A caminho de casa, Ryozuke hesita em contar a verdade para sua mãe: mas ela própria tirará suas conclusões.

 

"Filho único" de Yazujiro Ozu

 

Resenha de "Hitori musuko", filme da Shochiku (Japão, 1936). Título no Brasil: "Filho único". Direção: Yazujiro Ozu. Argumento: Yazujiro Ozu e James Maki. Roteiro: Tadao Ikeda e Masao Arata. Fotografia: Shojiro Sugimoto. Música: Senji Itô. Preto-e-bramco, 87 minutos.

Elenco:

Choko Iida (Tsune Nonomiya)

Shinichi Himori (Ryozuke Nomomiya)

Masao Hayama (Ryozuke Nomomiya em criança)

Chishu Ryu (Professor Okubo)

Yoshiko Subouchi (Sugiko)

 

Okubo não consegue que seus conselhos dêem certo nem para ele mesmo.

 

Yazujiro Ozu foi um prolifico cineasta japonês hoje reconhecido como um gênio da sétima arte, à qual trouxe a delicadeza de sentimentos tipicamente nipônica. Sobretudo é o cineasta das relações humanas nos meios simples e pobres das pessoas humildes, trabalhadoras e sofredoras.

Ozu gosta de mostrar os trens, por fora e por dentro: o grande veículo que aproxima as pessoas, vencendo as distâncias; e gosta de focalizar as paisagens e os objetos inanimados, em cenas silenciosas e com a fotografia em preto-e-bramco, mais intimista.

"Filho único" é uma bela fábula sobre as ilusões do mundo, em especial a ilusão de "vencer na vida", o que se traduz por fazer dinheiro, enriquecer.

A personagem principal, Tsune Nonomiya (muito bem interpretada por Choko Iida), é operária numa fábrica de seda na pequena cidade Shinshu. Viúva, tem apenas um filho, Ryozuke. Tsune é pobre e não pretende pagar o colégio além do fundamental, e até dá um tapa no garoto por ele ter dito ao professor, Okubo, que iria entrar para o ginásio. Okubo visita Tsune para parabenizá-la e observar que sem estudo não se pode ser alguém na vida.

A ironia nisso tudo é que anos depois, tentando carreira em Tóquio, o mesmo Professor Okubo estará irreconhecível, tendo de se virar como dono de um pequeno negócio de comida, mudou de educador para cozinheiro.

Tsune acaba concordando em mandar o filho para o ginásio e depois o colegial. Ryozuke promete se tornar um grande homem - e aqui começa a grande ilusão.

Para sustentar o sonho Tsune vende a casa que possuía e vai morar num cortiço. É essa mulher, agora envelhecida e empobrecida, que treze anos depois vai visitar o filho que agora mora em Tóquio, casou, tem um filho bebê e exerce a profissão de professor noturno, ganhando uma miséria. Como sempre, professores são mal pagos.

A esposa de Ryozuke, Sugiko, é bondosa e sensível. Ryozuke, porém, sente-se incomodado com a visita da mãe e chega a pedir dinheiro emprestado aos colegas para poder hospeda-la: comida, passeios. Sugiko, ainda por cima, vende o seu quimono.

Ryozuke sente-se envergonhado perante a mãe, por não ter conseguido vemcer na vida; porém Tsune até se zanga com ele por causa disso. Ela não vê o rapaz como um fracasso, até porque ele ainda é jovem. E para ela, o mais importante foi constatar a generosidade de Ryozuke quando o mesmo dá apoio à vizinha, no dia em que o filho foi escoiceado por um cavalo, indo parar no hospital.

Há cenas deliciosas, como quando Ryozuke leva Tsune ao cinema e ela dorme durante a projeção. Entretanto a história na verdade é triste e poética e Tsune uma mulher humildemente heroica, destinada a passar a existência sofrendo na solidão. Ao reornar à sua cidade, disfarçando sua tristeza perante as colegas da fábrica, não sabe quando (ou se) poderá rever o filho, a nora e o neto.

 

Ryozuke não tem grandes coisas para mostrar a sua mãe...

 

Rio de Janeiro, 21 de agosto de 2024.