é gratuito na vida dos povos e há sempre uma relação de causa e conseqüência em tudo que acontece.
Destarte, se quisermos avançar um pouco mais nas coincidências significativas que existem nesta história, diríamos que essas especulações valem também para a vida desse menino, que ouve com curiosa atenção as parábolas contadas por José de Arimatéia. E aos poucos vai ganhando confiança para perguntar e responder, ele mesmo, a questões que há algum tempo andam perturbando a sua mente, que vê-se agora, já rompeu os limites da adolescência e apresenta um amadurecimento muito precoce que causa admiração na douta assembléia que ali se reúne.
Foi por conta desse acontecimento que se escreveu mais tarde que o filho de Maria se perdera em Jerusalém por ocasião das festividades de Pessach e que sua família, a princípio, não se dera conta disso. Isso é verdade, porquanto foi só depois de algum tempo, já a caminho de Nazaré, que seus parentes perceberam que o menino não estava no séqüito que deixara a cidade santuário para voltar à Galiléia. Eram muitas as pessoas da romaria – só de Nazaré mais de duzentas –, e a dificuldade para localizar alguém em meio a uma multidão dessas, centenas, milhares de pessoas, formando um verdadeiro formigueiro humano espalhado por muitos quilômetros de estrada, fez com que eles não dessem logo pela falta dele. Comprovada, no entanto, a sua ausência no grupo de pessoas de Nazaré e não o encontrando na multidão que ocupava a estrada, Maria e Judas regressaram à cidade e depois de três ou quatro horas de procura conseguiram encontrá-lo no meio dos estudantes, que alguém disse já serem escribas e doutores da lei, mas verdade seja dita que ainda não o eram, embora, de qualquer forma, algo estivesse certo nessa informação, porquanto eles ali estavam discutindo artigos da doutrina.
Assim, é de se reconhecer que quem deu essa informação não contou inverdades, porque foi depois de uma frenética e cansativa procura por todos os possíveis lugares onde um menino daquela idade poderia estar que Judas o encontrou, na ala do Templo onde se reuniam os estudantes. E ele, a essa altura já perfeitamente ambientado naquele meio, falava com muito desembaraço das coisas que se discutiam ali, de tal maneira que todos se admiravam que um fedelho como aquele pudesse apresentar tamanha maturidade em tais assuntos. E quando Maria o admoestou pela preocupação que ele lhe causara com aquele sumiço, respondeu o menino com aquelas palavras que foram escritas: “ estou aprendendo sobre os assuntos do Pai”, assim mesmo com maiúscula na palavra Pai, o que causou em sua mãe aquela perplexidade que foi devidamente registrada pelo cronista, que disse que ela guardou em seu coração todas essas coisas.
Mais teria sido abalado seu coração se a tradição tivesse permitido que ela entrasse no recinto onde ele estava a discutir com os estudantes essas coisas. Porquanto de certo teria reconhecido o mestre que trabalhava com aquele grupo de iniciados. O que faria, como se sentiria, se fosse posta frente a frente com o fariseu José de Arimatéia, um dos “reis magos” que a visitaram por ocasião do nascimento do menino? Deixamos a resposta para quem quiser se dar ao trabalho de imaginar um tal encontro e as especulações que certamente suscitariam.
No entanto, como disse um dos cronistas oficiais, seu coração guardava todas essas coisas. Talvez o coração de Maria soubesse muito mais que a sua mente, pois de imediato sentiu que algo de muito importante ocorrera ali. E quando voltou para Nazaré, ainda sem saber o que acontecera ao seu marido, ela intuía que, dali para frente, as coisas nunca mais seriam as mesmas. Um ciclo da sua vida havia terminado para sempre e doravante ela teria que confrontar o seu destino.
O destino de mãe de um filho que ousa ser diferente! Quantas de vós, mães em todos os lugares e tempos, não foram, um dia, confrontadas com tal sensibilidade? Vós e somente vós podereis entender o que sentiu aquela mulher naquele dia.



João Anatalino
Enviado por João Anatalino em 23/05/2011
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