"A Rua" (crônica de João do Rio)

Descrever a alma carioca através das ruas do Rio, fossem elas urbanas ou suburbanas, definitivamente, foi uma qualidade nata de João do Rio, cronista carioca que, no início do Século XX, teve coragem e talento de sobra para descrever o cotidiano do Rio de Janeiro, sempre com um olhar crítico, que muitas vezes chegava a ser sarcástico. Porém, quanta maestria! Suas crônicas são um verdadeiro aprendizado de Jornalismo Literário e, hoje, porque não, de História.

A poesia com que João do Rio definiu as ruas e as diferenças entre seus frequentadores demonstra uma relação de intensa sensibilidade ao que poderia passar despercebido por muitos, como nos seguintes trechos:

“Algumas dão para malandras, outras para austeras; umas são pretensiosas, outras riem aos transeuntes e o destino as conduz como conduz o homem, misteriosamente, fazendo-as nascer sob uma boa estrela ou sob um signo mau, dando-lhe glórias e sofrimento, matando-as ao cabo de um certo tempo.

Oh! Sim, as ruas têm alma! Há ruas honestas, ruas ambíguas, ruas sinistras, ruas nobres, delicadas, trágicas, depravadas, puras, infames, ruas sem história, ruas tão velhas que bastam para contar a evolução de uma cidade inteira, ruas guerreiras, revoltosas, medrosas, spleenéticas, snobs, ruas aristocráticas, ruas amorosas, ruas covardes, que ficam sem pinga de sangue...”

Ao decorrer da crônica, a relação humana com o ambiente urbano é explorada de forma metafórica e poética, porém eficientemente direta, com poder de síntese em boas idéias.

A impressão que se tem ao ler a obra de João do Rio, seja nesta crônica, como em outras de sua autoria, é a de que o cronista explorava fielmente uma linguagem popular para a época, tornando seus escritos acessíveis e, ao mesmo tempo, belos e intensos.

Rafael Saraiva
Enviado por Rafael Saraiva em 03/02/2010
Reeditado em 03/02/2010
Código do texto: T2066145
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