SAGRADA PAIXÃO (Dyrce Araújo)

Estou com o livro "Sagrada Paixão", com ótimos poemas de Dyrce Araújo às mãos. Caudal, fresco e conciso, é uma vasta ´profanidade´ de incensos sobejados à guisa de nosso olfato intelectualóide. Vide "Fé": "Minha coragem / É nada mais / Que um medo suicida", à página 53, devidamente acomodado ao lado de um Boticelli marmóreo e transcendente. Sequestro poético à luz da beligerância divina.

Em "Crucis" (pg 67): "Maria / De tantos nomes / Imaculada / Redentora / Aparecida / Qual é o tamanho / De tua dor / Diante da tua cruz?",

temos um aprofundamento desse Sagrada Paixão aos intensos jogos verbais que nos traduzem mais que palavras ou sentimentos: trazem consigo todo o logos do mundo, repercutindo em nossa afetividade memorial.

Este livro (de excelente acabamento, publicado Escrituras Editora, SP - diga-se), traz um apelo de nova construção ao mundo das possibilidades afetivas: é possível sim, viver o sagrado sem ser um espiritualista deslocado do mundo presente; é possível ser profano sem radicalizações juvenis e sem perder as nuances dos jogos sentimentais. Também é (muito) possível exercer o direito e o ofício do amar sem abater as asas do pássaro que voa dentro de nós e dos outros. E mais: enternecer-se a não mais poder, e ainda assim, descobrir que o mistério do Amor é duradouro e profundo. E, eternizando Che, é possível ´endurecer sem perder a ternura, jamais!´.

Ao contrário do que nos dizem a avassaladora maioria em suas estéreis relações atuais.

(Sagrada Paixão, Dyrce Araújo, Escrituras Editora, SP, 1996, 79 pg)