A Bhagavad Guita

" Não sei porque me perguntas
Perguntas não vão lhe mostrar,
Que eu sou sou feito da terra,
Da água, do fogo e do ar"
               Guita- Raul Seixas e Paulo Coelho.

Verbo é potência, predicado é ato. No verbo está a força total do espírito clamando para ser transformada em predicado, da mesma forma que a matéria prima trabalhada pela mão do artistas e se transforma em obra de arte. Quando Deus disse a Moisés Eu Sou, o que ele fez foi verbalizar.
Ele já continha em si todos os predicados possíveis, e não precisava construir para si próprio mais nenhum. Por isso deixou a Moisés a tarefa de descobrir “o que”, ou “quem” era esse Deus Inominado.  Os predicados de Deus constituem seus bilhões de nomes, mas apenas um deles é o Verdadeiro, o Único, o Ìmutável, o Principio de todo principio, porque é a verdadeira Essência de Deus. Talvez Deus tenha dito secretamente a Moisés seu Verdadeiro Nome, e a partir desse
conhecimento ele tenha realizado todos os prodígios quea Bíblia lhe atribui, mas o fato é todos os povos, antes e depois da existência do legislador israelita, sempre lhe deram predicados
(ou nomes) que Ele jamais disse que tinha. 

O Deus que se apresentou a Moisés no Monte Sinai também ensinou ao poeta Sansaya a Baghavad Guita, sublime canção que denuncia todos os predicados de Deus.
A Bhagavad Guita (Sublime Canção), é um dos escritos mais inspirados do Rig-Veda, conjunto de livros sagrados do Hinduismo. Trata-se de um longo poema metafísico em que o Deus Shiva , através de um dialogo com o guerreiro Arjuna, ensina-lhe as origens do cosmo e as relações
do homem tem que manter com a divindade. Num dos mais marcantes trechos dessa genial inspiração encontramos esta maravilhosa definição da essência di/vina:

“Deuses existem ", diz Shiva Sansaya, “ mas eu sou o único. Todas essas formas que vedes são deuses, cada qual com seu poder relativo. Em proporção ao estado de suas consciências, anjos, demônios, espíritos, duendes e homens são deuses. Eu estou em todos mas nenhum deles
é Eu. Meu espírito está em tudo mas nada disso está em mim. Sou plurimorfo, multiforme, onividente, onisciente e integral de todas as forças do universo, e em mim tem seu zênite. Sou imobilidade e movimento, uno e múltiplo no existir, harmonia suprema e caos infinito.
Tenho todos os braços para abraçar, todos os seios para nutrir, todos os ventres para dar a vida,todos os olhos para ver, todas as luzes possíveis, dentro de uma treva impenetrável. Sou o fundamento inatacável de tudo que existe, existiu e existirá.” 

Esse discurso evoca, de certa maneira , a idéia do panteísmo, doutrina filosófica que afirma a existência de uma identidade de substância entre Deus e toda a matéria de que é composta o universo. A única diferença  é que o panteísmo nega o ato criador divino, pois “vê” Deus como a própria matéria, não identificando nenhuma diferença de essência entre as duas realidades. Para os panteístas, Deus é aprópria natureza, ou a força que nela existiria para dar forma ás coisas.
O panteísmo é, portanto, uma forma de naturalismo, enquanto que a idéiade Deus transmitida pela Guita, “separa” a essência, o fundamento, a unidade divina da suas diversas manifestações.
O Deus da Guita é criador dos mundos, mas não está neles como essência. “ Ele está em toda a sua criação, mas a sua criação não está nele”, isto é, sua divindade, seu espírito não se confunde com o universo, que é manifestação material desse principio. O Deus da Guita é semelhante ao Deus gnóstico, que está em tudo e se manifesta em diversas formas em função da presença da sua luz. 

É que por ser pura potência, isto é, Luz, Deus não tem um atributo material identificável, um nome próprio que possa ser pronunciado, nem uma forma que possa ser reverenciada como especifica. Ele é todos os predicados possíveis e todos os nomes, de plantas, de rochas,
de animais e forças da natureza. A partir do seu atributo inicial que é Ser, Ele vai se “construindo” e “mostrando”, na multiplicidade de sua criação, a sua face externa. Por isso é que os modernos gnósticos dizem que os cientistas só conseguem ver a realidade “pelo seu lado de fora”, pois esta é a natureza, face externa de Deus, sua visão aparente. Assim, para entender de verdade o universo, a ciência precisa aprender a vê-lo pelo seu lado de dentro, ou seja, a face de Deus.(1) 
             
Deus constrói o universo de combinação em combinação. Resulta daí que o predicado essencial da divindade é uma constante deintegração, que vai sendo equacionada á medida que o próprio cosmo vai se formando,como resultado das combinações que se processam no seu interior. O que a Guita e a Bíblia estão a nos dizer é que o Poder, a Potência, o Verbo, a Palavra Perdida, o Nome Inefável de Deus é essa energia dos princípios que se apresentou a Moisés como "Eu Sou o
que Sou".. (2)  

Encontrar o caminho para esse templo subterrâneo, onde se encontra essa energia primitiva, absoluta, esse Nome Inefável que ninguém, a não ser o verdadeiro iluminado, aquele a quem foi confiado o supremo segredo, sabe pronunciar, é o ensinamento iniciático das sociedades secretas, como a maçonaria, por exemplo. Quem detém esse supremo conhecimento adquire poderes para manipular o proprio processo pelo qual a natureza produz as realidades universais.
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 Notas
(1) Quando Moisés pediu para ver a face de Deus Ele disse que isso não seria possível, pois a glória de Deus (a sua Luz) seria impossível a um molho humano suportar. Assim Deus permitiu que Moisés o visse apenas pelas costas, que é  o seu lado de fora,a matéria, pois o espírito de Deus é pura Luz, pura energia, insuportável aos  olhos humanos.

(2) Eu Sou o que Sou, disse o Senhor a Moisés. Assim Ele se apresentou como o Verbo que admitia todos os predicados. Equivale precisamente aos belos verso da Bhagavad Guita.



João Anatalino
Enviado por João Anatalino em 06/04/2010
Reeditado em 13/04/2010
Código do texto: T2181527
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