A Correspondência entre os textos “Quem Quiser Aprender, É Favor Prestar Atenção: Os Biógrafos e a Construção Discursiva da Subjetividade”; “O Intelectual nas Veredas da Oralidade” e “A Casa Jorge Amado”.
Os textos “O Intelectual nas Veredas da Oralidade”, de Cléa Corrêa de Mello, “Quem Quiser Aprender, é Favor Prestar Atenção: Os biógrafos e a construção discursiva da subjetividade”, de Ananda Teixeira do Amaral e “A Casa Jorge Amado”, de Eneida Leal Cunha, se relacionam pelo fato de serem biográficos, ou seja, falam sobre a vida e a obra de pessoas que alcançaram notoriedade através dos trabalhos que desenvolveram enquanto escritores e músico, fazendo, segundo Hoisel (2006), uma “reconstituição escrita do passado”.
Uma resenha crítica sobre a biografia de Luiz Gonzaga, “o rei do Baião”, escrita por Dominique Dreyfus, foi a definição encontrada para o texto de Ananda Teixeira do Amaral. Os primeiros momentos do texto falam de uma carreira que não “deslanchava”, pelo fato de Gonzaga incorporar outros modelos identitários que não eram seus, e, posteriormente, o sucesso advindo com a mudança de comportamento do artista. Para Amaral (2005), “a subjetividade, seguindo essa linha interpretativa, está pautada na lógica do ”conhecer-se a si mesmo”, a verdade que estaria dentro dele, constituiria o cerne do sujeito, uma interioridade que se exterioriza”.
Já o trabalho de Cléa Corrêa de Mello, recorta momentos da vida de Guimarães Rosa, aludindo à figura do autor/vaqueiro/político e a questão do atrelamento das identidades à autenticação da obra. Ela faz inferências e analisa uma entrevista concedida por Guimarães Rosa a Gunter Lorenz, além de fazer analogias entre a pessoa, o autor e a obra. Segundo Mello (2003), “neste sentido, considerar-se vaqueiro implica agregar aos textos literários um teor de legitimidade, porquanto a experiência de vida do autor conferiria modulação autêntica ao universo narrado”.
Já Eneida Leal Cunha descreve a “Casa Jorge Amado”, fundação que abriga os acervos literários, fotográficos e documentais do famoso escritor, ao tempo em que narra passagens importantes vividas pelo mesmo e a construção de suas personagens.
Os textos estabelecem correspondência pelo fato de, na tentativa de ilustrarem/encenarem o real nas construções de discursos biográficos, eles têm como pano de fundo, invariavelmente, a ficção. Conforme Leal (2003),
Como as ficções, ou como qualquer operação ficcional que torna possível a recuperação e ressignificação dos traços da memória, não pode prescindir dos “atos de fingir”, das operações que selecionam ou recalcam, combinam condensam ou deslocam as inscrições fragmentárias do vivido, para reencená-las em um outro lugar.
Um fato comum a esses três textos é o processo de seleção e combinação de eventos e situações utilizados para a composição dos mesmos, que Iser (1983) assim o diz:
Como um ato de fingir, a seleção encontra a sua correspondência intratextual na combinação dos elementos textuais, que abrange tanto a combinalidade do significado verbal, o mundo introduzido no texto, quanto aos esquemas responsáveis pela organização de personagens e ações.
Além disso, eles também compartilham o fato de conterem “práticas centradas na existência do autor como elemento que dá unidade à pluralidade de máscaras, narradores, enunciados”. (HOISEL, p. 36, 2006).
Suas semelhanças ficam latentes porque os sujeitos que tiveram momentos de suas vidas narrados por outrem, conseguiram “ultrapassar os limites do texto e alcançaram o território biográfico, histórico e cultural” (Souza, 2002:116 apud COUTINHO, 2004); transcenderam às suas obras e deixaram marcas que nem a ausência física provocada pelas suas mortes conseguiram apagar, o que pode ser explicado por Foucault (2002), ao dizer que ”nessa medida a função autor excede a sua própria obra”.
REFERÊNCIAS
AMARAL, Amanda Teixeira do. Quem Quiser Aprender, É Favor Prestar Atenção: Os Biógrafos e a Construção Discursiva da Subjetividade. De onde vem o Baião: estudo da construção da imagem de Luiz Gonzaga nos discursos biográfico e acadêmico. Salvador: UFBA/Instituto de Letras, 2005. (Dissertação de Mestrado) Disponível em: http://www.bibliotecadigital.ufba.br/tde_busca/arquivo.php?codarquivo=1403
BLANCO, Rosa Helena. SILVA, Marcia Rios da. (Orgs.) Os Papéis do Autor. Estampa de Letras: literatura, linguística e outras linguagens. Salvador: Quarteto, 2004.
FOUCAULT, Michel. O Que é Um Autor? Lisboa: Passagens. Vega, 2002.
HOISEL, Evelina. Literatura e Biografia: a trama das relações. Grande Sertão Veredas: uma escritura biográfica. Salvador: Academia de Letras da Bahia, 2006.
ISER, Wolfgang. “Os atos de fingir ou o que é fictício num texto ficcional”. In: LIMA, Luiz Costa (Org). Teoria da Literatura em suas fontes. 2ª Ed. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1983.
MELLO, Cléa Corrêa de. O Intelectual nas Veredas da Oralidade. Trabalho apresentado no Colóquio de Pós graduação de Ciência da Literatura da Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2003. Disponível em http://www.ciencialit.letras.ufrj.br/ensaios/mello.htm
SOUZA, Eneida Maria de; MIRANDA, Wander Mello. (Orgs). A Casa Jorge Amado. Arquivos Literários. São Paulo: Ateliê Editorial, 2003.