Coringa: um mostro forjado na e pela sociedade?
O filme Coringa lançado em 3 de outubro nos cinemas, dirigido por Todd Phillips e protagonizado por Joaquin Phoenix não é só um filme, que visa contar a história de um famoso vilão de histórias de quadrinho já retratado diversas vezes no cinema em filmes do Batman. Ele é acima de tudo um retrato de como uma mente criminosa pode ser forjada na e pela sociedade. Antes de ser mostrado como um mero vilão ou monstro psicopata, Arthur Fleck é apenas um palhaço portador de uma doença mental que lhe faz perder o controle do riso. Ele vive com a mãe, uma mulher que também sofre de doença mental. Sofre diversos abusos, violência e discriminação por parte de pessoas da sociedade. E sofre também pela negligência do Estado que suspende seu tratamento na rede pública. Pobre, discriminado e humilhado, Arthur vai aos poucos se transformando num monstro capaz das piores atrocidades.
O filme acertou em cheio em investir na humanização do personagem central, de vilão, Coringa nos é apresentado primeiramente como um homem simples, sonhador, que sonhava em se apresentar como comediante, mas encontra sérios obstáculos pela frente, como sua doença mental e a violência e discriminação de várias pessoas a sua volta. Nesse sentido, o filme mostra a evolução desse homem simples e humilde até se transformar num maníaco assassino.
Se apenas esse fato já não fosse o sufiente para impactar e despertar interesse do público, a interpretação de Joaquin entrega uma atuação brilhante, que emociona, toca, surpreende. No começo você até torce para ele, mas logo não dá mais para torcer, apenas para lamentar o seu destino. Coringa é sem dúvida um mostro forjado na e pela sociedade.
A psicopatia dele nasce como um gatilho desencadeado não só pela violência sofrida por uma sociedade que lhe discriminou e lhe violentou por ser um doente mental, mas também por causa da negligência do Estado que corta seu tratamento e seus remédios. O filme em nenhum momento justifica as atitudes de Coringa, ele não é visto como um anti herói mas também não é um vilão psicopata típico. Isso fica claro quando ele podia ter matado a testemunha de um crime e não mata, dizendo que ele sempre tinha sido bom com ele. O filme inclusive nos coloca a pergunta: até que ponto o Estado é culpado na construção de uma mente maníaca assassina? Teria o Coringa se tornado um monstro se tivesse o tratamento adequado? As pessoas que o agrediram a vida toda são menos monstros que ele (Coringa)? Para mim o Coringa do filme era apenas um homem qualquer simples com uma doença mental e um histórico de violência e discriminação que lhe ajudaram a forjar nele a identidade de um monstro. Nem anti herói, nem vilão, apenas um doente mental que realmente precisava de ajuda e não teve e que por isso se transformou num louco insano.
Diante disso é preciso ressaltar que mais do que uma história arrebatadora e impactante de um vilão já bastante conhecido do público, Coringa é um filme que nos faz pensar sobre a gênese da violência na nossa sociedade contemporânea e ainda denúncia o descaso, o preconceito e a discriminação que pessoas com transtornos mentais sofrem e discute a possibilidade de uma mente assassina ser construída e produzida na e pela sociedade. Nesse sentido, o filme é muito importante pois extrapola a realidade ficcional, ao discutir um tema super atual e bastante relevante no mundo.