A baleia (filme)
No filme “a baleia” (2022) é fácil encontrar uma sinopse que retrata um homem obeso e solitário, em um projeto de autodestruição e na busca de uma reconexão com filha adolescente. O cenário é praticamente o mesmo durante todo o filme: um apartamento escuro e mórbido, exceto um cômodo intocável. O personagem não deixa a residência, exceto em algumas cenas de flashback. O fio condutor é o passado. Um passado alicerçado em um dilema: amar e seguir ou ficar e desaparecer. A experiência é forjada por escolhas. O personagem, Charlie, escolheu um caminho e esse lhe encaminhou, consequentemente, para lugares onde os cenários e ações afastaram dos sinais do passado. A primeira escolha foi a separação de um casamento com uma filha. Não sabemos se foi uma nova paixão que causou o fim do casamento ou se o casamento já estava no fim. A segunda escolha foi a separação inesperada com a perda do seu novo amor, o namorado se suicidou. No presente, dentro deste apartamento encapsulado na penumbra deste passado doloroso, Charlie alimenta-se até transbordar-se em seu mal estar. Para alguns a mensagem pode ser da ânsia de uma redenção, para outros, a vontade de tomar para si o desejo de morte. No filme “a baleia”, qual é a mesma história que é contada? Em “Moby Dick”, de Hermann Melville, temos uma caçada desenfreada a uma “baleia assassina”. O narrador, Ismael, desta aventura marítima detalha a obsessão de um homem que perde a sua vida nesta busca implacável. A referência a Moby Dick é uma entre tantas no filme. A metáfora é previsível, mas a história de Charlie não é. O que se repete são as questões que envolvem: a paternidade e a relação com a filha, em uma tentativa de reparar o passado. O trabalho como professor pela palavra e voz, a “câmera fechada” para a imagem-virtual. O corpo em seus excessos e ausências, as compulsões e as bordas. A moral-ética-estética numa filosofia da vida. A reconciliação e a redenção com o tempo: “eu preciso fazer uma coisa certa na minha vida”, diz Charlie quando refere-se a deixar dinheiro para a filha. A questão da culpa e da religião. O filme é uma oportunidade para pensarmos nas relações contemporâneas, as práticas discursivas sobre o corpo, a moral, os preconceitos e outras camadas submersas nos espaços de debate social e acadêmico.