A Sibila
LUIS, Augustina Bessa –. A Sibila. Pontes. 2000. Romance ficcional que narra a história de três gerações da familia Teixeira, cuja figura principal é Quina, que, por seu profundo discurso de sabedoria humana, é caracterizada como uma sibila, ou seja, alguém dotada de poderes especiais em relação à previsão do futuro e à obtenção de favores divinos mediantes preces.
A Sibila é dividida em dezenove capitulos e, ao longo da narrativa pode se acompanhar da queda ao apogeu, os acontecimentos que determinam a vida da familia Teixeira e de sua propriedade: a casa da Vessada, destacando o comportamento das mulheres, que são diretamente responsáveis pela reedificação do patrimônio. Paralelamente a essa história, outras história são recuperadas, sempre na intenção de ilustrar o sistema de valores que cerca a familia Teixeira.
O romance é iniciado por um diálogo entre os primos, Germana e Bernardo, no qual, por meio do narrador descobre-se as origens de cada um deles. Bernardo “pertencia ao ramo da familia que o capitalismo ascendera ao posto imediato da intelectualidade e nisso fixara uma aristocracia”. Germana, trazia em si a tradição da terra, herdada da quinta (chácara), esta, ainda é exatamente a mesma aforados à Coroa há mais de dois séculos e que têm permanecido na sucessão direta da mesma familia de lavradores”.(p.7- 8).
Há uma ruptura narrativa e Germana passa a ser o fio condutor do que será narrado e, o narrador capta em Germana o pensamento intimo; “Ah, Quina, tão estranha, dificil, mas que não era possível recordar sem uma saudade ansiada, que fora ela?” (p. 9).
A mãe de Quina, Maria Encarnação, tinha nove anos quando conheceu o marido, Francisco Teixeira. Ela estava longe de casa e não conseguia atravesar um córrego que se avolumara devido a chuva. Ele passava por lá e levou-a ao pai e, pediu que acautelasem dela, pois era com ela que iria se casar. As irmãs de Maria casaram, todas e, Balbina, a mais velha foi escolhida mais tarde, para ser madrinha de Quina. Seu único irmão José emigrara para longe e fêz fortuna.
Francisco Teixeira era, nessa época, um comquistador conhecido, um homem desejado pelas moças em disponibilidade. Onze anos mais tarde, ele se casa com Maria Encarnação, às escondidas, ele, para fugir de um compromissso com Isidra, que estava grávida, “soberba de posição e haveres, esquisita, que fora criada sem a compaixão de mãe”; ela porque o amava
Apesar de Francisco Teixeira ter rompido com Isidra, a criança esperada preocupava-o, chegando a pagar espiões para vigiá-la na propria casa e, por fim soube que a criança iria ser destinada “à roda”, o orfanto. Quando a criança nasceu mandou criá-la cheia de amparo, “e a quem Maria recebia mais tarde com deferências”. Isidra foi morar no Porto e casou-se velha, com um magistrado.
No entanto, Francisco não mudara. As suas aventuras eram inumeráveis e o lar era mais um pouso. Maria dava-se ao trabalho duro, corrroendo-se no inferno dos desesperos mudos. Três crianças nasceram mortas até que a primeira, Justina (Estina), viesse ao mundo graças aos conselhos de Narcisa Soqueira, visinha e amiga de Maria, isto porque, Maria nas três gestações não se alimentava corretamente, devido a tristeza que Francisco causava-lhe. Depois nasceu Joaquina Augusta (Quina), e mais outros três rapazes.
Estina crescia bonita, poupada dos trabalhos brutos da casa pela mãe, enquanto que Quina, “ desde muito nova, lidava sob estímulo da mãe, que a exigia ativa e responsável, mais do que seria de desejar em menina tão miúda. Mas ela vergava-se àquela seca disciplina que seria o remorso de Maria, se esta tivesse ócios disponiveis para tais sutilezas”. O pai pedia a mãe que a deixasse brincar, mas Maria intransigente, dizia que uma prima havia se casado aos onze anos, aos treze teve gêmeos e criou-os bem. Quina tinha raiva a prima. Entre Quina e o pai foi, aos poucos, surgindo uma secreta aliança, cumplicidade.
As vezes , para poupá-la aos serviços brutos, a tia e madrinha vinha buscar-lhe, mas. Quina não gostava de ir sem ser consultada se queria ir ou não. A madrinha de Quina, Balbina, amava as grandes relaçoes, admirava seu irmão José, que fizera fortuna e gostava de lembrar a afilhada, Elisa, que se casara com um velho rico e a fizera condessa de Monteros.
Quina, enquanto o pai não vinha, dormia com a mãe e os irmãos na mesma cama. E descobriu um dia que a mãe abria a porta a um homem, um ladrão, José dos Telhados, com o consentimento do pai, que o acolhia durante as fugas. Quina pergunta pelo homem no dia seguinte, e Francisco fica apreensivo e a mãe a repreende com furor.
Quina aos dezesseis anos, sofre de um mal, que a deixou acamada durante um ano. Sua mãe começou tratá-la diferente, seu pai a enchia de mimos, até o tio José, rico e cheio de filhas formosas, vinham, vindos do Porto, vê-la. Aqui é que Quina, passou a sentir que não poderia mais perder aqueles previlégios.” A doença fêz-se invalidez, estorvo para o regresso à vida normal que a devolveria à mediocridade e à sombra; adquiriu uma forma de se expressar sibilina e delicada, que deixava suspensos os ouvintes, as almas estremecendo numa volúpia de inquietação, curiosidade e esperança”. A partir daí, Quina, percebe que pode exercer alguma influência sobre as pessoas que a cercam.
A vida na casa da Vessada seguia, Estina crescia bonita e poupada pela mãe e se tornara confessora dela. Quina, tinha agora “um genio buliçoso”, o esforço da lógica, uma altivez masculina. Dos tres rapazes, Abilio falecera, mal passada a adolescência, recém-chegado do Brasil, nessa época, Francisco estava lutando na justiça pela causa contra a casa da Vessada. Logo depois do filho morto, morre Francisco também.
Das séries de infortúnios que assolaram a familia Teixeira, há também, a ruptura do namoro das duas irmãs; Estina, cujo namorado quando percebe a falência da familia desaparece, e Quina, renuncia ao pretendente, para que este pudesse encontrar casamento de maiores dotes, este tornando seu amigo até o final de sua vida.
João e Abel tentavam o enrriquecimento, prestes ingressarem no círculo dos burgueses, mas tinham herdado ao pai o gênio luxurioso e se entretinham a comquistar mulheres.
O processo de reconstrução econômica da casa da Vessada coube às três mulheres, mais responsáveis pelo reerguimento da propriedade, já que os rapazes tinha muito do comportamento do pai. A filha mais velha , Estina, casa-se por conveniência com Inácio Lucas e passa a viver não muito distante da família, encontrando-se com a mãe e a irmã periodicamente, quando vai ao mosteiro para assistir à missa. Estina tem dois filhos que morrem já quase moços, devido à brutalidade do pai, e uma filha, que sofre de alucinações. Apesar dos maus-tratos do marido, não abandona a casa para não desonrar a família.
Maria e Quina vivem em aliança. Aos poucos, Quina toma a frente nos negócios da familia, dedicando então a enrriquecer materialmente e, tornar-se, a cada dia, mais influente e respeitada na região.
Quando João anuncia que irá se casar, a mãe não aprova a noiva escolhida pelo filho, recebendo-a mal. Abel, o outro filho continua suas andanças pelo mundo afora, tentando fazer fortuna. De passagem pela casa da Vessada, peregrina pela comarca, fazendo visitas, reencontrando amigos, frequentando casas de autoridades. Quina o acompanha, convivendo pela primeira vez com a sociedade. Mesmo depois da partida de Abel, ela continua sendo recebida em algumas casas fidalgas, tornando-se mesmo confidente de algumas damas, entre elas, Elisa Aida, a condessa de Monteros, a qual ouvia-se falar quando era criança.
Elisa Aida, esta a convidara após viver uma intriga romanesca, na qual o desfecho, que era um não casamento, fora previsto por Quina. É essa espécie de profecia concretizada que faz com que a condessa trate Quina como “a sibila”. A casa da condessa é descrita com detalhes e a conversa entre as mulheres é variada. Ao sair da casa da condessa, Quina aproveita para visitar a irmã, Estina.
Aparecem muitos pretendentes à Quina, mesmo estando com quarenta anos, mas as suas habilidades nos negócios, que fazem prosperar a casa da Vessada, exalta sua vaidade, não em relação aos atributos físicos, mas em relação à esperteza e à psicologia com que conquista sempre mais e mais espaço, o poder de suas rezas , que, com astúcia, impressionava as pessoas que a ouviam rezar.
Narcisa Soqueira, a visinha de sua mãe, ainda insistia em querer casá-la com seu filho Augusto, este cada vez mais --“pingão e asqueroso e mais solto da língua”.
Um dia em que chovia muito e Quina acabara de lavar os pés num alguidar de barro, o carteiro se anunciou, observando, com um cartão postal na mão que nascera uma sobrinha, filha de Abel que casara com uma mulher sem muita importância. Essa sobrinha que nascera era Germana e, “o nascimento desta não lhes causava entusiasmo de maior, pois ela seria uma pequena fidalga educada e crescida em abiente diverso, e sem muitas probabilidades de que a identificassem com o proprio sangue”. Maria dizia asperamente - “Os filhos de minhas filhas , meus netos são; os filhos dos meus filhos , serão ou não’- . Quina e a mãe foram ver a menina com dois anos. Quando Germana
fez sete anos, Quina já estava arraigada ao seu coração e, Germana toma como mestras as dua mulheres, a avó e a tia Quina “e que mestras tão sábias aquelas duas mulheres, como os seus ditos saíam com um perfume de espigrama grego”(...).
Quina ensinara a sobrinha que conhecer o mal já é uma espécie de defesa, indicando-lhe que “ as coisas feias são tão próprias do mundo como as bonitas. Para a menina, a tia era de extrema sabedoria.
Maria, mãe de Quina, morre já com seus noventa e poucos anos. Depois de muito tempo doente. Ocorre o desaparecimento da filha “louca” de Estina e Inácio Lucas. Quina é chamada pela irmã para que reze pelo reencontro da sobrinha, porém é destratada pelo cunhado. A filha de Estina é encontrada morta, um mês após seu desaparecimento, em um cenário medonho: o interior de uma mina abandonada, repleta de morcegos.
Germana já contava com seus treze anos, gostava de roupas pretas, o que lhe dava um ar mais velho e senhoril. Conforme o tempo passa, o relacionamento entre sobrinha e tia, entrelaçam seus destinos, o que agradava muito ao pai, Abel, que já instigava na filha o que sentia pela tia: um carinho grande e presuroso.
João e Abel desconfiavam que a fortuna juntada por Quina fazia parte do que a mãe deixara e portanto, sentiam-se enganados. Mas Abel deixa aos poucos de pedir contas à Quina, porque acreditava que, assim, ao morrer, Quina deixaria tudo à filha Germana e, portanto, a ele próprio.
Quando morreu Elisa Aida, condessa de Monteros, veio da casa dela um criado de 28 anos que começou a trabalhar para Quina. Uns tempos depois, o moço sumiu; ao voltar, anunciou que a mulher dele morrera; era uma prostituta e lhe deixara um filho. “ Era um menino de quatro anos, belo como pastorinho de presépio. E que não falava ainda”. Quina, então, decidida e impetuosa, resolveu tomar conta daquela criança.
A criança, registrada com o nome de Emilio, ficou sendo chamada de Custódio, nome que se dá aos sem-batismo. Criou-o agarrado a saia e o pai, muito mais tarde, deixou-o e foi-se embora. Quina gostou disso. Ela ensinara o nome dos passaros, apanhava a laranja do pomar e atendia-lhe os chamados. Ele entrara definitivamente na alma de Quina.
Quando Germana, alguns anos depois foi visitar a tia e deparou com uma mulher muito diferente, a tia mudara muito, não tinha mais aquela vivacidade irônica, o desafio próprio de quem se considera, sob algum aspécto invunerável. Mas Germana entendeu aquilo, quando viu o rapaz e aquela mulher não poderia deixar de amá-lo demais: “ Quase adolescente, possuia graças dum efebo um tanto selvagem, no expectante do gesto, no movimento da cabeça que se adianta para escutar, não com interesse, mas sim ingênuo, espontâneo espanto.. (...) os seus olhos, desse azul-mediterrãneo nítido, mas não luminoso, pareciam pinceladas de guache feitas sobre uma superfície absorvente”.
Germana fora enviada pelo seu pai, para verificar o que a tia faria com o dinheiro no testamento, pois tinha medo de que a irmã deixasse para Custódio. Germana desencantou-se da tia, pois esta não a tratava mais como antes. A imnpressão que Germana tinha é que a tia não a queria ali.
Retorna para casa relatando como a tia estava ao pai, este enfureceu-se e começou a insurgir-se contra a irmã. Procurou João, este não queria saber da irmã, por ela nunca ter aceitado sua esposa na casa da Vessada e finalisou a entrevista dizendo: - “Não sou mesmo nada rico. Mas prefirto este bocado de terra, as minhas couves e os meus chinelos de corda, a viver como Quina, com toda aquela história de bruxedos e de juros ilegais.”
Custódio aprendera a dominar Quina, ora era violento ora muito doce. Furtava-lhe bens, tirava moldes das chaves de gavetas, onde acreditava exitir bens, se envolveu com pessoas que não era muito indoles. Quina conhecia-o a fundo e, sabia de todos os insucessos, mas o amava agora no fim da vida.
Quina vivia isolada devido ao envelhecimento natural e parte se devia à proteção dada a Custódio. Mesmo diante da indignação de parentes e conhecidos, ela aceita o comportamento degenerado de Custódio, que se envolve com o bandido Morte e pratica pequenos roubos.
Ela fica doente, Estina, sua irmã vem visitá-la e, assim que a irmã melhora vai embora e nunca mais volta à Vessada. Adão veio visitá-la também, e perguntou-lhe se já havia feito seu testamento. Abel seu irmão depois de nove anos sem visitá-la, apararce quando Quina já está se recuperando da doença e a convida para ir para a cidade se tratar. Segue para a cidade, se hospedando na casa de Abel, mas aproveita para visitar João e a cunhada. Três dias após sua chegada, Quina recebe uma carta de Libória, dizendo que Custódio adoecera. Quina retoma imediatamente à casa da Vessada, antes mesmo de saber os resultados de seus exames de saúde.
A saúde de Quina volta a fraquejar, desta vez, definitivamente. É quando Libória, a em¬pregada, aproveita para agoniar Custódio, lembrando a ele que, após a morte de Quina, ficará desamparado.
Quina, por sua vez, revive na memória momentos da vida familiar: a mãe, os irmãos ainda jovens, o pai. Ao receber a visita do médico, ela se recorda da condessa de Monteros, de quem ele é descendente. Custódio inquieta-se com o estado de saúde de sua benfeitora, chegando mesmo a perguntar a ela o que será dele após sua morte. Libória aumenta a perturbação de Custódio, contando casos de miseráveis e mendigos que perambulavam pelas ruas da aldeia.
Custódio muda de comportamento, passando a agir com interesse e cuidados em relação à Quina e à propriedade da Vessada. Constante¬mente ele interroga Quina sobre sua situação após a morte dela. Essa insistência chega a irritá-la, embora sinta pena do rapaz.
Na noite em que Libória e Custódio estavam jogando car¬tas em outro cômodo da casa, Quina morre, sozinha em seu leito.. Germa, filha de Abel, irmão que tinha sido registrado com sobrenome materno, é a única herdeira de Quina. A Custódio coube o direito ao usufruto de duas propriedades que Quina adquiriu após a morte da mãe. No entanto, ele só partiu da casa da Vessada após ser expulso por Germa. Foi, então, trabalhar como empregado na propriedade dos herdeiros da condessa Monteros. Como se metesse em fofocas, foi despedido e, vendo-se sozinho novamente, suicidou-se. Estina faleceu e seu marido, Inácio Lucas, casou-se com uma velha parenta. A cena que encerra o livro é a mesma que o iniciou: a conversa de Germana com o primo Bernardo. O livro é encerrado com reticências, quando Germa questiona a personalidade da “sibila”.
No romance “A Sibila”, não aparece explicitamente nenhuma denúncia social, entretanto, ficam subentendidas as disparidades sociais e econômicas que envolvem suas personagens. A denúncia fica por conta dos problemas daquela sociedade da época, em que a pouca importância que as mudanças ocorridas nos altos escalões da politica representam no cotidiano das populações pobres, principalmente da zona rural.
Fala-se pela primeira vez numa heroina rural com o romance “A Sibila”, que tenta superar sua condição histórica e sua condição humana. ( Laura Burger, 1991)
O tempo da narrativa não acompanha o tempo cronológico. É a memória com volteios e desvios característicos, que orienta o desenrolar da história de três gerações, que se passa em um século. Essa linha cronológica também permite seguir algumas mudanças que ocorrem na mentalidade da própria sociedade portuguesa, principalmente no que diz respeito ao acompanhamento feminino.
Ler a Sibila implica ter paciência e em querer lê-lo realmente, pois, os primeiros capitulos confundem o leitor, cabendo ir costurando o texto para que se entenda o desenrrolar da história. Numa reeleitura, percebe-se a essência das condiçoes psicológicas das personagens e daí sentir, vibrar, sofrer e compreender suas atitudes.
Maria e Estina são representantes de uma ordem social na qual as mulheres se submetem aos homens, mesmo quando tem condições morais e econômicas de superá-los. Quina é de uma nova realidade, uma mulher que se responsabilisa pelo sustento e não se submete às imposições oriundas da relação matrimonial. Germana representa o avanço, as mulhres de meados do século XX, a partir do qual a situação feminina caminha em direção à igualdade de direitos e deveres com os homens.
As personagens principais do romance A Sibila são os membros da familia teixeira, mas a de maior destaque é Quina, cujo suposto atributo sobrenatural dá o titulo ao romance, seu caráter, no qual, imperavam a independência e auto-suficiência. Buscou realização de seus próprios anseios, não se sujeitando a ter sobrevivência condicionada a um casamento. Pode-se dizer que ela tinha uma mentalidade progressista. Já, Estina era de uma mentalidade tradicionalista, acomodada, sem coragem de reagir às imposições do destino. Ela funcionava como um espelho da própria mãe.
Germana, a última descedente viva, alimentava através da memória, a vida do clã familiar, do qual Maria é iniciante. Germana reagia com hostilidade á toda sujeição que o mundo lhe queria exigir, ao contrário da avó que fora educada para se sujeitar e trabalhar duro.
Os homens do clã Teixeira são apresentados, instáveis e fracos, os que dispersam o patrimônio familiar, símbolo máximo da tradição. È importante ressaltar que no interior do romance, as relaçoes entre as personagens são de grande valor para construir a verossimilhança de cada uma. O problema das relações humanas e suas consequências para a formação de caráter dos indivíduos reforçam o entrelaçamento das personagens.
O cenário do romance é a propriedade da casa da Vessada inserida no espaço rural de uma zona de Portugal. A ambientação rústica e o clima rural vão ser reforçados durante todo o romance, com frequentes referências ao modo de vida do lugar e uma série de recursos linguisticos que incluem regionalismos, indumentárias, objetos, vegetação e crendices, típos de um universo social determinado. As prropriedades, palacete da Àgua Levada, casa de Morouços, casa de Folgozinho, casa do Freixo, além de determinar espaços, funcionam como sobrenomes na identificação de quem é quem, caracterizando as personagens,
Os temas abordados no romance são a oposição entre o ambiente rural e citadino, mulheres e homens, ruína e construção, interior e exterior, permanância e mudança. O elemnto que os costura é a continuidade e, essa, aparece na vida das personagens. João vivia na cidade , mas cultiva plantas no quintal, para se manter ligado no campo. A casa da Vessada permanece de pé após a falência econômica da familia Teixeira; Germana, que é a filha de um dos irmãos carrega o sobrenome de família da mãe. Quina que oculta uma vaidade quase ingênua. O começo no romance que é retomado no fim, permanecendo inacabado por meio das reticências, dando a entender uma continuação.
De acordo com a critica Linda Santos Costa, “o estilo de Agustina Bessa-Luis é único. A escritora portuguesa é uma hábil na arte de contar suas histórias entretecendo, tecendo e retecendo os fatos, como se elas fossem tapetes, mantas de retalhos. Quem lê a escritora, tem certeza disso, não tem o compromisso com o que é linear; antes, é como observar uma colcha de retalhos, um belo tapete de trapos esgarçados, de diversas idades temporais. Mais que uma história de homens, é uma história de criaturas que tecem, elas próprias sua loucas histórias”.
Alguns teóricos da teoria literária portuguesa classificam a obra de Agustina Bessa-Luis, sendo da escola literária da 2ª fase do modernismo portugues, outros insistem na classificação do neo-realista, mas a autora pronunciou-se com relação a essa questão da seguinte maneira: “ Continuo a escrever fora do mundo literário, enquanto tiver prazer de escrever.”
Em 2001, um encontro na Biblioteca Municipal Almeida Garret, o ciclo “Vozes e Olhares no Feminino, coordenado pela ensaista Isabel Pires de Lima, Laura Burger, ensaista e professora da Universidade Nova de Lisboa de Ciências Sociais Humanas, mostrou como os livros da autora Agustina Bessa- Luis tendem a começar “ quanto tudo já se passou, ou, pelo menos vai a meio de se passar”. E descreveu o seu narrador-tipo como alguém que “ geralmente sabe de tudo”, mas que, às vezes, admite a sua ignorância, ou faz mesmo questão de precisar que não assistiu à cena que descreve. Isto quando não se confessa pura simplesmente perdido, e pede ajuda ao leitor: “ Onde íamos nós?. A professora Laura Burger enumerou ainda várias recorrências agustinianas, como a temática incestuosas, as “figuras hamletianas”.
Definindo-a como uma conservadora heterodoxa, cujos livros só na aparencia obedecem aos cânones do romance realista tradicional, ela ainda sublinhou a preferência que a escritora concede às personagens femininas – “Os homens são sempre indolentes e inertes”.
A autora afirmou reconhecer-se genericamente no retrato traçado por Burger, mas apenas admitiu ser feminista “ enquanto pessoa”, o que já foi um tanto surpreendente. “ Nos meus livros não sou feminista”. Se neles aparecem mais mulheres, é apenas porque as “conhece melhor”. E recusou a idéia de que as suas figuras masculinas tenham pouca relevância: “São personagens menos buliçosas. As mulheres falam mais, pedem explicações; os homens tem o sentido do essencial. Mas na vida real é assim mesmo, não é?”! (Porto,2001)
Em a Sibila, a autora exalta os valores da figura feminina mais que as masculinas, realmente, mas isto não quer dizer que sua posição seja a de uma feminista. O que acontece, é a riqueza de sua arte em aprofundar o mais fundo lado psicologico das mulheres. È difícil conhercer-se a si mesmo, talvez o que previlegie Augustina, seja o fato dela conhecer-se a si mesma como mulher, sendo assim só poderia entender melhor o universo feminino.
A leitura de um texto “não se deve concluir a uma recusa generalizada a previlegiar uma parte qualquer da obra. Existem pontos de focalização, nós, que dominam estrategicamente o resto e, para descobrir esses nós, não se deve aplicar um procedimento que se apóie em critérios exteriores. Os critérios serão escolhidos em função de seu papel na obra e não de seu lugar na psique do autor”. (Todorov, p.323,2003).
Quer a sociedade ou não, as mulheres sempre foram mais fortes, só que senssíveis. Essa senssibilidade é percebida na personagem Quina. Durante todo o desenrrolar da história, ela luta com todas as forças para não sucumbir ou sujeitar-se a nada. Mesmo deixando se dobrar à uma criança caprichosa, foi racional o suficiente para decidir o destino de seus bens.
Essa racionalidade por parte de Quina faz o leitor sofrer. A dor que ela sentiu no peito por ter que deixar aquele ser humano que ela amava tanto sem aparo, faz-nos sentir raiva, pois a heroina, o exemplo de força, sucumbindo às escondidas para não viver aquele sentimento! Será isto a força da mulher?; mascarar-se parecendo durona em prol de uma imagem a ser preservada, em função de ganhar respeito. Não! Se é preciso mascarar -se para ter o respeito dos que te rodeia, é preferível ser então uma mulher fraca aos olhos de quem que seja.
A criatura humana é um feixe de sensações e os impulsos e as reações fazem parte do processo que estabelece os paradgmas da condulta, quando fora do crivo da razão.
Indubitavelmente a autora Agustina, demonstra em sua obra, a arte de despertar no leitor a reflexão de si mesmo. “É numa rescusa da instrumentalização da linguagem que se originam, portanto, nos romances de Agustina Bessa-Luís, relações específicas entre o dizer o pensamento e o dizer da arte que, morando nas montanhas mais separadas, infinitamente se encontram”. (Silvina Lopes, Aprendizagem do Incerto)
A apresentação do personagem Custódio em desepero, porque sua preceptora estava agonizando, quase que convence ao leitor realmente de que ele está sentindo mesmo tristeza pelo estado de saúde da preceptora. Seu suicídio é uma incógnita, pois não consegue saber-se: Se ele realmente sente falta dela, ou é porque não herdou toda sua fortuna , ou ainda mais, despeito por ser trocado pela sobrinha que era do seu sangue.
Essas dúvidas deixadas no leitor, crê-se ser propositalmente embutido no romance pela autora, até para testar o leitor, para qual alternativa o leitor optará, que seja a atitude de Custódio.
A poeticidade com que Agustina Bessa-Luis, criou o romance A Sibila, é rica demais para expressar com quaisquer que sejam as palavras, resta-nos, o cheiro das vegetações descritas, a submissão de Maria e Estina, a impetuosidade e inteligência de Quina, os sentimentos latentes em Custódio, a simplicidade de algumas personagens.
A Sibila é um romance para ser sentido e não para ser apenas lido.