A triste despedida de John Wayne

Resenha do filme "O último pistoleiro" (The shootist/O atirador). Frankswich/Self, EUA, 1976. Apresentação: Dino De Laurentiis. Direção: Don Siegel. Roteiro: Glendon Swarthout (autor da novela original), Scott Hale, Miles Good Swarthout. Música: Elmer Bernstein. Com John Wayne, Lauren Bacall, James Stewart, Ron Howard, Hugh O'Brien, Richard Boone, John Carradine.
Embora já estivesse visivelmente envelhecido em filmes que protagonizou nos anos 60 e primeira metade da década de 1970, ao rodar "The shootist" em 1976, John Wayne já estava quase irreconhecível. Ele foi um campeão do faroeste norte-americano, ou seja o autêntico, atuando desde os anos 30 e tornando-se o ator favorito de John Ford. Criou também sua própria empresa de cinema, a Batjac.
Embora tenha começado na época em que pontificavam os "mocinhos" do faroeste - Tom Mix, Hoppalong Cassidy, Roy Rogers e outros - em geral usavam seus nomes artísticos como nomes dos próprios personagens - "mocinhos" de fitas infantis, puramente honestos que sempre derrotavam os bandidos - Wayne sobreviveu a eles e embora seus personagens variassem o tipo era basicamente o mesmo: o sujeito durão e bom de gatilho, que fazia a sua justiça sem ligar muito para as regras. Auto-confiante, meio cínico, pragmático, injetava um pouco de humor negro em faroestes e filmes de ação. Tipo assim, pergunta uma mulher, num dos filmes: "Por que você o matou? Não foi só conversar com ele?"; resposta: "Nós ficamos sem assunto."
A verdade é que "O último pistoleiro", como filme de despedida de Wayne no gênero "western", é decepcionante. O roteiro é muito mal-ajambrado, com diálogos horríveis. O protagonista, J.B. Books, é um velho pistoleiro que foi, inclusive, xerife. No começo do século 20, já com o progresso acabando com a selvageria do Oeste, é uma lenda viva, um dos último pistoleiros vivos. Mas ao se saber com câncer volta à sua cidade natal, onde a sua presença provoca medo e repulsa. A maneira como ele se instala na pensão de uma mulher (Bond Rogers) e o difícil relacionamento com ela (apesar de idolatrado pelo filho desta, Gillom) beiram o ridículo. Quanto aos pistoleiros que o hostilizam e o levam ao trágico confronto final, não se entende bem o motivo da raiva.
O veterano James Stewart aparece num papel meio apagado, o Dr. Hortetler, médico local e velho amigo de Books, que confirma o diagnóstico de câncer mortal e sem tratamento a não ser um remédio para aliviar a dor, com o aviso de que em breve não vai adiantar nada. A descrição das dores que virão é tétrica, e o pistoleiro prefere mesmo ir para um confronto mortal.
Ele não é um personagem simpático. Logo de início, reagindo a um assaltante de estrada, mete-lhe uma bala no estômago e o abandona sem prestar socorro. Sua arrogância e grosseria se manifestam mesmo sabendo que está à beira da morte.
No fim das contas, um filme deprimente em vez de ser um fecho de ouro da longa carreira de "cowboy" cinematográfico de John Wayne.



Rio de Janeiro, 6 de fevereiro de 2020.