A MÁQUINA DO TEMPO (The time machine)
A MÁQUINA DO TEMPO (The time machine)
Miguel Carqueija
EUA, Metro Goldwyn Mayer,1960. Produção e direção: George Pal. Roteiro de David Duncan, com base na novela homônima de H.G. Wells. Música: Russel Garcia. Efeitos especiais de Gene Warren e Tim Baar (Oscar de 1960). Elenco: Rod Taylor (George), Yvette Mimieux (Weena), Alan Young (David e James Filby), Sebastian Cabot (Dr. Philip Hillyer), Tom Helmore (Anthony), Whit Bissel (Walter Kemp), Doris Lloyd (Mrs. Watchett), Paul Frees (voz dos anéis).
Até o ano de 1895 a viagem pelo tempo era um tema praticamente ausente da literatura. A própria Ciência, antes da Relatividade, vedava especulações desse tipo. Um dos raros exemplos anteriores a 1895 encontra-se numa obra de Edgar Allan Poe, “Eureka”, espécie de tratado filosófico, metafísico e cosmológico que esse grande autor norte-americano (1809-1849) produziu em 1848. Embora não se trate de ficção, a certa altura Poe introduz uma espécie de conto. Na verdade um conto de ficção científica. Refere Poe a uma curiosa carta encontrada no oceano, dentro de uma garrafa. Uma carta que teria sido escrita em 2848, portanto mil anos à frente do autor. Poe não tenta explicar como tal carta teria viajado em direção ao passado — mas sem dúvida é um proto-exemplo dessa falácia da FC.
Em 1895 saiu a primeira edição, na Inglaterra, de “The time machine” (*), novela assinada por Herbert George Wells, o popular H.G. Wells (1866-1946), um dos mais prestigiados autores de ficção científica de todos os tempos, naquela época em início de carreira. Desde então a “máquina do tempo” tornou-se lugar-comum da FC, desde os quadrinhos do Brucutu até às elocubrações de Spielberg.
Nessa novela o personagem nomeado apenas como o “viajante do tempo” narra a uma platéia cética a sua aterradora viagem ao futuro do mundo, numa perspectiva de milhares de séculos que descortinam o triste destino da raça humana. Quando muitos anos depois o cineasta George Pal, húngaro radicado nos Estados Unidos (1908-1980) adaptou esse livro às telas, manteve-se bem fiel ao plano geral da obra, eliminando porém o seu aspecto sombrio e desesperador. Pal, que em 1953 já havia adaptado outro livro de Wells, “A guerra dos mundos” (1897), fez de “A máquina do tempo” uma aventura escapista, com ênfase no romantismo (daí a tribo dos Elois é totalmente humana e sem aquela idiotia original; e a jovem Weena (Yvette Mimieux) atraente o bastante para o cientista e viajante do tempo, que no filme tem nome, George (Rod Taylor), obviamente referência a Wells. Dessa forma o panorama aterrador presente no livro torna-se menos opressivo.
Nesse futuro incomensuravelmente distante a civilização regrediu e a tribo dos Morlocks, subterrânea e canibal, adquiriu aspecto simiesco. Os Elois, ainda que humanos, são ingênuos e alienados, incapazes de opor resistência aos outros. O fatalismo dos membros da tribo, que vivem aparentemente de forma paradisíaca (conservam inúmeros livros e não sabem lê-los) desespera George, que demonstra a sua ira diante de volumes que se desfazem ao toque da mão. Finalmente ele interfere no drama que se desenrola no futuro, buscando garantir uma chance para os Elois.
O estilo bem próprio de George Pal — considerado um mestre do cinema, embora a meu ver com certas limitações — beneficia os efeitos especiais, que valeram o “Oscar” ao filme — um dos seis Oscars dessa categoria conferidos a Pal. Beneficia, também, uma visão otimista do mundo, como se vê pela fleuma e humor do personagem central, que se diverte com a rápida mudança de indumentária de um manequim da loja em frente, enquanto a máquina avançava no tempo, ano após ano. O cientista representa, também, a retidão de um herói da civilização ocidental, herói por acaso mas que não recua no cumprimento do dever. Talvez seja rasa a moral da película, mas cumpre seus objetivos.
Rod Taylor desempenha bem o seu papel, mas a atração maior está na maravilhosa atriz Yvette Mimieux, que atua descalça e com uma linda túnica, esplêndida em seu tranquilo charme.
Criador dos “puptoons” — bonecos animados bem peculiares — George Pal desenvolveu uma obra que se tornou um dos pilares do cinema fantástico, com filmes importantes como “Destino: Lua” e outros. “A máquina do tempo” tornou-se um clássico.
(*) A rigor a novela foi publicada em 1894, mas em capítulos, na forma de folhetim, antes de ser reunida em livro.
Rio de Janeiro, 27 de dezembro de 1994 a 13 de janeiro de 1995.
A MÁQUINA DO TEMPO (The time machine)
Miguel Carqueija
EUA, Metro Goldwyn Mayer,1960. Produção e direção: George Pal. Roteiro de David Duncan, com base na novela homônima de H.G. Wells. Música: Russel Garcia. Efeitos especiais de Gene Warren e Tim Baar (Oscar de 1960). Elenco: Rod Taylor (George), Yvette Mimieux (Weena), Alan Young (David e James Filby), Sebastian Cabot (Dr. Philip Hillyer), Tom Helmore (Anthony), Whit Bissel (Walter Kemp), Doris Lloyd (Mrs. Watchett), Paul Frees (voz dos anéis).
Até o ano de 1895 a viagem pelo tempo era um tema praticamente ausente da literatura. A própria Ciência, antes da Relatividade, vedava especulações desse tipo. Um dos raros exemplos anteriores a 1895 encontra-se numa obra de Edgar Allan Poe, “Eureka”, espécie de tratado filosófico, metafísico e cosmológico que esse grande autor norte-americano (1809-1849) produziu em 1848. Embora não se trate de ficção, a certa altura Poe introduz uma espécie de conto. Na verdade um conto de ficção científica. Refere Poe a uma curiosa carta encontrada no oceano, dentro de uma garrafa. Uma carta que teria sido escrita em 2848, portanto mil anos à frente do autor. Poe não tenta explicar como tal carta teria viajado em direção ao passado — mas sem dúvida é um proto-exemplo dessa falácia da FC.
Em 1895 saiu a primeira edição, na Inglaterra, de “The time machine” (*), novela assinada por Herbert George Wells, o popular H.G. Wells (1866-1946), um dos mais prestigiados autores de ficção científica de todos os tempos, naquela época em início de carreira. Desde então a “máquina do tempo” tornou-se lugar-comum da FC, desde os quadrinhos do Brucutu até às elocubrações de Spielberg.
Nessa novela o personagem nomeado apenas como o “viajante do tempo” narra a uma platéia cética a sua aterradora viagem ao futuro do mundo, numa perspectiva de milhares de séculos que descortinam o triste destino da raça humana. Quando muitos anos depois o cineasta George Pal, húngaro radicado nos Estados Unidos (1908-1980) adaptou esse livro às telas, manteve-se bem fiel ao plano geral da obra, eliminando porém o seu aspecto sombrio e desesperador. Pal, que em 1953 já havia adaptado outro livro de Wells, “A guerra dos mundos” (1897), fez de “A máquina do tempo” uma aventura escapista, com ênfase no romantismo (daí a tribo dos Elois é totalmente humana e sem aquela idiotia original; e a jovem Weena (Yvette Mimieux) atraente o bastante para o cientista e viajante do tempo, que no filme tem nome, George (Rod Taylor), obviamente referência a Wells. Dessa forma o panorama aterrador presente no livro torna-se menos opressivo.
Nesse futuro incomensuravelmente distante a civilização regrediu e a tribo dos Morlocks, subterrânea e canibal, adquiriu aspecto simiesco. Os Elois, ainda que humanos, são ingênuos e alienados, incapazes de opor resistência aos outros. O fatalismo dos membros da tribo, que vivem aparentemente de forma paradisíaca (conservam inúmeros livros e não sabem lê-los) desespera George, que demonstra a sua ira diante de volumes que se desfazem ao toque da mão. Finalmente ele interfere no drama que se desenrola no futuro, buscando garantir uma chance para os Elois.
O estilo bem próprio de George Pal — considerado um mestre do cinema, embora a meu ver com certas limitações — beneficia os efeitos especiais, que valeram o “Oscar” ao filme — um dos seis Oscars dessa categoria conferidos a Pal. Beneficia, também, uma visão otimista do mundo, como se vê pela fleuma e humor do personagem central, que se diverte com a rápida mudança de indumentária de um manequim da loja em frente, enquanto a máquina avançava no tempo, ano após ano. O cientista representa, também, a retidão de um herói da civilização ocidental, herói por acaso mas que não recua no cumprimento do dever. Talvez seja rasa a moral da película, mas cumpre seus objetivos.
Rod Taylor desempenha bem o seu papel, mas a atração maior está na maravilhosa atriz Yvette Mimieux, que atua descalça e com uma linda túnica, esplêndida em seu tranquilo charme.
Criador dos “puptoons” — bonecos animados bem peculiares — George Pal desenvolveu uma obra que se tornou um dos pilares do cinema fantástico, com filmes importantes como “Destino: Lua” e outros. “A máquina do tempo” tornou-se um clássico.
(*) A rigor a novela foi publicada em 1894, mas em capítulos, na forma de folhetim, antes de ser reunida em livro.
Rio de Janeiro, 27 de dezembro de 1994 a 13 de janeiro de 1995.