BECHARA, Evanildo. Ensino de gramática. Opressão? Liberdade? 11a ed. São Paulo: Ática, 2002.
BECHARA, Evanildo. Ensino de gramática. Opressão? Liberdade? 11a ed. São Paulo: Ática, 2002.
Capitulo II
Linguagem e educação lingüística
Resumo:
A linguagem é um dos fatores decisivos no desenvolvimento intelectual do individuo. Sobre este ponto, é preciso analisar os fundamentos que levaram a condenação do ensino de gramática tradicional. Foram dois:
I- Lingüístico: A Lingüística elevou em demasia o ensino de língua oral – por esta ser antecedente da escrita – e desta maneira instaurou um movimento contra a gramática normativa por esta ser fundada na escrita.
II- Político: O respeito à cultura e a língua de um povo levou essa visão ao extremo de exigir que as classes desfavorecidas permaneçam com seus falares – pois, segundo essa teoria, os oprimidos não devem aceitar a imposição da língua da classe dominante. Mas esta tese gera problemas, um deles é a questão de negar as classes marginalizadas o acesso à cultura da classe dominante.
O grande defeito da gramática normativa tradicional é ver a língua (junção de várias variantes dialetais) como um elemento homogêneo. Ela trata apenas da variante que pode ser localizada como procedente do sudeste (variante sintópica), da classe dominante (variante sinstrática) e de estilo literário (variante sinfásica) e por isso não alcança o maior objetivo do ensino de língua materna – transformar o aluno em um poliglota dentro de sua própria língua.
O modelo que se propõe aqui é centrado no estudo da linguagem e não da língua como a gramática tradicional. Este é fundado em dois elementos: A análise, leitura e produção de textos de diversas épocas e origens para que mediante o contato com a leitura reflexiva, o aluno possa desenvolver suas potencialidades lingüísticas; e o estudo metódico do vocabulário que ampliará o horizonte idiomático do aluno, que nos modelos de gramática normativa não nos é apresentado.
Seguindo estes princípios, estaremos alcançando o motivo principal da educação escolar que é a cultura integral dos educandos, sempre tendo em vista a importância do professor de língua materna, que, antes de ser didática e normativa, é formativa.
Critica:
Linguagem e educação lingüística
O texto apesar de ter caráter introdutório, traz uma gama de conceitos e elementos que geram no leitor a motivação a reflexão sobre os fundamentos do ensino de gramática nas salas de aulas do Brasil.
Contudo, não podemos concordar com tudo que é expresso em suas páginas. Alguns questionamentos soam como reacionários. Um exemplo é a discussão sobre as novidades implantadas no ensino de língua para o qual se expressa da seguinte maneira:
“... o ensino de língua portuguesa foi o que mais sofreu com a onda novidadeira, introduzindo figuras e desenhos coloridos tão extemporâneos e desajustados, que aviltaram o tradicionalismo e insultaram a dignidade por que sempre se pautaram os textos escolares entre nós.” (BECHARA:2002, pág. 9)
Ora nota-se neste trecho uma posição reacionária quando bem sabemos que o uso de figuras em nada insulta a dignidade do ensino de língua materna, ao contrário, ajuda à compreensão dos textos como mostra Eric Jamet em seu livro "Leitura e aproveitamento escolar" .
Outro ponto digno de critica é a visão extremamente questionável que o autor manifesta quando se dirige à Lingüística. Ele manifesta-se dizendo que a Lingüística tem uma visão distorcida da realidade por privilegiar o ensino da oralidade quando sabemos que o ensino deve-se partir do oral para o escrito, afinal aquele sempre antecedeu este. Sem falar no fato de a língua ser uma convenção que manifesta liberdade e por isso não deve sofrer imposição de um modelo artificial.
Ao longo do texto temos um movimento de idas e vindas no tocante ao posicionamento da Lingüística, ora se aproxima de suas teorias e pressupostos, ora se afasta e critica o caráter científico desta. Mas este fato é facilmente explicado, pois Bechara usa-a quando quer apoio teórico a seu modelo de gramática e condena-a quando esta manifesta pressuposto que vão de encontro a seu modelo de ensino de língua materna.
Contudo a leitura é muito valiosa, pois representa uma outra visão sobre um tema bastante debatido que é o ensino de língua na educação escolar.
Capitulo III: O ensino de língua portuguesa
Resumo:
Após breve excursão nos debates dos primeiros filósofos sobre a gramática --- alguns diziam que a gramática devia ser empeiria (experiência), outros que devia ser techné (técnica, regras) --- chega-se a conclusão que o melhor modelo de gramática deve ser uma epistéme cujo significado abrange os dois debates anteriores, ou seja, saber prático e teórico.
Contudo, a introdução no ensino do português da chamada análise lógica gerou uma prática vazia que não ensinava nada sobre o idioma, mas que se tornou, entre muitos professores, o centro da preocupação em sala de aula.
A análise lógica não alcançava os principais objetivos do ensino de língua que são:
I- tornar o aluno um poliglota em sua língua;
II- capacitá-lo a usar as diversas funções da linguagem;
III- formação e aperfeiçoamento das diversas competências lingüísticas.
Para alcançá-la é necessário uma pedagogia baseada na importância da atividade oral --- Além do “ensinar a ler e a escrever” é preciso “ensinar a falar” para que o aluno possa dominar os mecanismos para uma eficiente comunicação social – e na eficácia da mensagem --- O “ensinar a ouvir” a mensagem é captar o conteúdo desta, decodificando os pontos fundamentais e objetivos.
Mediante este processo, o aluno entenderá que a língua não é apenas veículo de expressão e criatividade, mas também instrumento de comunicação, instrumento social de interação.
Só entendo isto é que o aluno sairá do seu complexo mundo interior para o complexo mundo interior de seu semelhante, passo fundamental, segundo Antonino Pagliaro, para formação dos elementos constitutivos da cidadania.
Crítica:
Neste capítulo, o autor faz uma discussão sobre o ensino de língua portuguesa, mostrando os erros do modelo tradicional e a possibilidade de um ensino mais produtivo.
Ele inicia retomando toda a discussão da Antiguidade Clássica sobre a gramática. Essa excursão é fundamental, pois traça um perfil sobre os caminhos que fundamentaram o ensino que temos hoje.
Bechara ainda esclarece o fato de ser a análise lógica um modelo ineficaz para o ensino de língua. É com base em João Ribeiro que ele faz umas das críticas mais exaltadas do livro, contrastando com o posicionamento moderado que assumiu ao longo de seu discurso.
O texto traz sinteticamente os esquemas desenvolvidos pelo lingüista italiano Vincenzo Lo Cascio no artigo intitulado “Para renovação da didática da língua materna”. A análise desses esquemas fundamenta os argumentos desenvolvidos pelo autor e esclarece a necessidade de uma mudança na maneira como vem sendo tratada a educação lingüística no Brasil.
Porém um fato nos causa estranheza. É uma citação da página 39 que soa como discriminação lingüística:
“Enquanto a língua de casa traduz cabalmente as noções de um mundo e de uma vivência reduzida, a língua da escola irá prepará-los, acompanhando o seu desenvolvimento psicológico e cultural, para descobrir no pensamento discursivo as formas que foram elevadas a uma função cognoscitiva mais alta no pensamento racional”.( BECHARA, Evanildo, 2002, pág. 39)
É questionável a afirmação de que a linguagem de casa (coloquial) traduza noções de mundo pobres, ou como diz o autor, reduzidas. Sem mencionar a ligação que estabelece entre o coloquial (noções de mundo reduzidas) e o padrão-culto (função cognoscitiva mais alta do pensamento racional), quando bem sabemos que ambas as formas são variantes de um mesmo sistema e que refletem culturas diferentes e por isso não menos pobre.
Apesar deste questionamento, o texto reflete sobre questões fundamentais da língua. A abordagem é fácil, ágil e corrente. Traz um quadro teórico fundamental para todos os profissionais da língua que desejam de maneira reflexiva agir sobre sua prática educacional.