A PRIMEIRA PEDRA, de Sérgio Nazar David

DAVID, Sérgio Nazar. A primeira pedra. Rio de Janeiro: 7Letras, 2006.

Sérgio Nazar David é professor de Literatura Portuguesa e ensaísta. Publicou Freud e a religião (ensaio, Jorge Zahar, 2003) e organizou a edição crítica de Cartas de amor à Viscondessa da Luz, de Almeida Garrett (7Letras / Instituto Português do Livro, 2004).

Lançado em 1997, o livro de poemas O romance do corpo (7Letras) marca a sua estréia na Literatura. Caminho uma vez iniciado e seguido de Onze moedas de chumbo (7Letras, 2001). Mais recentemente, publicou A primeira pedra (7Letras, 2006). Neste seu terceiro livro de poemas, há no diálogo intertextual uma constante re-significação da palavra que se faz poética, pela força da criação literária. O poeta busca “uma poesia falsamente simples, um desespero disfarçado, que entretanto está sempre a realçar o irredutível movimento vida morte vida”. Com este livro, Sérgio Nazar David vem-se destacando como uma das grandes vozes atuais da nossa Literatura.

Do primeiro ao último poema há uma coesão entre os textos, unidos pelo signo da pedra, que se nos apresenta mais que como uma rocha ou uma condição existencial. Em cada um dos trinta poemas, a pedra está sempre em constante transformação. É como se o poeta nos estivesse a dar um segredo, a transmitir um legado: a pedra é filosofal.

Como crê Octavio Paz, a poesia é um “exercício espiritual”, sendo reveladora deste mundo e criadora de outros. O amor, o desejo, o corpo, os laços familiares são parte deste exercício espiritual que é A primeira pedra. Através dessa experiência podemos entender o que o próprio poeta concebeu: “Não se pode dar o que ainda é uma pedra”.

Sérgio Nazar David faz da sua poesia uma centelha a brilhar no escuro, percebendo – mesmo quando envereda pela prosa que se faz poética, como em “Ilhas”, “João Gostoso”, “Zahle” ou “Mortos” – que tudo o que está (aparentemente) morto pode renascer. O signo poético revitaliza-se. Tudo pode ser efêmero, transitório, em estado de desconcerto, mas “uma palavra / acende o que está perdido”. É o que nos diz em “A pedra de Lázaro”.

Pensando como o mestre da nossa Literatura – Guimarães Rosa, em Primeiras Estórias – “tem horas em que, de repente, o mundo vira pequenininho, mas noutro de-repente ele já torna a ser demais de grande, outra vez. A gente deve de esperar o terceiro pensamento”. E assim nos é dado A primeira pedra: de vento, de puro silêncio, como um pensamento revelador, natural, poético.