Linguagem e Persuasão
CITELLI, Adilson. Linguagem e Persuasão. 16ed. São Paulo: Ática, 2004.
Com relação à persuasão, ela está embutida nas mais variadas formas de comunicação; o crucial para o estudo deste fenômeno é a percepção do grau de sutileza convincente contida na informação transmitida pelo emissor/enunciador ao receptor/destinatário. Neste aspecto, o livro de Citelli tem por fito: situar a história da persuasão, revelando mecanismos persuasivos no interior do discurso verbal, o que fará ao longo de 07 capítulos (os dois últimos compostos, respectivamente, por vocabulário crítico e bibliografia comentada).
A origem da persuasão retoma os gregos afeitos à democracia e, portanto, difusores de idéias, em praças públicas e foros, capazes de alterar pontos de vista. Eram os sofistas, os retores, os tribunos. Da preocupação dos gregos com o discurso verbal surgiram a eloqüência, a gramática e a retórica. Conforme concepções desenvolvidas no século XVII e XIX, a retórica ganhou dimensões parnasianas de enfeite, embelezamento das palavras. Hoje, é visada na análise do discurso, no estudo das figuras de linguagem, adentrando o filme, a publicidade, o vídeo, entre outros âmbitos não-verbais.
Aristóteles (384-322 a.C) evidenciou-se na retórica clássica por sua obra Arte retórica. De seus conceitos acerca de retórica, depreende-se que: esta tem algo de ciência e não é persuasão; é analítica, ou seja, propõe-se a descobrir o que é próprio para persuadir. Conforme a Arte retórica, a estrutura do texto obedece às instâncias de exórdio (introdução), narração (assunto em que os fatos são arrolados), provas (comprovação das afirmativas) e peroração (conclusão).
Etimologicamente, persuadir (per+suadere = aconselhar) já inclui uma ironia, visto que a ação persuasiva é resultado de uma organização discursiva voltada mais a convencer que a aconselhar o destinatário. O persuasor brinca com a verdade, valorizando a verossimilhança.
A retórica moderna, vinculada ao estudo das figuras de linguagem (principalmente metáforas e metonímias) e das técnicas de argumentação, apresenta raciocínios discursivos constituintes das artimanhas persuasivas. Entre os quais: o apodídico – que remete ao tom da verdade inquestionável; o dialético – que cria a idéia de liberdade de escolha pelo uso de verbo no condicional ou outras marcas; o retórico – que apela emotivamente, juntando mente a coração.
Afirmou-se que da inter-relação entre signos constrói-se verbalmente o discurso persuasivo. Isto é obvio, já que o signo é arbitrário: não há relação direta entre o significante (conjunto sonoro) e o significado (imagem mental). Ademais, o signo é simbólico – o modo de organizá-lo determina a direção discursiva e seu maior ou menor nível persuasivo, a ideologia como uma consciência formada social e historicamente, e estando prestes à reformulação. O eufemismo, como amenizador das realidades, é componente essencial das ideologias. Um termo “contaminado” passa, assim, a uma forma “neutra”: capitalismo é substituído por livre-empresa, que apesar de não variar a carga semântica soa menos agressivo aos afetados pelo sistema capitalista. Eis uma figura de linguagem que integra signo, ideologia e construção do discurso persuasivo!
As grandes formações discursivas conferem unidade aos discursos das instituições (judiciário, igreja, exército, escola, medicina), explicitando as recorrências nas falas dos profissionais de cada área pela convivência dos mesmos com os pronunciamentos, os textos de suas respectivas formações. E, no tocante a hipertexto, consideram-se várias leituras que podem ser feitas de um mesmo texto, propenso a notas de rodapé, intertextualidades. Os discursos hegemônicos partem de uma ciência para afirmar as convicções de um grupo.
Relações de dominação são expressas e efetivadas pela competência verbal dos que gozam seus altos escalões, em detrimento da grande massa, resignada aos desígnios das autoridades. O discurso persuasivo pode formar, reformar e conformar perspectivas do círculo emissor/destinatário.
Os discursos são híbridos, mesclando lúdico, polêmico e autoritário. O lúdico é quase isento de imperativo e de imposição da verdade, valendo-se da polissemia, constante em músicas e poesias. Quanto ao polêmico, é instigador, apresentando argumentos contestáveis perante os prós e contras – debates de luta entre israelenses e palestinos, clonagem humana. A mais forte persuasão, entretanto, encontra-se no discurso autoritário, em que o signo se fecha a validar a “autoridade” sobre o assunto: publicidade que incita o uso de certo produto ou serviço, religiosos que ameaçam fiéis com o “fogo do inferno”.
Os discursos publicitário, religioso, do livro didático, literário, jornalístico político, são textos persuasivos, cada qual com suas estratégias de convencimento. Sem dúvida, o livro de Citelli, baseado em citações de Marilena Chauí, Umberto Eco, entre outros, contribui para o pensamento crítico do leitor, antes argúcia para apreender slogans, silogismos, símbolos, estereótipos dos discursos mais evidentes.
A princípio ingênuos, vistos pelo senso comum como criativos, tanto a propaganda de Cepacol como a Oração do Credo, a padronização familiar nos livros didáticos, a natureza animalizada do homem num texto naturalista, sensacionalismo jornalístico, e as tão banalizadas promessas políticas são ilustrações de estereótipos encravados na ideologia, o que, por vezes, “ameaça” a ordem psicológica dos indivíduos.
Em relação aos efeitos da persuasão, o livro esclarece também a faceta positiva, nas campanhas de vacinação infantil em que as propagandas insistem na mudança de atitudes para melhorar as condições salutares das crianças. Ao relatar ditadura, percebe-se que em sociedades cerceadas quanto aos meios de comunicação, existe a agressão física ao invés da envergadura verbal. Em suma, as conclusões de Citelli convencem os leitores no que concerne à persuasão. Felizmente, o faz com argumentos, desvendando ideologias ao invés de mistificá-las.
Os assuntos propostos pelo autor são reiterados, superficial ou detalhadamente, ao longo dos capítulos, o que tornaria enfadonho o comentário dos parágrafos em separado. Daí, ser global o comentário. Quiçá, a leitura deste livro de Citelli auxilie pessoas a driblarem as propagandas, vencendo a compulsão por compras!