Análise do conto "Singularidades de uma rapariga loira "

RESUMO

Singularidades de uma rapariga loira, de 1874, além de uma obra-prima, é o primeiro conto de cunho realista em português.

É uma história de amor. O amor de um jovem honesto e trabalhador, Macário, por uma rapariga loira que "Tinha o carácter louro como o cabelo - se é certo que o louro é uma cor fraca e desbotada: falava pouco, sorria sempre com os seus brancos dentinhos, dizia a tudo «pois sim»; era muito simples, quase indiferente, cheia de transigências". É por esta rapariga que é aparentemente dócil e sem vontade própria que Macário se apaixona, a ponto de sair de casa de seu tio Francisco, onde trabalhava como escriturário e ir até Cabo Verde em negócios, só para merecer a mão de Luísa. No entanto, Luísa é, de fato, um a rapariga loura e singular.

SUMÁRIO

1 Introdução.......................................................................................................6

2 Fundamentos Teóricos..................................................................................7

3 Análise Literária............................................................................................12

4 Elementos da Narrativa................................................................................14

5 Conclusão......................................................................................................20

6 Bibliografia....................................................................................................21

INTRODUÇÃO

Análise dos elementos da narrativa aqui apresentada é fundamentada nos teóricos Othon Gárcia, Edward Forster e Aristóteles, segundo eles a narrativa são compostos por diversos fatores que devem ser levados em conta no momento da leitura da obra, como elementos da narrativa: reconhecimento, clímax, patético, peripécia e desfecho e desenlace.

Cada abordagem tem uma singular importância, pois permitem que conheçam a visão de distintos autores, a respeito do conceito de Enredo, proporcionando uma grande assimilação a partir dessas teorias na prática.

O objetivo de desenvolvê-lo foi o de adquirir conhecimentos e empregá-los no decorrer no curso, assim como no desempenho da profissão.

FUNDAMENTOS TEÓRICOS

Segundo os autores: Aristóteles, Othon Garcia e Edward Forster. O enredo é apresentado com diferenças de idéias sobre tal conceito.

“O enredo (intriga, trama, história, urdidura e fábula) é aquela categoria da narrativa constituída pelo conjunto dos fatos que se encadeiam, dos incidentes ou episódios em que as personagens se envolvem, num determinado tempo e num determinado ambiente, motivadas por conflitos de interesse ou de paixões”.

Baseando-se primeiramente nos fundamentos de Aristóteles têm-se os conceitos de enredo, peripécia, reconhecimento, patético, caráter e desfecho.

Aristóteles conceitua peripécia como:

“Uma viravolta das ações em sentido contrário, como ficou dito; e isso, repete, segundo a verossimilhança ou necessidade; como, no Édipo, quem veio com o propósito de dar alegria a Édipo e libertá-lo do temor com relação à mãe, ao revelar quem ele era, fez o contrário; igualmente, no Linceu; este é levado para morrer e Dânao vai às pós para matá-lo, mas, em conseqüência dos fatos, acabou morrendo Dânao e salvando-se Linceu. É, porém, nas peripécias e nas ações singelas que os poetas acertavam admiravelmente no alvo, que é obter a emoção trágica e os sentimentos de humanidade. Isso se dá quando o herói hábil, porém mau, sai logrado, como Sísifo, e o valente, porém iníquo, sai vencido”.

Segundo Aristóteles, na poética, caráter é “aquilo segundo quê dizemos terem tais ou tais qualidades as figuras em ação”. Segundo o caráter, “as pessoas são tais e tais, mas é segundo as ações que são felizes ou o contrário”. Caráter é “aquilo que mostra a escolha numa situação dúbia: aceitação ou recusa – por isso, carecem de caráter as palavras quando nelas não há absolutamente nada que o interprete aceite ou recuse”.

O reconhecimento, conceitua como “a palavra mesma indica, é a mudança do desconhecimento ao conhecimento, ou à amizade, ou ao ódio, das pessoas marcadas para a ventura ou desdita. O mais belo reconhecimento é o que se dá ao mesmo tempo em que uma peripécia, como aconteceu com Édipo”.

Sobre reconhecimento, escreve ainda que:

“Das espécies de reconhecimento, a primeira é a menos artística e a ela mais comumente se recorre por incapacidade: o reconhecimento por meio de sinais. Desses, uns são congênitos, com a “lança que portam os Filhos da Terra, ou “estrelas”, quais emprega Cárcino no Tiestes; outros são adquiridos, e destes uns no corpo, tais como cicatrizes, outros fora, como os colares ou, como na Tiro, a cesta”. Vêm em segundo lugar os reconhecimentos forjados pelo poeta e por isso não artísticos, por exemplo, na Ifigênia, quando Orestes revela que é Orestes; ela é reconhecida graças à carta, mas ele próprio diz o que o poeta deseja, não o que a fábula requer. A terceira espécie é a do reconhecimento devido a uma lembrança, quando a vista de algum objeto causa sofrimento, como nos Cíprios, de Diceógenes, onde, ao ver o quadro, a personagem chora; igualmente no conto de Alcínos, onde, ao ver o quadro, a personagem chora; igualmente no conto de Alcínos, onde, ouvindo o citaredo, as recordações provocam lágrimas; graças a essas emoções é que foram reconhecidos. A quarta é a que utiliza um silogismo, como Coéfaros: chegou alguém comigo; ninguém se parece comigo senão Orestes; portanto, foi ele quem chegou. Há também um reconhecimento construído num paralogismo dos espectadores, como no Odisseu Falso Mensageiro; ele e ninguém mais armar o arco é invenção do poeta, pura suposição; mesmo se declarasse que reconheceria o arco, sem o ter visto; mas imaginar que se daria a reconhecer por esse meio é um paralogismo”.

Ao mencionar sobre o patético, Aristóteles conceitua como: “consiste numa ação que produz destruição ou sofrimento, [...] algo que acontece entre pessoas que se querem bem, mas um irmão mata ou está a ponto de matar o outro, ou o filho ao pai, a mãe ao filho, o filho à mãe, ou se comete alguma outra monstruosidade semelhante”.

Aristóteles diz que toda tragédia tem um enredo e um desfecho. Entende que “enredo vai do início até aquela parte que é a última antes da mudança para a ventura ou desdita e o desfecho o que vai do começo da mudança até o final”.

Segundo Othon Moacyr Garcia, enredo é:

É aquela categoria da narrativa constituída pelo conjunto dos fatos que se encadeiam, dos incidentes ou episódios em que as personagens se envolvem, num determinado tempo e num determinado ambiente, motivadas por conflitos de interesse ou de paixões. É, em si mesmo, um artifício artesanal, estruturado por um nexo de causa e efeito entre as peripécias que enovelam e caminham para um desfecho. Enredo é, em suam, o a que acontecem é a narrativa mesma. “A matéria do enredo é o tema, que, por sua vez, resulta do tratamento dado pelo autor a determinado assunto”.

Dentro do enredo Othon Garcia cita três estágios progressivos, quais sejam:

A exposição, o narrador explica certas circunstâncias de estória e certa ambiência e introduzindo ou apresentando algumas personagens. A complicação é a fase em que se inicia propriamente o conflito, o choque de interesses entre os protagonistas e o antagonista; o clímax que é o ápice da estaria, o seu ponto de maior tensão, aquele estágio em que o conflito entre as personagens centrais chega a um ponto tal, que já não é possível procrastinar o desfecho. O desfecho ou desenlace é a solução mesma dos conflitos, é o “momento da grande destruição trágica, da morte, das revelações de identidades, da solução dos mistérios, da união dos amantes, da descoberta e morte dos vilões, etc.

Edward M. Forster caracteriza o enredo a partir do que disse Aristóteles e quando a isto ele diz o seguinte: “No drama, toda a felicidade e miséria humanas devem tomar a forma de ação; de outro modo sua existência permaneceria desconhecida”. É esta a grande diferença entre o drama e o romance.

Forster define o enredo:

Como uma narrativa de acontecimentos dispostos em sua seqüência de tempo. Um enredo é também uma narrativa de acontecimentos, cuja ênfase recai sobre a causalidade. “O rei morreu e depois a rainha” – isto é uma história. “Morreu o rei, e depois a rainha morreu de pensar” é um enredo. A seqüência no tempo é preservada, mas o sentido de causalidade obscurece-a. ou vejamos: “A rainha morreu, ninguém sabia por que, até descobrir-se que fora de pesar pela morte do rei”. Este é o enredo com um mistério, uma fórmula capaz de desenvolvimento superior.

Edward M. Forster afirma que um enredo exige inteligência e memória, e que para apreender o enredo é preciso que o leitor inteligente capta-o mentalmente. “A memória e a inteligência estão intimamente relacionadas, pois se não lembramos não podemos compreender”.

Segundo Forster o enredo necessita de incidente, pois faz brotar dos personagens e, uma vez ocorrido, altera essa personagem. “Pessoas e acontecimentos estão estreitamente ligados, efeito que consegue através de tais artifícios”. “O enredo é o romance no seu aspecto lógico intelectual e deve ser emocionalmente e pode ser belo”.

ANÁLISE LITERÁRIA DO CONTO

A SINGULARIDADE DE UMA RAPARIGA LOURA

José Maria Eça de Queirós, nasceu em Póvoa do Varzim 1845. Passou a infância e juventude longe dos pais, pois estes não eram casados. Estudou direito na Universidade de Coimbra. Ligou-se por essa ocasião ao grupo renovador chamado “Escola de Coimbra”, Responsável pela introdução do Realismo em Portugal.

Dedicou-se ao jornalismo depois de formado, e viajou pelo Oriente. Em 1871, participou das “Conferências Democráticas do Cassino Lisbonense” – nova etapa da campanha que implantou em Portugal as novas perspectivas culturais do Realismo falando sobre o “Realismo como nova expressão da arte”. Eça de Queirós é o representante maior da prosa realista em Portugal. Grande renovador do romance abandonou a linha romântica, e estabeleceu uma visão critica da realidade. Afastou-se do estilo clássico, que pendurou por muito tempo na obra de diversos autores românticos, deu a frase uma maior simplicidade, mudando a sintaxe e inovando na combinação das palavras.

Evitou a retórica tradicional e os lugares comuns, criou novas formas de dizer, introduziu neologismos e, principalmente utilizou o adjetivo de maneira inédita e expressiva. Este novo estilo só teve antecessor de Almeida Garrett e valeu a Eça a acusação de galicismo e estabeleceu os fundamentos da prosa moderna da Língua Portuguesa. Enfim, no dia 16 de Agosto de 1900 Eça morre em Paris. Deixava um episódio literário que veio a ser publicado aos poucos.

Obras: O Crime do Padre Amaro, 1876; Segunda edição refundida, 1880; O Primo Basílio, 1878; O Mandarim, 1880; A Relíquia, 1887. Os Maias, 1888; Uma Campanha Alegre, 1890 e 1891; A Ilustre Casa de Ramires, 1900; Correspondência de Fradique Mendes, 1900; Dicionário de Milagres, 1900; A Cidade e as Serras, 1901; Contos, 1902; Prosas Bárbaras, 1903; Cartas de Inglaterra, 1905; Ecos de Paris, 1905; Cartas Familiares e Bilhetes de Paris (1893 – 1896), 1907; Notas Contemporâneas, 1909; A Capital, 1925; O Conde de Abranhos e A Catástrofe, 1925; Correspondência, 1925; Alves & Cia. 1926. O Egito, 1926; Cartas Inéditas de Fradique Mendes e Mais Páginas Esquecidas, 1929; Novas Cartas Inéditas de Eça de Queirós, 1940. Crônicas de Londres, 1944; Cartas de Lisboa, Correspondência do Reino, 1944; Cartas de Eça de Queirós, 1945 e A Tragédia da Rua das Flores, 1980.

O autor Eça de Queiroz tem um olhar crítico e moralista, ele descreve o cotidiano da sociedade lisboeta e permeia todas as suas obras, as quais transmitem ao leitor uma verdadeira sensação de vida, tornando-as sempre atuais. O valor histórico dessas narrativas encontra-se no retrato descritivo dos costumes e das mazelas sociais de Lisboa, foto este que comprova a preocupação do autor em romper com os modelos convencionais do Romantismo. Eça apresenta-nos uma literatura realista que submete as convenções cristãs acerca do casamento e do amor. A partir do enredo das obras citadas, pretende-se identificar as motivações amorosas da trama, que justificam as ações dos personagens principais.

O narrador começa a contar uma história de um homem alto e grosso: tinha uma calva larga, luzidia e lisa. Chamava Macário. Macário começa sua história narrando os fatos que aconteceu anos atrás em que conheceu Luísa. No desenrolar dos fatos Macário depois de tantos anos noivo de Luísa nem desconfiava que ela fosse ladra, por final, ela não se conteve e roubou um anel do mercador de jóias, ele, porém contou para Macário que ela tinha pegado e guardado o anel. Macário até então não acreditava no que estava ouvindo, mas com o passar dos fatos ele lembrou do sumiço de uma jóia em uma reunião que teve na casa dela.

E por final da trama Macário pede para que a rapariga vá embora antes que ele a mande para o Aljube.

ELEMENTOS DA NARRATIVA

Estrutura do Romance – Um conto publicado em 1874.

Foco narrativo – O narrador é também um dos personagens. É um narrador onisciente e onipresente o seu conhecimento da estória é muito restrito, limitando-se aos fatos de que ele diretamente participa. O narrador relata episódios ocorridos simultaneamente em lugares e ou épocas diferentes.

Começou por dizer que o seu caso era simples – e que se chamava Macário.

Devo contar que conheci este homem numa estalagem do Minho. [...]

Tempo e espaço – O narrador começa a relatar que conheceu Macário em setembro na Vila Real em Lisboa.

Macário relata sua vida em 1823 ou 1833, na sua mocidade em que morou com o tio Francisco. Conheceu Luísa em julho.

Personagens – Macário: Quando o narrador conheceu era alto e grosso: tinha uma calva larga, luzidia e lisa, com repas brancas – olhos pretos com a pele em roda engelhada e amarelada, e olheiras papudas. Em julho, Macário era louro com a barba curta. O cabelo era anelado e a sua figura devia ter aquele ar seco e nervoso.

Luísa – Era uma rapariga de vinte anos, talvez – fina, fresca, loura como uma vinheta inglesa: a brancura da pele tinha alguma coisa da transparência velhas das porcelanas, e havia no seu perfil uma linha pura, como de uma medalha antiga, e os velhos poetas pitorescos ter-lhe-iam chamado – pomba, arminho, neve e ouro.

Tio Francisco – a sua possante estatura, os seus óculos de ouro, a sua barba grisalha, em colar, por baixo do queixo, um tique nervoso que tinha numa asa do nariz, a dureza da sua voz, a sua austera e majestosa tranqüilidade, os seus princípios antigos, autoritários e tirânicos, e a brevidade telegráfica das suas palavras.

Mãe de Luísa – uma pele e baça, o busto bem feito e redondo e um aspecto desejável. O cabelo preto solto e anelado.

D. Maria da Graça – Pessoa seca e aguçada, um nariz adunco, uma enorme luneta de tartaruga, a pluma de marabout nos seus cabelos grisalhos.

O tabelião – um homem letrado, latinista e amigo das musas; escrevia num jornal.

Amigo do chapéu de palha - um velho cavaleiro de Malta, trôpego, estúpido e surdo, um beneficiado da Sé, ilustre pela sua voz de tiple.

Seguindo os conceitos de Aristóteles e o roteiro de Otton M. Garcia, mostrarei os elementos narrativos que compõem o Conto A singularidade de uma rapariga loura.

Clímax – Segundo Othon Moacyr Garcia é o ápice da história, o seu ponto de maior tensão, aquele estágio em que o conflito entre as personagens centrais, chega a um ponto tal, que já não é possível procratinar o desfecho. É o nó (início do desfecho).

E iam sair. Luísa trazia um vestido de lã azul, que arrastava um pouco, dando uma ondulação, melodiosa ao seu passo, e as suas mãos pequeninas estavam escondidas num regalo branco.

- Perdão! – disse de repente o caixeiro.

Macário voltou-se.

- O senhor não pagou.

-Macário olhou para ele gravemente.

- Está claro que não. Amanhã venho buscar o anel, pago amanhã.

- Perdão! – insistiu o caixeiro, mas o outro...

- Qual outro? – exclamou Macário com uma voz surpreendida, adiantando-se para o balcão.

- Esta senhora sabe – afirmou o caixeiro. – Essa senhora sabe.

Macário tirou a carteira lentamente.

- Perdão, se há uma conta antiga...

O caixeiro abriu o balcão, e com um aspecto resoluto:

- Não, meu caro senhor, é de agora. É um anel com dois brilhantes que aquela senhora leva.

- Eu! – disse Luísa, com a voz baixa, toda escarlate.

- Que é: Que está a dizer?

E Macário, pálido, com os dentes cerrados, contraído, fitava o caixeiro colericamente.

O caixeiro disse então:

- Essa senhora tirou dali um anel.

Macário ficou imóvel, encarando-o.

- Um anel com dois brilhantes – continuou o rapaz. – Vi perfeitamente.

O caixeiro estava tão excitado, que a sua voz gaguejava, prendia-se espessamente.

- Essa senhora não sei quem é. Mas tirou o anel. Tirou-o dali...[...]

Macário ficou com os braços caídos, o ar abstrato, os beiços brancos; mas de repente, dando um puxão ao casaco, recuperando-se disse ao caixeiro:

- Tem razão. Era distração... Está claro! Esta senhora tinha-se esquecido. É o anel. Sim, senhor, evidentemente. Tem a bondade. Toma, filha toma. Deixa estar, este senhor embrulha-o. Quanto custa?

Abriu a carteira e pagou. [...]

Peripécia – “É uma viravolta das ações em sentido contrário”, Segundo a verossimilhança ou necessidade.

A primeira peripécia seria quando Luísa pediu pra ver os lenços da Índia:

- Agora queria ver lenços da Índia.

E o caixeiro foi buscar um pequenino pacote daqueles lenços, acamados e apertados numa tira de papel dourado.

Macário, que tinha visto naquela visita uma revelação de amor, quase um declaração, esteve todo o dia entregue às impaciências amargas da paixão. Andava distraído, abstrato, pueril, não deu atenção à escrituração, jantou calado, sem escutar o tio Francisco que exaltava as almôndegas, mal reparou no seu ordenado que lhe foi pago em pintos às três horas, e não entendeu bem as recomendações do tio e a preocupação dos caixeiros sobre o desaparecimento dum pacote de lenços da Índia.

[...] Ora, como era necessário no fim do jogo pagar uns tempos ao cavaleiro de Malta, que estava ao lado do beneficiado, Macário tirou da algibeira uma peça e quando o cavaleiro, todo curvado e com um olho pisco, fazia a soma dos tentos nas costas dum ás, Macário conversava com Luísa, e fazia girar sobre o pano verde a sua peça de ouro, como um bilro ou um pião. Era uma peça nova que luzia, faiscava, rodando, e feria a vista como uma bola de névoa dourada. Luísa sorria vendo-o girar, girar, e parecia a Macário que todo o céu, a pureza, a bondade das flores e a castidade das estrelas estavam naquele claro sorriso distraído, espiritual, arcangélico, com que ela seguia o giro fulgurante da peça de ouro nova. Mas, de repente, a peça, correndo até à borda da mesa, caiu para o lado do regaço de Luísa e desapareceu sem se ouvir no soalho de tábuas o seu ruído metálico. [...]

Patético – Consiste numa ação que provoca a morte ou sofrimentos, como a das mortes em cena, das dores agudas, dos ferimentos e ocorrência desse gênero.

[...] E quando liquidou, ficou outra vez pobre. [...]

Quando se viu assim, só e pobre, Macário desatou a chorar. Tudo estava perdido, findo extinto; era necessário recomeçar pacientemente a vida, voltar às longas misérias de Cabo Verde, tornar a tremer os passados desesperos, suar os antigos suores! E Luísa? Macário escreveu-lhe. Depois rasgou a carta. Foi a casa dela: as janelas tinham luz: subiu até ao primeiro andar, mas aí tomou-o uma mágoa, uma cobardia de revelar o desastre, o pavor trêmulo de uma separação, o terror de ela se recusar, negar-se, hesitar! E quereria ela esperar mais? Não se atreveu a falar, explicar, pedir; desceu, pé ante pé. [...]

Reconhecimento – Segundo Aristóteles é a mudança do desconhecimento ao conhecimento, ou à amizade, ou ao ódio, das pessoas marcada para aventura ou desdita. O mais belo reconhecimento é o que se dá ao mesmo tempo em que uma peripécia. Um reconhecimento como peripécia pode acarretar pena ou temor; de ações com tais efeitos é que se entende ser a tragédia uma imitação, a má ou boa sorte dependerá de semelhantes ações.

Depois apanhou o regalo, sacudiu-o brandamente, limpou os beiços com o lenço, deu o braço a Luísa, e diz ao caixeiro: desculpe, desculpe, levo-a, inerte, aterrada, semimorta. [...]

Macário ia maquinalmente, como no fundo de um sonho. Parou a uma esquina. Tinha o braço de Luísa passado no seu; e via-lhe a mão pendente, a sua linda mão de cera, com as veias docemente azuladas, os dedos finos e amorosos: era a mão direita, e aquela mão era a da sua noiva! E, instintivamente, leu o cartaz que anunciara, para esta noite, Palafoz em Saragoça. [...]

- Vai-te! – E fez um gesto, com o punho cerrado.

- Pelo amor de Deus, não me batas aqui! – disse ela, sufocada.

- Vai-te! Podem reparar. Não chores. Olha que vêem. Vai-te!

E chegando-se para ela. Disse baixo:

- És uma ladra!

Desfecho ou desenlace - para Orthon Moacyr é a solução mesma dos conflitos, é o momento da grande destruição trágica, da morte, das revelações de identidades, da solução dos mistérios, da união dos amantes, da descoberta e morte dos vilões.

É quando Macário descobre que sua noiva é uma ladra.

- És uma ladra!

E voltando-lhe as costas, afastou-se, devagar, riscando o chão com a bengala.

À distância, voltou-se: ainda viu, através dos vultos, o seu vestido azul.

Como partiu nessa tarde para a província, não soube mais daquela rapariga loura.

CONCLUSÃO

A análise do conto “A singularidade da rapariga loura” de Eça de Queiroz teve como proposta o estudo das teorias dos teóricos Othon Garcia, Edward Foster e Aristóteles. A abrangência do enredo a partir da análise apurada dos elementos da narrativa foi possível perceber na estrutura a formação da escrita.

É de suma importância aprofundar na análise de quaisquer obras e perceber que a proposta dos teóricos é elevar o caráter crível da linha de raciocínio da teoria literária.

Bibliografia

ARISTÓTELES, HORÁCIO, LONGINHO. A poética Clássica. Tradução Jaime Bruna. 7 ed. São Paulo: Cultrix, 1997.

FORSTER, Edward M. Aspectos do romance. Tradução de Maria Helena Martins. São Paulo: Globo, 1998.

GARCIA, Othon M. Comunicação em prosa moderna. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1988

Pereira barbosa
Enviado por Pereira barbosa em 09/06/2009
Reeditado em 19/10/2009
Código do texto: T1640922
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