Ler sem doer

Lage, Micheline Madureira. Ler sem doer: perspectivas para a leitura do Texto Literário no ensino médio. – Coronel Fabriciano, Unileste – MG, 2003.

Resenhado por: Claudio Reus Silveira Hernandez

A professora de Teoria Literária e Literatura Brasileira, Micheline Madureira Lage, formada em Letras/Português pela Universidade Federal de Minas Gerais. Mestre em Literatura Brasileira pela Universidade de Brasília. Coordenadora do Curso de Letras no Centro Universitário do Leste de Minas Gerais (Unileste-MG), em sua extraordinária obra intitulada: “Ler sem doer”, apresenta-nos o resultado de um trabalho sério, meticuloso, laborioso, que pode, sem sombra de dúvidas, ser descrito como um excepcional manual para orientação, de professores em atividade e futuros professores da área de literatura e outras áreas afins, a respeito das estratégias para o desenvolvimento do gosto dos alunos pela leitura da literatura e do preparo dos docentes em relação a essa prática, como pré-requisito básico para quem pretende, verdadeiramente, ensinar literatura.

Esta obra constitui-se de 152 páginas, divididas em 6 capítulos (além de uma relação bibliográfica e de uma parte destinada aos anexos), sendo um prefácio no qual a professora Hilda Lontra, do departamento de Teorias Literárias e Literatura da UnB, traça um breve comentário, o qual já nos dá uma excelente noção do que nos espera ao debruçar-mo-nos sobre a obra, a respeito do conteúdo e da intenção do livro: “Ler sem doer”. Após o prefácio a autora disponibiliza aos leitores uma orientação, bastante esclarecedora, a respeito do que a motivou e quais são os objetivos que permeiam as discussões e orientações contidas no livro, em seguida são abordados os seguintes temas:

Capítulo 3 – Problematizando questões acerca do ensino de literatura. Nesse capítulo, iniciado com uma frase, bastante reflexiva e com um grande teor de veracidade, de Caio Graco, o qual diz: “Livros não mudam o mundo, quem muda o mundo são as pessoas. Os livros só mudam as pessoas”. A autora foi muito feliz na escolha dessa frase para abrir discussões impregnadas de um alto grau de complexidade e recobertas de muitas contradições, pois a problemática do ensino de literatura, a partir da prática de leitura pelos próprios professores, parece não agradar a classe docente como um todo, haja vista a obra do professor Ezequiel Theodoro da Silva, na qual o autor já denuncia que muitos professores não procuram adotar práticas de leitura, considerando, é claro, a indisponibilidade de fundos e de tempo para o ideal aprofundamento nessa necessidade básica e indispensável, segundo a professora Micheline, a todo aquele que pretende dedicar-se ao ensino de literatura.

A autora explora as teorias de dois estudiosos, a saber: Walter Benjamin e Tynianov, nas quais a literatura é analisada do ponto de vista da historicidade, sendo que ambos opõem-se a ideia de evolução literária linear. Segundo a autora, as ideias defendidas por esses pensadores são as seguintes: “ (...) para Benjamin importava mais o estabelecimento de relações de umas obras com outras, em vez da listagem das gerações de escritores. Em suas palavras, as relações das obras literárias eram bem diversas da continuidade que se estabelecia de uma geração humana para outra. A relação entre as obras era basicamente intensiva, rompendo qualquer esquema linear. Ele também preocupava-se com a perspectiva com que vinha sendo escrita a história, na qual era estabelecida pelo historiador uma relação de empatia com o vencedor, a questão proposta por esse teórico era de examinar, em termos de literatura, a possibilidade de escrevê-la da perspectiva dos dominados. (...) Tynianov, percebendo que a história literária apresentava-se como um apêndice da história social, sendo algo extrínseco a literatura, construída em função dos fenômenos sociais e políticos, via como uma necessidade a criação de uma história intrínseca à literatura, voltada, sobretudo, para o estudo dos fatos propriamente literários (...). Esse teórico percebe que o sistema da literatura é antes de tudo um sistema das funções da série literária, a qual está em constante correlação com as outras séries (...). Tynianov vê a correlação da literatura com as séries vizinhas, a que chama de vida social, através do aspecto verbal. A atividade linguística é, pois, a responsável pelo intercâmbio entre a série literária e social. A literatura tem uma função verbal em relação à vida social, e o estudo da evolução literária – considerada como uma série – só pode ser realizado levando-se em conta a sua correlação com as outras séries”.

Desses conceitos de literatura intrinsecamente relacionada à vida social, nasce a teoria da Estética da Recepção, teoria essa amplamente discutida pela autora, neste e nos demais capítulos, e eleita como a forma pela qual deverá ser abordado o ensino de literatura nas escolas. Nas palavras da autora: “um dos nomes chave dessa teoria é Hans-Robert Jauss, que também se preocupou com a questão da historicidade literária. Jauss deve a tynianov alguns aspectos das críticas que faz a historiografia e à crítica literária tradicionais; no entanto, não hesita em acusar uma falha nos formalistas russos: a de terem privilegiado o estético em detrimento do histórico. Jauss partilha do pensamento benjaminiano de que a arte cumpre, por natureza, uma função social, mas adverte para o perigo de se descuidar do caráter propriamente estético da arte em benefício de sua dimensão social. Reconhecendo as influências sofridas pelos que o antecederam e por outros estudiosos que lhe são contemporâneos, Jauss defende a necessidade de vinculação do estético com o histórico, através da ótica recepcional, e para tal, propõe uma hermenêutica literária que tem como objetivo o resgate da historicidade da obra literária. A historicidade seria a resultante do movimento de produção, circulação e recepção da obra literária”.

De um bom entendimento das teorias desses estudiosos é possível chegar ao um nível de compreensão aceitável da proposta da professora Micheline, em relação ao ensino da leitura da literatura, tanto aos professores quanto aos estudantes. A esse respeito pode-se extrair um ensinamento bastante valioso deste capítulo do livro, quando a autora, após descrever minuciosamente e de forma bastante clara e compreensível as teorias que a ajudaram a chegar na sua proposta, objeto desse obra, nos diz o seguinte: “Com base nos estudos de Benjamin, Tynianov e Jauss, parece-nos que o professor deve tomar cuidado para não priorizar o historicismo literário, em detrimento da leitura literária, e não deve valorizar demasiadamente o contexto histórico-socioeconômico de circulação da obra pois, dessa forma, corre o risco de reduzir o seu curso a um apêndice da História do Brasil. O estudo da periodização literária tem também merecido críticas quando baseado exclusivamente em análises linguísticas e estruturais do texto, perspectiva em que aspectos sociais, econômicos, políticos, artísticos e ideológicos são muitas vezes ignorados, desvinculando a literatura de seu contexto histórico e social.Acreditamos que o melhor caminho a percorrer seria o da leitura e o do estudo pancrônico (sincrônico e diacrônico, simultaneamente) dos textos, o que possibilitaria assim, um diálogo entre o hoje e o ontem, inserindo o texto no seu momento histórico e vendo o que ele tem a dizer aos leitores nos dias atuais. A leitura crítica deve ser enfatizada, e o professor pode propiciar a descoberta de que a função da literatura é não ser subserviente à história oficial, mas dar voz aos esquecidos, aos que construíram a história e, no entanto, não puderam escrevê-la”.

Além dessas colocações, com quais a autora indica, aos atuais e futuros professores, um caminho bastante viável para o exercício do ensino/aprendizagem da leitura da literatura, ela ainda nos apresenta a grande problemática, levantada nos estudos realizados pela pesquisadora Alice Vieira, da incoerência de que o ensino de literatura brasileira, feito nas escolas de nível médio, seja realizado a partir de textos dos séculos XVI ou XVII, os quais referem-se a um período de tempo bastante distante da realidade vivenciada pelos alunos e que, também, explora a anacronia de uma linguagem culta a qual exige um conhecimento semântico bastante adiantado da Língua Portuguesa. Esse, completamente além do nível alcançado pelos estudante no 1º ano do ensino médio.

A proposta da autora para solucionar essa problemática é a inversão da estrutura de abordagem do ensino de literatura, da forma tradicional para uma forma em que fossem considerados os fatores ligados ao ensino aprendizagem. A opinião da professora Micheline espelha-se na de outros estudiosos e ela destaca, ainda, na página 20 do livro, a manifestação de Alfredo Bosi, que é convergente com a apresentada pela autora, destacando-se que ele defende que o estudante deva começar pelo conhecido para depois aventurar-se no desconhecido. No entanto, a própria autora reconhece que a tradição de ensino de literatura, dentro de sua linearidade cronológica, é bastante arraigado no modelo atual do sistema de educação brasileiro. A respeito dessa concepção de sistema educacional antiquado e com práticas já bastante desgastadas pelo tempo e pela falta de atualização, o professor inglês, Ken Robinson, em entrevista para a revista isto é, de 23 de junho de 2010, nos diz o seguinte: “Nosso sistema de educação formal tem 200 anos e durante esse tempo falhamos em conectar os estudantes aos seus talentos. A escola mata a criatividade. Fazemos um uso pobre dos nossos talentos. O sistema é obcecado com as habilidades acadêmicas, em levar os alunos para a faculdade. (...) Somos formados por um sistema educacional fast-food, em que tudo é padronizado, industrializado. Temos de mudar isso para uma educação manufaturada, orgânica. E aprender que o florescimento humano não é um processo linear e mecânico, mas orgânico. A educação precisa ser customizada para diferentes circunstâncias e personalizada. É preciso criar um sistema em que as pessoas busquem suas próprias respostas”. Dessa entrevista, concedida por um professor inglês que também é consultor de governos europeus, asiáticos e americano e, ainda, elaborador de relatórios de estratégias sobre criatividade, cultura e educação, para o Primeiro Ministro Tony Blair (1997 – 2000), pode-se perceber que a problemática de um sistema de educação obsoleto não é exclusividade do sistema brasileiro, mas sim que é uma realidade experimentada por vários países do globo.

Ainda neste capítulo é tratada a problemática do ensino da literatura face a preparação do estudante para o enfrentamento de uma avaliação realizada nos moldes do vestibular e do PAS – na UnB. Para introduzir esse tema a autora utiliza-se de dois instrumentos, a saber: uma pesquisa realizada por Alice Vieira, no trabalho em que ela analisou as provas referentes a literatura, realizadas pela FUVEST (Fundação Universitária para o Vestibular) no período compreendido entre 1977 e 1984, concluindo que a Fundação, apesar de constar em seu programa que: “o ensino de literatura não deve reduzir-se à memorização de nomes, datas e minúcias bibliográficas (...)”, não aplica efetivamente o que apregoa, pois, nas palavras da professora Micheline Lage: “como vimos, na prática o vestibular da FUVEST acaba privilegiando a memorização e a cronologia, sem compromisso com as especificidades do texto literário, ou seja, com a evidenciação da leitura da literatura”. Um outro instrumento utilizado pela autora foi a pesquisa realizada por Regina Zilberman, na qual ela questionava a influência do vestibular no ensino de literatura. A professora Micheline Lage, como a excepcional profissional que transparece da leitura de seu livro, não se contentando com as pesquisas analisadas, em face das mesmas já terem sido realizadas há mais de dez anos (quando da publicação desse excelente trabalho acadêmico), resolveu realizar, ela mesma, um trabalho mais atual, escolhendo como objeto de estudo o vestibular da UnB. Para tanto analisou o Guia do Vestibulando do 1º vestibular de 1988 da UnB, constatando que o mesmo estava de acordo com a proposta da instituição, pois foi possível comprovar que a prova de Língua Portuguesa, do vestibular da UnB, busca avaliar a capacidade do aluno de ler e escrever em diferentes situações, com ênfase na norma culta, sendo o conteúdo dividido em três partes: 1) Texto, 2) Conhecimentos linguísticos e 3) Conhecimentos de literatura. A autora, após constatar que o vestibular analisado está, salvo alguns pequenos deslizes, dentro do que foi proposto pelo programa elaborado, faz o alerta de que são necessárias mudanças urgentes no sistema de ensino realizado em Brasília, no que tange ao nível secundário, pois da forma como está sendo implementado, os professores não estão dando condições aos seus alunos de participarem, com alguma chance de êxito, do processo seletivo da UnB. Em relação ao PAS, a autora faz um relato da historicidade do programa desde a sua criação, passando pelas adaptações realizadas em decorrência da comprovação das necessidades de adequação a realidade local, explicando como e porque surgiram o Fórum Permanente de Professores e o Fórum Permanente de Pais. Após um breve retrospecto a professora Micheline, passa a fazer uma análise pormenorizada no que diz respeito ao conteúdo programático em Língua Portuguesa e literatura. Considerando, inclusive: - obras mencionadas no programa; - questões de literatura, nesse quesito a autora traça um quadro-resumo dos processos mentais, segundo Bloom, e os resultados em nível de leitura, no qual analisa as habilidades exigidas a nível de leitura e os resultados esperados da análise do conhecimento dos vestibulandos. A autora traçou, ainda, dois outros quadros sintetizando as operações mentais exigidas dos candidatos e o tipo de leitura realizado para possibilitar a realização da prova. Face a este trabalho ela conclui o seguinte: “No entanto, gostaríamos de ressaltar que as questões, de maneira geral, foram bem elaboradas, tanto no que diz respeito ao nível de dificuldade, quanto a abordagem teórica adotada e às habilidades mentais exigidas (...)”. Afirmou, ainda, que: “Levando-se em consideração as pesquisas mencionadas anteriormente, realizadas há aproximadamente 10 anos, podemos verificar que, pelo menos em Brasília, já se vislumbram mudanças, e o panorama educacional se mostra menos desolador”. Das conclusões da professora Micheline Lage, podemos inferir que a Universidade de Brasília está buscando, e tem conseguido alcançar, uma melhor forma de avaliação norteada pelo desejo de valorizar o desempenho dos vestibulandos, que tenham um conhecimento mais profundo da literatura e que saibam realizar uma leitura e interpretação fecunda dos textos adotados como mediadores para a verificação da capacidade cognitiva de absorver, interpretar e transmitir a visão de mundo do autor, manifestada em suas obras.

Capítulo 4 – Clareando a ideologia e construindo a metodologia. Nesse capítulo, elaborado com um tão grande esmero que denota o desejo da autora de passar a sua contribuição para a melhoria dos métodos de ensino da leitura da literatura no âmbito do sistema de educação brasileiro, mais especificamente no ensino médio. Do que pode-se depreender da metodologia da professora Micheline, o ponto chave para um melhor aprendizado de literatura está na adoção do método recepcional, em substituição ao método positivista, utilizado anteriormente. Sobre isso a autora diz o seguinte: “Nos últimos anos, porém, com o crescimento do interesse das universidades pela questão da leitura o método recepcional tem sido difundido no meio acadêmico. No entanto, no ensino médio poucos professores conhecem tal método. Em geral, os estudos literários nesse grau têm se dedicado à exploração de textos e sua contextualização num espaço-tempo, sob um eixo positivista. O relativismo de interpretação e, portanto, de leitura não é tópico relevante no sistema educacional.”

O método recepcional foi concebido pelos teóricos alemães da Escola de Constança e explora o diálogo entre o escritor e o leitor, baseado nos pontos de indeterminação e de esquemas potenciais de impressões sensoriais, os quais no ato de criação ou da leitura, transformando o que era trabalho artístico do criador em objeto estético do leitor. Pode-se comparar essa concepção de leitura participativa, onde a obra é complementada pelas impressões que ela mesma deposita no leitor, com o conceito aristotélico de catarse, a qual é produzida através da apresentação de um drama, pois ao despertar os sentimentos fazendo com que o público participe da composição da obra essa se impregna nele e é, também, modificada por ele. Assim se dá na educação vicária, onde a visão de mundo, as experiências, a capacidade cognitiva anterior do estudante são consideradas e colaboram para a aprendizagem. Esse mesmo ponto de vista é defendido pelo professor Paulo Freire, quando diz que: “A leitura de mundo precede a leitura da palavra”, ou seja, o aproveitamento das experiências da alteridade é um fator determinante para despertar o gosto do aluno em aprender. O professor, crítico e ensaísta Norte-Americano, George Steiner, vai ainda mais longe ao dizer que: “O texto primário simplesmente antecede aos demais no tempo, por acidente cronológico. É a causa mais ou menos contingente, mais ou menos aleatória, dos pastiches, das paródias e das citações relativas a ele. Não lhe cabe qualquer privilégio de originalidade canônica – se não por outros também, pelo simples fato de a língua sempre preceder quem a usa e sempre impor ao usuário suas próprias regras, convenções, opacidades, pelas quais ele não é responsável e sobre as quais seu controle é mínimo. Nenhuma frase, falada ou escrita em língua inteligível, é original, no sentido rigoroso da palavra. É apenas uma de um conjunto formalmente ilimitado de possibilidades transformacionais no âmbito de uma gramática limitada por regras. O poema, o drama, ou o romance é, em última análise, uma obra anônima.” ou seja, nada produzido, em termos literários, é autêntico, pois tudo o que é, foi ou será escrito deve-se a leitura de obras anteriores, que, por sua vez, provém da leitura de obras ainda mais antigas, que, também, provém da experimentação de outros, disso depreende-se que a literatura é fruto da interação social, e o homem, como ser social que é, sofre a influência do meio em que vive e absorve dele tudo aquilo com o que se manifesta.

Considerando que, baseado no que é possível depreender das teorias apresentados no livro “Ler sem doer”, a cultura humana advém do movimento circular produzido pelo inter-relacionamento entre a sua historicidade social e política, a luz da visão atual do mundo que o cerca, conspurcada pela visão de mundo que lhe foi imposta e está baseada, por sua vez, na concepção daqueles que por séculos tem dominado, utilizando-se, para isso, do poder da palavra escrita, ou seja, da literatura em todas as suas mais diversas e distintas manifestações. A leitura crítica dessa intrincada rede de relacionamento humano, proposta pela autora através de uma leitura da literatura na qual deva-se valorizar, não só a visão de mundo do autor, mas sim a visão de mundo modificada pelas experiências do leitor, desvendando no texto o que é verdadeiro do que é intencionalmente revelado, baseado na vontade das elites, possibilitará a decodificação da intencionalidade subjacente existente na própria obra analisada.

A leitura crítica da literatura surge como um forte instrumento de libertação do homem dos grilhões que, se não mais o mantém cativo pela diferenciação de raça, o mantém pela força avassaladora exercida pelo controle do poder da palavra escrita, baseada na inépcia histórica das camadas menos favorecidas em decodificarem a palavra escrita, sendo em função disso docilmente dominados. Procurando conduzir o leitor, desde a aprendizagem da leitura até nos níveis mais avançados, a realizar uma leitura analítica dos códigos da palavra escrita, o homem tenderá a, naturalmente, abandonar a forma discriminatória adotada pela nossa sociedade, baseada na força, senão física também do controle do código da palavra escrita.

Capítulo 5 – Relatando experiências. A autora inicia esse capítulo com um texto bastante significativo de Márcia Pires, o qual nos diz que ensinar é acima de tudo aprender. A frase é a seguinte: “Ensinar / Ensinar ou Aprender / Ensinar e Aprender / Ensinar/Aprender / Ensinar a Aprender / Aprender a Ensinar / Aprender a Aprender / Aprender. Essa é, basicamente, a sina de todo aquele que se dedica a arte de ensinar.

Neste capítulo a professora Micheline, inicialmente, nos diz que o professor de literatura deve procurar ampliar sua visão de mundo, procurando abarcar todas as manifestações da linguagem humana, principalmente as oriundas dos avanços tecnológicos e as que fazem parte do cotidiano dos estudantes, e não somente os ater-se a decifração dos sinais gráficos. A esse respeito a autora nos diz o seguinte: “É importante ressaltar que o professor de literatura não pode esquecer o seu compromisso maior: encaminhar o aluno para o encontro com a literatura; por isso, o livro deve ser sempre o eixo principal, para o qual converge a exploração dos mais diferentes recursos. (...) Para nós, todo e qualquer recurso usado (a canção, o cinema, o teatro, a fotografia, a pintura, ou outros) é apenas uma ponte para chegarmos ao verdadeiro objetivo, que é o de formar o leitor crítico, consciente e independente”.

Após essa introdução, na qual fica claro que a leitura de mundo é fator primordial para uma boa compreensão da leitura da literatura, e que o professor de leitura deve ser, antes de tudo, um cidadão crítico e deve procurar manter-se sempre atualizado, pois a busca do aperfeiçoamento constante é uma qualidade essencial a todo aquele que pretende dedicar-se a formação de leitores críticos e, em consequência, de cidadãos conscientes do seu papel na polis, a autora passa a uma descrição bastante minuciosa a respeito da experiência vivenciada com o curso “A leitura da literatura: a contribuição de outras manifestações artísticas.

A discussão sobre o curso desenrola-se desde a página 61 até a página 110 deste excelente livro e nela são apresentados os resultados captados com os dez encontros, ocorridos no período de 23 de setembro de 1998 até 25 de novembro de 1998, perfazendo um total de 48 horas, nas quais explorou-se o tema “Brasil 500 anos”. Nesses encontros foram discutidos vários textos (entre eles algumas canções da nossa MPB) e trabalhados alguns métodos para, através do trabalho árduo e profícuo conseguir experimentar as várias formas de abordagem de textos literários e tirar várias conclusões bastante úteis a todos aqueles que pretendem dedicar-se ao ensino da leitura.

No parte final desta fecunda obra, introduzida por uma frase da bastante conhecida Madre Tereza de Calcutá, a qual ilustra perfeitamente a intenção da autora de difundir, com as discussões abordadas no livro, o vasto conhecimento adquirido com sua experiência em sala de aula, apesar da pouca idade. A reverenciada madre nos diz o seguinte: “Sabemos que o que fizemos foi apenas uma gota d'agua no oceano, mas se não tivéssemos feito essa gota faltaria”. Após esta frase, mais uma vez muito bem escolhida, a autora, não contente com tudo o que já havia colocado nas 152 páginas deste livro, face ao seu comprovado profissionalismo, percebido pelo conteúdo da própria obra, faz uma revisão com a qual ela coloca algumas orientações bastante úteis a todo aquele que pretende dedicar-se ao ensino da leitura da literatura.

Depois da apreciação das 152 páginas dessa excelente obra pode-se afirmar, sem sombra de dúvidas, que foi plenamente absorvida a gota com que a professora Micheline Madureira Lage procurou inundar o microcosmos desse reles estudante de literatura, isso face a ter contribuído na criação de novas perspectivas e, ainda, afogado dúvidas, naufragado a desesperança e lavado falsos axiomas, submergindo todo o pessimismo adquirido de uma parca visão de mundo, na qual, até então, não se vislumbrava condições de evolução no horizonte do sistema de educação brasileiro, em relação ao ensino e prática da leitura da literatura.

O que pode-se depreender, após a análise da obra, é que este livro pode muito bem servir aos atuais e futuros professores de leitura como um manual de orientação, como um compêndio sobre a arte de ensinar a leitura da literatura, ou como um livro de cabeceira a ser consultado sempre que se fizer necessário e, mais ainda, em substituição a bengala representada pelo livro didático, descrito dessa forma pelo professor Ezequiel Theodoro da Silva por servir de apoio aos professores mal preparados ou que não procuram o aperfeiçoamento constante - seja por falta de tempo ou por falta de fundos suficientes para realizar cursos de atualização e até mesmo para adquirir e ler novas publicações. No entanto, essa nova bengala, ou melhor, esse novo instrumento de apoio, representa um proficiente suporte às necessidades e , também, é um mecanismo de informação capaz de sanar dúvidas e nortear o melhor caminho para o bom desempenho do docente no momento de idealizar, preparar e, finalmente, ministrar uma excelente aula de leitura da literatura, com a qual, baseado nos ensinamentos da professora Micheline, difundidos neste trabalho, certamente resultarão na colheita dos melhores frutos literários, graças a boa semente que foi lançada no momento da publicação desta excepcional obra.