A ÚLTIMA CASA DE ÓPIO (Nick Tosches)

"Veja bem, eu precisava ir pro inferno. Eu estava, pode-se dizer, com saudade de casa." Assim principia a obra de Nick Tosches "A Última Casa de Ópio". Livro-reportagem muitíssimo bem escrito e diagramado, com ótima capa e excelente papel, e preço relativamente baixo (R$ 22,50), considerando-se a relação custo-benefício no mercado brasileiro, o texto narra os périplos do autor em torno de uma obsessão: fumar ópio, "fumar ópio numa casa de ópio".

Com uma narrativa irônica e fluida, mas ricamente fundamentada, o narrador primeiro nos introduz no assunto, fazendo uma digressão histórico-sociológica sobre a arte do consumo das "lágrimas de Afrodite" através dos tempos. Depois, sim, conta as peripécias que fez para fumar aquela que também já foi descrita como "a droga celestial". Assevera, porém, que é um cidadão comum, avesso ao consumo de drogas - álcool, inclusive - mas, diabético, deliberou satisfazer certa vontade de viver intensamente, inalando ritualisticamente a "planta do prazer" (ops, prestem atenção: já é a terceira adjetivação elogiosa para o ópio).

Tosches referenda a sua decisão descrevendo o consentimento informal de um padre. Lembrando que a droga hoje ilegal já foi largamente consumida pelas elites dos Estados Unidos e Inglaterra, ele empreende uma longa jornada a partir de New York até o Oriente (Hong Kong, Bangcoc, Camboja), para realizar seu intento, depois de muito perambular e constatar que não há mais casa de ópio na América e Europa.

Três apêndices: 1) O livro traz numa única oração - a última - à página 36, um dos mais instigantes pensamentos sobre qual é a representação do comunismo no mundo político moderno. Leiam-no; 2) As notas de rodapé, tanto do editor quanto do tradutor, complementam extraordinariamente o texto, e não deixam nenhum dado em aberto, seja geográfico ou histórico; 3) Reli "Um Comedor de Ópio", de Charles Baudelaire, que compõe uma trilogia de ensaios, intitulada "Paraísos Artificiais", de 1860. Estudei-o para embasar esta resenha, já que ambos citam e sumariam Thomas de Quincey, autor inglês que em 1822 lançou aquela que é considerada a viga-mestra sobre o tema, "Confissões de Um Comedor de Ópio". Mas, ouso dizê-lo, a obra de Nick Tosches complementa e diversas vezes ultrapassa a de Baudelaire, tanto pela riqueza descritiva como pela abordagem ampla e (principalmente) pessoal sobre o tema.

TOSCHES, Nick. A Última Casa de Ópio. Tradução: Michelle A. Vartulli. ISBN 8576161656. SP: Conrad Edit. 1a. ed. 2006.