O ESTRANGEIRO - Albert Camus

Meses atrás, quando a SKY liberou os sinais dos canais HBO (ou seria TC?), assisti a um filme britânico, que se passa em uma quarta-feira ensolarada em um parque de Londres. O filme mostra pedaços da vida de vários personagens que estão nesse parque, desde um casal de idosos que fazem amizade pois um deles errou o dia da semana e ambos estavam acostumados a sentar-se no mesmo banco, até outro casal que está se separando e se encontram para tratar da papelada do divórcio.

Logo no começo do filme, um casal está sentado na grama conversando, quando a mulher resolve se deitar para dormir um pouco e o marido, ao observar o ambiente, nota uma garota jovem, de vestido, lendo um livro e deitada bastante à vontade, deixando sua calcinha à mostra. Obviamente que isso chama a atenção desse homem, que ao perceber que sua mulher está de olhos fechados, levanta-se e aproxima-se da garota. Ela está lendo “O Estrangeiro” de Albert Camus. Ela o lê no original (francês) e ele lhe diz que conhece a história. Só que ele não leu esse livro e quando perguntado sobre o que achou do personagem principal, Mersault, ele diz que havia gostado e que sempre se interessava por histórias que mostravam pessoas em países diferentes. Ao falar isso, a garota logo percebe que ele na realidade nunca leu o livro. Gostei do filme, não me lembro o título em português, que no original se chama “Scenes of a Sexual Nature” (Cenas de uma Natureza Sexual). É uma produção de 2006 e me parece que não foi exibida no Brasil. Não há nada de impactante, de reviravoltas, mortes e outras tragédias. Trata de um dia comum em uma cidade comum, com pessoas comuns, suas angústias, desejos, preconceitos e medos, sobre sexo, amor e relacionamentos.

Em uma das minhas visitas à Saraiva, vi o livro “O Estrangeiro” e me lembrei desse filme. Como é um livro de poucas páginas, resolvi comprá-lo. Não me arrependi. Realmente o personagem do filme errou feio ao dizer que o livro contava a história de uma pessoa vivendo em um país estrangeiro. Pode-se até dizer que o título refere-se a Mersault, seu personagem principal e narrador da história, como um estrangeiro na vida, nas relações ditadas pela sociedade.

O livro divide-se em duas partes, a primeira contando sobre o falecimento, velório e enterro da mãe de Mersault, que vivia em um asilo, para onde seu filho a mandara anos antes. E a segunda parte trata da prisão e julgamento de Mersault, por ter assassinado um árabe.

É um livro de leitura fácil, seca e direta. O protagonista não faz concessões. Vive em seu mundo e não busca ampliá-lo, mas não impede a entrada de outras pessoas, caso elas assim o desejem. Ao ser indagado se quer que tirem a tampa do caixão para que ele se despeça da mãe, diz não ser necessário.

Em outro trecho do livro: "À noite, Marie veio buscar-me e perguntou se eu queria casar-me com ela. Disse que tanto fazia, mas se ela queria, poderíamos os casar. Quis, então, saber se eu a amava. Respondi, como aliás já respondera uma vez, que isso nada queria dizer, mas não a amava... Ela se calou durante alguns instantes... Queria simplesmente saber se, partindo de outra mulher com a qual tivesse o mesmo relacionamento, eu teria aceitado a mesma proposta. - Naturalmente - respondi."

Ao ser questionado no julgamento a razão de ter atirado no árabe, diz que foi por causa do sol. Mersault não age por impulso, por paixão, raiva ou vingança. Simplesmente estava ali, com uma arma na mão e o árabe era um desafeto de um amigo seu. Simples assim. Também é interessante o diálogo dele com um padre, já na prisão.

Se ele é condenado? Isso não importa muito, vale mais acompanhar o desenrolar do processo e a reação de Mersault a cada ocorrência. Boa leitura.

O Estrangeiro – Albert Camus – Tradução de Valerie Rumjanek - Editora Record – 126 págs

(texto originalmente publicado em 2009 no blog cinebookbrasil)

DIMAS ROCHA
Enviado por DIMAS ROCHA em 24/08/2010
Código do texto: T2456407
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