Revolvendo a questão da leitura
Dizer que a maioria dos estudantes não gosta de ler parece ser muito simples, entretanto, buscar a gênese deste problema a partir de dados empíricos e históricos, parece ser um caminho ainda pouco trilhado por aqueles que, volta e meia, reacendem a discussão sobre a leitura no Brasil. É justamente por este caminho que envereda o autor Ezequiel Teodoro da Silva em seu livro “Elementos da Pedagogia da Leitura”. Do alto de sua experiência no assunto (Ezequiel já escreveu três outros livros sobre o tema), aliado ao trabalho em universidades, ao período em que presidiu a Associação de Leitura do Brasil e organizou os Congressos brasileiros de leitura; Silva, como muitos outros autores, revela-se um indivíduo extremamente preocupado com essa questão. Fato que o levou a fazer de “Elementos de Pedagogia...” não um livro meramente crítico ou sugestivo com atividades a serem realizadas a fim de despertar o gosto pela leitura, mas sim um instrumento norteador para o docente se localizar nesse labirinto intricado.
O autor, logo no início do livro aponta a escola como o principal responsável por propiciar meios para que os alunos sejam inseridos no processo da leitura, pois sabemos a importância que este ato traz em si, sendo útil em todas as áreas de conhecimento e por toda a vida.
No entanto, é de fundamental importância se verificar em que circunstâncias ocorrem essas condições, bem como as formas em que a leitura acontece na vida escolar.Silva explica e lamenta o que chama de “ensino livresco”, ou seja, o caráter que os livros adquirem ao serem considerados portadores da verdade absoluta e inquestionável; procedimento esse, causador do “engessamento de idéias” por parte dos estudantes; meros reprodutores daquilo que lêem, culpa de textos avessos à realidade em que vivem, da imposição de livros e apostilas para o consumo rápido e pelo pouco uso da biblioteca com o lugar de formação dos leitores, espaço ocupado por máquinas fotocopiadoras muito mais usadas. No capítulo seguinte, o autor afirma que ainda há esperança, apesar dos “percalços” do dia-a-dia. Segundo ele, os professores devem se colocar como leitores, ajudando a verificar as supracitadas condições de leitura em sua(s) escola(s). Embora as suas próprias condições para ler não sejam as esperadas, faz-se necessário que os mestres se unam, analisem criticamente a realidade, livrando-se assim, de ideologias dominantes. Tomando cuidado, por exemplo, com o chamado “paternalismo” ,expresso em distribuições de livros didáticos, que, muitas vezes, são escolhidos sem a participação de educadores e empurrados aos alunos. Na opinião do autor, medidas paliativas como essa nada acrescentam para melhorar os horizontes do tema, antes impõem conceitos. Melhor seria dedicar a devida atenção aos profissionais do magistério para que possam ler e assim formar leitores, não apenas enquanto estão na escola ou academia, mas durante toda a vida.
A obra ainda trata de um tema bastante polêmico, qual seja, “censura nas escolas”. Parece-nos que o autor esteja tratando unicamente da censura do regime militar, aquela que não aceitava questionamentos à ordem vigente. No livro, esse conceito é bem mais amplo; pois aborda tópicos que alertam para os tipos de censura: as questões econômicas que impedem os professores de comprar seus livros se englobam nesse conceito, as listas de livros de literatura impostos nada mais são que mecanismos censores do livre arbítrio. Essas formas de cerceamento convergem e acabam formando uma nova, limitando o aluno de pensar abertamente, ter opinião própria livrando-se do jugo das classes dominantes.
Essa censura sim, bem próxima daquela iniciada em 1964, porém não extinta totalmente em 1985. Ao emitir sua opinião, o autor justifica o posicionamento de alguns educadores com a seguinte afirmação: “Talvez vítimas de tal repressão de pensamento os mestres também, muitas vezes, nutrem conceitos acerca da questão da leitura”. Esses são levantados e analisados pelo autor no 4º capítulo, sem dúvida o mais polêmico da obra. A tendência de pensar que o leitor já vem feito é questionada por Silva. Segundo ele, a leitura é “uma prática social”, derrubando aqui o mito da preguiça, ou falta de vontade como empecilho à prática desse hábito. Aqueles que consideram o método de alfabetização como o responsável pelo problema, certamente discordarão de Silva, pois para ele é mais importante o uso que o professor faz do método. Seguem-se aí outras análises como: o uso de textos que falem da experiência da criança, da TV e a morte da leitura, as fichas da leitura, leitura dinâmica, questionários de compreensão e roteiros de leitura, todos bem expostos e discutidos. Detendo-se ao estudo de Português nas escolas e sua relação com a leitura, a crítica mais contundente de Silva é a de que a língua infelizmente ainda é usada como pretexto para se ensinar regras gramaticais, gerando pessoas avessas ao ato de ler.
As finalidades da leitura escolar são tratadas no capítulo 6 da obra, onde também são enumerados alguns procedimentos interessantes que professores e escolas podem tomar para minimizar o problema. Silva encerra o livro com sugestões de atividades para dinamizar a leitura em sala de aula. Reconhecendo os riscos que corre com tal atitude, o autor considera tais receitas como um partilhamento de caminhos para se virar com a leitura junto com os alunos. Pode parecer que “Elementos”... seja só um livro crítico sobre o “desgosto” da leitura, mas uma análise profunda, faz entender as raízes da questão, bem como as ações pertinentes a se tomar. Os avanços que se desejam, serão frutos de trabalho árduo e sistematizado. A recompensa gratificante. Nesse sentido, o livro Silva é de grande valia. Você, mestre, não deixe de conferir esta obra. Sua importância é grande, pois só se encontrarão soluções para o problema se os professores forem versados no assunto.
SILVA, Ezequiel Teodoro da. Elementos de Pedagogia da Leitura. 2ª Ed. São Paulo: Martins Fontes,1993.