INÊS PEDROSA – DUAS LEITURAS

(A Instrução dos Amantes e Fazes-me falta)

“Não se consegue amar completamente senão na memória.”

Fazes-me falta, Inês Pedrosa

A Instrução dos Amantes, lançado em 1992 em Portugal, é uma obra literária sobre descobertas. O período dos primeiros amores, das decepções, das idealizações. A protagonista Claudia é uma jovem bonita e desejada e namora o líder do grupo de adolescentes, uma relação instituída nas gravidades do poder e que determina os papéis sociais assumidos pelos personagens.

Contudo, Claudia encontra os olhos dourados de Diniz e se apaixona perdidamente no enterro de Mariana, jovem que caiu ou se jogou da varanda. A proximidade das emoções descobertas no auge da vida e na pungência da morte não é uma mera coincidência. Claudia busca o homem de sua vida, Diniz a quer apenas como mais uma amante. Uma relação que irá marcar profundamente todo o grupo e será a primeira e inesquecível cicatriz da mulher.

“Talvez seja ele, ainda, o segredo do riso dela. Não há memória mais terrível do que a da pele; a cabeça pensa que esquece, o coração sente que passou, e a pele arde, invulnerável ao tempo.”

Fazes-me falta, lançado em 2002, é uma narrativa densa em duas perspectivas distintas do mesmo momento. A morte precoce da protagonista descortina a intensa relação entre um homem e uma mulher. No limiar entre a amizade e a paixão, os dois não suportam a separação definitiva e, em paralelos, costuram seus encontros e desencontros, afinidades e divergências, silêncios e desabafos.

Uma história absoluta. Uma jovem professora idealista que se envolve na política em busca da realização do mundo mais justo; um homem maduro que vê o mundo a partir de suas vivências no salazarismo, em Portugal pós-revolução e nas guerras no continente africano. A mulher, marcada por um amor não cicatrizado e por diversas relações interrompidas, morre de repente e condena o homem que passou por alguns casamentos e manteve a sensação de incompletude projetada na ausência de filhos a uma estranha viuvez.

“Demasiado tarde. São estas as palavras mais tristes de qualquer língua.”

Dois seres dissecam os sentimentos humanos entre a vida e a morte. Iluminam as carências que geram a profusão dos sonhos, focalizam as presenças que salientam as conseqüências da morte real e da sobrevida desprovida de desejo.

“Arrumei os amores, é a primeira regra da vida – saber arquivá-los, entendê-los, contá-los, esquecê-los. Mas ninguém nos diz como se sobrevive ao murchar de um sentimento que não murcha. A amizade só se perde por traição – como a pátria. Num campo de batalha, num terreno de operações. Não há explicações para o desaparecimento do desejo, última e única lição do mais extraordinário amor. Mas quando o amor nasce protegido da erosão do corpo, apenas perfume, contorno, coreografado em redor dos arco-íris dessa animada esperança a que chamamos alma – porque se esfuma? Como é que, de um dia para o outro, a tua voz deixou de me procurar, e eu deixei que a minha vida dispensasse o espelho da tua?”

A Instrução dos Amantes e Fazes-me falta são obras da escritora portuguesa Inês Pedrosa, publicadas no intervalo de uma década. Dois grandes romances que mostram o amadurecimento dos personagens em trajetórias humanas intensas e envolvem os leitores nas vivências universais do amor, da amizade, do desamor, do ser no mundo, do mundo em si, do ser...

Helena Sut
Enviado por Helena Sut em 09/10/2006
Código do texto: T260197