Consumismo é atacado com humor cortante
LITERATURA - [ 29/07 ]
Consumismo é atacado com humor cortante - http://www.cruzeirodosul.inf.br/materia.phl?editoria=42&id=206154
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Wagner Krupa é crítico de arte que vive situações improváveis. A começar pelo convite que recebe para exposição de bio-obras: depois de amassado e arremessado ao fogo, o envelope evita as chamas, transforma-se em um avião de papel, depois em um origami, até retomar a forma original e, novamente como envelope, desliza por debaixo da porta, sumindo do olhar de Krupa. E, para entender como isso acontece (e também o que são bio-obras), é preciso ler o romance Delacroix Escapa das Chamas (Record, 176 páginas, R$ 29), nova aventura proposta pelo escritor e jornalista Edson Aran, editor da revista Playboy
É preciso informar que a trama se passa em São Paulo, no ano de 2068, quando os habitantes se refugiam em cidades-cubo, protegidos em shopping cities, onde moram, consomem e trabalham. Quem vive na periferia, os chamados sem-créditos, é obrigado a disputar espaço com narcotraficantes, monarquistas (separatistas liderados por Dom Pedrinho de Orleans e Bragança, o dom Pedro III) e outros fanáticos.
"A influência da cultura pop em minha obra é enorme", conta o autor. "Claro que li Tolstoi, mas os livros de Alan Moore ou Neil Gaiman me influenciam mais." Daí a escrita de Delacroix Escapa das Chamas ser vertiginosa, com capítulos curtos e envolventes, aqueles que o leitor sempre diz que vai ler só mais um e acaba devorando sete. Não à toa, o livro traz como subtítulo Uma Novela em 4 Tempos.
Ao escrever, Aran parte de um princípio aprendido com Millôr Fernandes, um de seus inspiradores (como, de resto, a turma do antigo Pasquim, como Ivan Lessa, que assina o texto da orelha do livro), segundo o qual o verdadeiro humorista escreve sobre assuntos que incomodam. Assim, para retratar uma sociedade tomada pelo consumismo e praticamente alijada de um pensamento crítico, Aran aposta na bem dosada combinação do humor com a literatura fantástica. O resultado são grupos guerrilheiros conhecidos por Marxistas Teocráticos que jogam o Brasil em uma guerra civil, enquanto a França é transformada em um califado islâmico cujo maior prazer é queimar museus inteiros, embora um quadro de Eugene Delacroix seja salvo e enviado para São Paulo.
Não foi à toa que Aran escolheu as artes visuais para representar a cultura como um todo - em constante mutação, elas oferecem novidades que muitas vezes agridem o senso comum, especialmente de críticos, tornando-se inicialmente alvo de rejeição para, anos depois e apenas as realmente artísticas, se transformarem em referência. "O mesmo sujeito que hoje é bombardeado por fatiar uma vaca e levar seus pedaços a uma galeria ganha, no futuro, a fama de gênio", comenta. "Não é fácil ser contestador e é o tipo de pensamento que privilegio em meu romance."(AE) - http://www.cruzeirodosul.inf.br/materia.phl?editoria=42&id=206154