O dia em que o Manda Chuva salvou Nova York

 

Resenha do desenho animado de longa metragem "Manda Chuva, o filme", produção argentina e mexicana de 2011, 91 minutos de projeção. Anima Estudios e Ilusion Studios. Direção: Alberto Mar. Produção: Fernando de Fuentes, José C. Garcia de Letona, José Luis Massa, Alex Garcia, Mariana Suárez Molnar, Hugo E. Lauria e Romina Crespoloni. Roteiro: Tim Mc Keon e Kevin Seccia. Música: Leoncio Lara.

Vozes: Raul Anaya (Manda Chuva), Jorge Arvizu (Batatinha e Xuxu), Luís Fernando Orozo (Espeto), Eduardo Garza (Bacana), Jesus Guzman (Gênio), Sebastian Liapur (Guarda Belo), Rosalba Sotelo (Trixie), Mario Castaneda (Lucas Boapinta), Ricardo Tejedo (Roger). Com base em personagens criados nos Estados Unidos pelos cartunistas William Hanna e Joseph Barbera em 1961.

Curiosamente constam dois títulos originais: em inglês "Top Cat: the movie"; em espanhol "Don Gato y su pandilla".

 

Lucas Boapinta, um dos mais nojentos vilões dos desenhos animados, tenta convencer o prefeito a liberar verbas para a aquisição de robôs para a polícia.

 

"Não conheço o significado da palavra impossível!"

(Manda Chuva)

 

O Guarda Belo estava crente que se tornaria o novo chefe de polícia. Mas o mundo prefere os corruptos e Boapinta cai de paraquedas no cargo.

 

Muito interessante esse desenho surpreendente em co-produção argentina e mexicana. Por ser co-produção tem um monte de produtores mas felizmente só um diretor, Alberto Mar, que fez um bom trabalho apesar da tosquice da animação, bem ao estilo Hanna e Barbera, a dupla que produziu a série original do Manda Chuva em 1961, ou seja, 50 anos antes.

No original norte-americano Manda Chuva é Top Cat (Primeiro Gato), nesta animação é Don Gato (sic). A meu ver o melhor nome é o brasileiro, Manda Chuva dá bem ideia do personagem e sua ascendência sobre seus cinco companheiros de aventuras e desventuras: Batatinha, Bacana, Xuxu, Espeto e Gênio.

Há mesmo uma certa conotação social nesse desenho cômico: o Manda Chuva, afinal, é um morador de rua, ele e seu grupo. Moram ao ar livre num beco de Nova York e vivem uma relação difícil com o Guarda Belo, espécie de amigo-inimigo. Como um outro Carlitos, Manda Chuva está sempre inventando expedientes para que ele e seus amigos possam se alimentar e até mudar de vida. E não se pode dizer que ele seja honesto: por outro lado ninguém gosta de morrer de fome.

 

Da esquerda para a direita: Xuxu, Manda Chuva, Espeto, Gênio, Batatinha e Bacana.

 

 

Neste "Manda Chuva, o filme", porém, o protagonista banca até o super-herói, salvando uma grande metrópole - e talvez o próprio país - de um louco megalomaníaco, o repugnante Lucas Boapinta, sujeito espalhafatoso, cheio de si e cheio de perdigotos, que através de meios obscuros consegue ser nomeado chefe de polícia em Nova York, que logo transforma numa distopia pior que "1984": a polícia em peso (com excessão do Guarda Belo e certo Gomes) é substituída por policiais robôs; a população é obrigada a ficar em casa de noite, sendo vigiada por teletelas como no romance de George Orwell. A justificativa de Boapinta é que só com vigilância permanente sobre as pessoas é possível evitar o crime.

Como até o prefeito acaba sendo preso o único que poderá se opor a Lucas Boapinta é, por incrível que pareça, o Manda Chuva. Porém o próprio Manda Chuva foi preso sob falsa acusação e o uso de um robô imitando sua figura e cometendo um crime (roubar de crianças); ele é submetido a um julgamento fajuto e mandado propositalmente a um presídio de cachorros (sic).

Trixie, a gatinha "chic" por quem o Manda Chuva se apaixonara, sem ele saber era secretária de Lucas Boapinta e participa da armadilha para tirar o líder gato do caminho. Como se vê, Boapinta reconheceu o Manda Chuva como sério adversário.

O desenho é muito engraçado e parte do humor deve-se ao Gênio, que apesar do nome é o mais estupido entre os auxiliares do Manda Chuva. Quando este declara que não conhece o significado da palavra "impossível" o Gênio diz, a sério, que também não conhece. "Sabemos disso", replica o Manda Chuva. E quando a turma precisa, numa grande emergência - na luta decisiva contra o Boapinta - arrombar um cofre, o Gênio sugere que se faça uso de "alguma coisa sem utilidade". Aí os outros pegam o próprio Gênio e o utilizam como aríete. E não é que dá certo?

O Manda Chuva é um personagem fabuloso em sua esperteza e audácia. Na prisão consegue convencer os cachorros que ele também é cachorro; e convence o buldogue Roger, seu inimigo, que ele é um gato. Num abrir e fechar de olhos o Manda Chuva já está controlando o canil, até que o Guarda Belo, agora em revolta contra Lucas Boapinta, aparece com a turma para resgata-lo. Dali em diante é a batalha final para quebrar o poder de Boapinta e seu exército de robôs e salvar Nova York desse pesadelo.

E o Manda Chuva tem um tal poder de persuasão que põe os robôs em parafuso ao argumentar que eles também estão violando o toque de recolher.

Um filme sensacional e inesquecível. Lida com inverossimilhanças, mas sendo um desenho infantil tudo isso se releva.

 

Rio de Janeiro, 24 de setembro de 2024.