Formação e Rompimento dos Laços Afetivos
BOWLBY, John. Formação e Rompimento dos Laços Afetivos. 3º ed. São Paulo: Martins Fontes, 2001 - 228 p.
John Bowlby (1907-1990) foi um psicanalista e psiquiatra inglês, especialista em psiquiatria infantil. A convite da Comissão Social das Nações Unidas, coordenou um amplo estudo sobre os problemas e necessidades das crianças sem lar. Isso, aliado a sua atuação clinica ao longo dos anos, gerou a produção de inúmeros trabalhos que hoje estão publicados em diversos idiomas e servindo de referencias importante na literatura referente a saúde mental. A obra traz uma revisão das conferencias em que Bowlby apresenta os resultados de seus estudos e pesquisas que fomentaram suas formulações e conceitualizações no campo da saúde mental.
O cuidado inadequado na primeira infância e o desconforto e a ansiedade de crianças pequenas relativos à separação dos pais são o foco central da obra de Bowlby que estudou os efeitos do cuidado materno sobre as crianças, em seus primeiros anos de vida e as conseqüências do rompimento na interação com a figura materna, na primeira infância.
No capitulo inicial Bowlby evidencia a influencia do pensamento freudiano referente aos cuidados com a criança, pois o amor dos pais é algo indispensável ao bebê em crescimento e que, anteriormente a Freud essas verdades eram prontamente postas de lado e taxadas de sentimentalismo sem fundamento válido e que não havia provas de que o que acontece nos primeiros anos de vida seria importante para a saúde mental.
Bowlby aborda o papel da ambivalência na vida psíquica citando que o significado atribuído por Freud à ambivalência reflete-se em suas construções teóricas. Freud afirma que "os instintos sexuais e os do ego desenvolvem facilmente uma antítese que repete a do amor e ódio" (1915). Isto implica dizer que os passos dados pelo bebê ou a criança ao avançar no sentido da regulação dessa ambivalência têm importância decisiva para o desenvolvimento de sua personalidade. Bowlby demonstra que a separação de uma criança pequena de sua mãe, na primeira infância pode gerar um conflito de tal envergadura que os meios normais para resolvê-lo são destroçados. Bowlby tem a convicção de que muita infelicidade e muita enfermidade mental se devem a influências ambientais, as quais esta ao nosso alcança mudar.
Quanto à hereditariedade o autor diz que não pode há dúvidas de que variações na dotação hereditária e na influência do meio ambiente desempenham importantes papéis. Apesar de ser um adepto convicto e entusiasta da noção de que as situações concretas que um bebê experimenta têm importância crucial para o seu desenvolvimento, Bowlby diz que temos como habilitar todas as crianças a crescerem sem perturbações emocionais. Existem problemas espinhosos a resolver, mas ele acredita que a tendência é apostar nos estudos de motivação em crianças pequenas, em especial o estudo do modo como a mãe e o bebê desenvolvem suas relações impregnadas de alta carga emocional, e espera que a teoria da aprendizagem esclareça o processo de aprendizagem que ocorre nos meses e anos críticos em que uma nova personalidade nasce.
Para Bowlby, os psicólogos na área da etologia, em suas abordagens do problema, têm a tendência de adotar um de dois enfoques: Acadêmico e experimental, privilegiando as teorias da aprendizagem; Clínica, que tenderão a uma ou outra forma de psicanálise. Ambos os enfoques levaram à Formação e rompimento dos laços afetivos realização de valiosos trabalhos. Para Bowlby os etologistas fornecem-nos uma abordagem muito diferente daquelas da teoria da aprendizagem e da psicanálise e que falta ver, ainda, se a abordagem etológica leva à melhor compreensão dos dados do desenvolvimento da criança e se fornece um estímulo para mais e melhores pesquisas. O autor tende para a abordagem etológica mas não descarta a teoria da aprendizagem e enfatiza que para se entender muitos dos processos de mudança a que estão sujeitos os componentes de padrões instintivos, a teoria da aprendizagem é indispensável e, portanto, complementar da etologia.
Bowlby aborda o luto na infância descrevendo as idéias de Adolf Meyer que insistia ser o paciente psiquiátrico um ser humano e que seu pensamento, seu sentimento e seu comportamento perturbados devem ser examinados no contexto do ambiente em que está vivendo e em que viveu, Bowlby fornece uma descrição dos progressos recentes nos estudos da compreensão do efeito que a perda dos cuidados maternos nos primeiros anos da infância tem sobre o desenvolvimento da personalidade, segundo o autor, acumularam-se muitas provas que indicam a existência de uma relação causal entre a perda dos cuidados maternos nos primeiros anos de vida e o desenvolvimento da personalidade perturbada, nos últimos vinte anos e que, até hoje, não se tem prestado muita atenção a essa fase que parece ser crucial para um entendimento da psicopatologia, tornando-se necessário explora-Ia mais completamente. Bowlby formula a hipótese de que, na criança pequena, a experiência de separação da figura materna é especialmente suscetível de evocar processos psicológicos cruciais para a psicopatologia, e que esta posição teórica esta muito próxima de outras já existentes no campo, porém parece ser diferente de todas. Cria-se aqui a controvérsia, para Bowlby, quando se passa a considerar por que alguns indivíduos reagem à perda com modos patológicos, e outros, não. Existem muitos outros acontecimentos na infância, além de uma perda, que contribuem para o desenvolvimento da personalidade perturbada e da doença psiquiátrica.
Bowlby enfatiza o prevalecimento da vinculação nas espécies, que geralmente é mais persistente entre a mãe e seu filho pequeno, vinculo este que persiste ata a fase adulta e que é possível considerar esse vinculo afetivo entre os seres humanos a partir de um ponto de vista comparativo e que ainda é grande a distancia em sentenciar que, os vínculos de uma criança com sua mãe, sofre um desequilíbrio em virtude de uma breve separação, e que as separações longas ou repetidas estão causalmente relacionadas com os distúrbios de personalidade. A separação ou perda de entes queridos, são eventos que constituem riscos para a saúde mental. Ansiedade crônica, depressão intermitente ou suicídio são alguns dos tipos mais comuns de problemas que hoje sabemos serem atribuíveis a tais experiências. Seria preciso realizar uma longa serie de experimentos para investigar os efeitos, a curto e a longo prazo, sobre o comportamento, do rompimento de um vinculo afetivo dentro de suas variáveis.
As crianças pequenas não só se afligem com a separação, como também o pesar delas é freqüentemente muito mais demorado. Mesmo para adultos, apreender inteiramente que alguém muito próximo está morto e nunca mais voltará é muito difícil também. Bowlby acredita que não só a criança, mas também o adulto, necessita da assistência de uma outra pessoa de sua inteira confiança para recuperar-se da perda sofrida, convicção esta enfatizada por todos os autores como imensamente importante que a criança disponha de uma pessoa que atue como substituta permanente, a quem ela possa ligar-se gradualmente. Para Bowlby há provas de que os afetos mais intensos e perturbadores provocados por uma perda são o medo de ser abandonado, a saudade da figura perdida e a raiva por não reencontra-la.
Na concepção de Bowlby, essa figura de ligação ou base pessoal segura não se limita absolutamente às crianças, ocorre também com adolescentes e adultos maduros.
Para Bowlby a teoria da ligação difere da psicanálise tradicional ao adotar um certo número de princípios que derivam das disciplinas relativamente novas da etologia e teoria do controle, dispensando conceitos tais como os de energia psíquica e impulso, estabelecendo estreitos laços com a psicologia cognitiva. O autor prossegue dizendo que e a dependência não está especificamente relacionada com a manutenção da proximidade, não se refere a um indivíduo específico, nem está necessariamente associada a uma emoção forte, porém há implicações de valor que são o oposto exato daquelas que o conceito de ligação subentende. A ansiedade em torno de uma separação involuntária pode ser uma reação perfeitamente normal e saudável. O que se torna difícil explicar é por que esta ansiedade é despertada nas pessoas com intensidades diferentes. Para Bowlby há muito trabalho a ser feito antes de se ter certeza sobre quais os distúrbios do comportamento de ligação que podem ser tratados pela psicoterapia e quais os que não são, além dos vários métodos a que se deve dar preferência e, considera importante dedicar-se às primeiras experiências infantis negativas em relação ao seu ambiente e as conseqüentes desordens psicológicas que podem ocorrer. O autor Postula que a criança é capaz de estabelecer relações desde muito cedo e também de que existi o sentimento de perda, o luto e a depressão na primeira infância e que o ambiente familiar favorece ou não um melhor ajustamento da criança ao longo de seu desenvolvimento. Bowlby acrescenta que a relação mãe-criança tem uma importância fundamental e que separações precoces podem ser deletérias para o desenvolvimento das crianças e, que a perda de contato com a mãe no início da infância pode provocar sérias alterações na formação da personalidade infantil.
Bowlby nos dispõem nesta obra todo o fruto de sua atuação clinica ao longo de sua vida profissional e de pesquisa bibliográfica de trabalhos de diversos profissionais que atuam ou que se dedicam à pesquisa nesta área, bowlby soube utilizar com maestria esses dados científicos produzidos ao logo dos tempos nos campos da psicanálise, biologia evolucionária, etologia, psicologia do desenvolvimento, ciências cognitivas e teoria dos sistemas de controle, através de pesquisas e observações diretas.
Esta obra nos trás novas formulações e conceitualizações com relação a formação e rompimento dos laços afetivos. As idéias de Bowlby representaram o ponto de partida para o desenvolvimento de uma nova teoria da motivação humana, integrando aspectos da biologia moderna e incluindo afeto, cognição, sistemas de controle e de memória, além de aspectos envolvidos no desenvolvimento, sustentação e provimento dos laços afetivos. Sem duvida trata-se de uma fonte, até então, inconteste de conhecimento e de grande ressonância na área da saúde mental. Portanto, a obra de Bowlby torna-se uma rica fonte de pesquisa para psicólogos, psiquiatras, assistentes sociais, médicos, professores e pesquisadores. Pode ser consultada tanto ao nível de graduação como pós-graduação, a mesma apresenta uma narrativa em linguagem técnica, porém esclarecedora e fundamental para quem atua na área da saúde mental.