Filmes nacionais que valem a pena assistir
Comento hoje sobre alguns filmes brasileiros, mais ou menos recentes, que vi e gostei. São eles:
- Tempos de paz – de 2009, com atuação espetacular do Dan Stulbach no papel de um imigrante polonês, no início da década de 40, com um sotaque tão perfeito que a gente até esquece que ele é brasileiro. Acho difícil pra caramba o ator ser incumbido de transmitir emoção sem se descuidar de uma maneira de falar que não é a sua natural. Excelente também o Tony Ramos, com quem contracena. O Dan é um imigrante fugindo da guerra que assola o seu país, e o Tony faz o papel do agente brasileiro de imigração, aquele que decidirá se o Brasil dará o visto de entrada ou não. Acontece que o agente tinha sido, até então, um insensível torturador, a serviço da ditadura de Vargas. Ele lança um desafio ao imigrante: terá que fazê-lo derrubar uma lágrima. Se o outro conseguir, ficará no país, caso contrário voltará para o navio. Tenso, né? Será que consegue?
- Anjos do Sol – de 2006, é um filme revoltante, que odiei ter visto, porque ficou muito tempo na minha cabeça, mas acho que todos deveriam vê-lo, já que retrata a realidade de milhares de crianças no Brasil. Conta a história de uma menina, de uns 11 anos, vendida por seus pais, no interior do Maranhão. Já dá pra adivinhar pra que o cara a comprou, né? Pois é, o cara vendeu-a para uma agenciadora de prostitutas virgens (Vera Holtz) que a entregou, num leilão, para um político, daqueles tipo coronel do sertão (Otávio Augusto). Ali começou o calvário da pobrezinha que, depois do primeiro safadão, foi mandada para um garimpo no meio da mata. Eu classificaria este filme na categoria Terror... O ator principal é o excelente Antônio Calloni, chefe dos garimpeiros, que acabou ganhando, merecidamente, alguns prêmios por sua atuação neste filme.
- Cinema, aspirinas e urubus – de 2005, a história se passa nas estradas poeirentas do sertão da Paraíba, ambientada em 1942, ano em que o Brasil entrou na Guerra e mandou prender todos os alemães que viviam aqui. Um desses alemães ( o ator Peter Ketnath é alemão mesmo) era um pacato vendedor da Bayer, que vendia as suas aspirinas, tidas naquela época como milagrosas, usando como marketing um cinema rústico ao ar livre. Por ter atividade tão solitária, ele gostava de dar caronas e numa dessas caronas conhece um rapaz (o excelente ator João Miguel) que queria ir para o Rio de Janeiro, com sonhos de mudar de vida. Por causa da ordem repentina de prisão, a viagem e amizade dos dois tomam um rumo inesperado. Me deu muita pena do alemão, que vivia no Brasil justamente para fugir da guerra em seu país. Quem não gostou deste fillme achou-o muito parado. Deve ser porque não tem perseguições de carros, nem propaganda de armas, nem explosões no final, nem zumbis... Eu gostei. Tanto, que recomendo.
- À beira do caminho – de 2012. Este filme é de uma ternura! Conta a história de um caminhoneiro (outra vez o excelente João Miguel) que encontra escondido em seu caminhão um garoto, que o acaba convencendo a levá-lo até São Paulo, a fim de encontrar o pai, que o abandonara. À medida que vai-se contando o que acontece durante a viagem, também vem à tona a história de vida do caminhoneiro e vamos descobrindo por que ele é tão arredio com o menino. Aliás, a interpretação do menino ( Vinícius Nascimento) é impecável. A trilha sonora é de canções do Roberto e Erasmo. É um fime simples mas gostoso de assistir. – e um dos raros filmes brasileiros onde acaba tudo bem.
- Olhos azuis – de 2010. O filme é brasileiro mas o ator principal é um americano (David Rasche) e, como a maior parte da história é ambientada no aeroporto de Nova Yorque, ele é todo falado em inglês (com legenda, óbvio). Tudo começa com o americano em Pernambuco, procurando uma pessoa. Enquanto ele não a encontra, vamos sabendo de sua história. Ele era um agente do aeroporto, encarregado de fiscalizar a veracidade dos vistos dos estrangeiros. No seu último dia de serviço antes da aposentadoria, super estressado e super mal educado, resolve se divertir humilhando os imigrantes latinos. “Olhos azuis” quer dizer no filme a superioridade com que ele se vê em relação aos outros. Entre os imigrantes um brasileiro (Irandhir Santos). O conflito entre os dois tem tantas palavras duras, de ambas as partes, que parece mesmo uma lavação de roupa suja entre latinos e americanos. Sabe quando um personagem fala tudo o que você gostaria de falar? E também ouve tudo o que a gente já sabe que eles pensam sobre nós... Bem, por causa desse conflito entre eles, ficamos sabendo, no final, o que o americano veio fazer no Brasil.
- La Cecilia - Este filme já é meio antiguinho (foi feito em 1975) mas, como a história é de época, não faz muita diferença. É baseado em fatos verídicos e conta sobre a Colônia Santa Cecília, fundada no final do século XIX, no Paraná, que naquele tempo era floresta ainda, em terras doadas por D. Pedro II a um amigo italiano, o escritor Giovanni Rossi, defensor teórico do anarquismo. A Colônia serviria para colocar em prática as suas ideias. Mas, pensa na dificuldade: um bando de gente desbravando terras e iniciando uma atividade agrícola; com alguns, já conhecedores da técnica e outros, não; e sem que um tivesse mais poder que o outro dentro da Colônia. Tudo teria que ser decidido em assembleias, mesmo as menores coisas. E com o detalhe, das bases do anarquismo, de não haver o senso de família individualizada. Além das várias discordâncias entre eles próprios, ainda havia o entrave da adaptação com os brasileiros, seus vizinhos, pela língua e pela diferença de culturas. Pra complicar tudo, aconteceu a queda da monarquia logo em seguida e aí eram eles contra todo o resto. Achei interessante este filme, não só por abordar um pedaço da História do Brasil, como também pela possibilidade de imaginar uma sociedade como esta, hoje.
- Chamada a Cobrar - excelente atuação da atriz Bete Dorgam, que representa uma ingênua senhora classe média-alta, que recebe uma ligação a cobrar de um sequestrador, que afirma estar com uma de suas filhas. Atendendo à ordem dele e sem poder desligar o celular em nenhum momento, desesperada, ela vai de carro desde São Paulo até o Rio de Janeiro, se encontrar com ele e resgatar a filha. O filme se passa, todinho, durante essa viagem. E o tempo todinho ele fazendo um terrorismo mental com ela pelo telefone (o ator não aparece, só a voz). Ela (e nós) sem saber quem ele é, os inúmeros percalços pelo caminho, a angústia (dela e nossa) aumentando, imaginando a filha nas mãos de um monstro... Não vou contar o final, mas recomendo o filme, até como um alerta para atitudes que tomamos, ou não, no nosso cotidiano. Sobretudo as mulheres.
- Mundo Cão - de 2016. Apesar do título, a história se passa num bairro tranquilo do Rio de Janeiro e refere-se realmente a cães. Não se fala em favelas, tráfico de drogas ou conflito entre policiais e bandidos, como é comum no cinema brasileiro atual. Mas, o dono dos cães ( Lázaro Ramos) é mesmo barra pesada e bate de frente com um funcionário da prefeitura (Babu Santana), porque este recolhera um de seus cães, para ser sacrificado. Depois de tentar em vão recuperá-lo antes de ser sacrificado, ele elabora um plano de vinganca contra o funcionário, usando o seu outro cão (daqueles que metem medo só de olhar) para infernizar a vida do pacato funcionário e seus dois filhos. O pai, o filho garotinho e a filha mais velha (Thainá Duarte) surda e muda, vivem um pesadelo nas mãos dele e lutam, cada um à sua maneira, para se defender. Tenso, muito tenso este filme. Mas é bom.