RESENHA DO FILME ADAM

Daniella Dantas Calixto

Adam

O filme “Adam” aborda várias questões a respeito da síndrome de Asperger, conhecida como uma forma mais branda de autismo. Através do personagem principal, portador da síndrome, é possível identificar várias características dessa condição, como dificuldade em interações sociais, comportamentos repetitivos, dificuldades em manter contato visual, entre outros.

Indivíduos portadores de Asperger podem desenvolver interesses em áreas especificas. No filme, o personagem trabalha inicialmente como engenheiro eletrônico, área que ele tem habilidade e interesse, o que mostra que apesar de suas limitações o indivíduo pode exercer sua profissão de maneira satisfatória.

Analisando o convívio social, nota-se pessoas que influenciam Adam de maneira positiva e negativa. De forma benéfica se destaca o amigo de seu falecido pai, que o acalma em seus momentos de crise e é seu conselheiro, demonstrando ser um amigo leal e companheiro. Beth, ao conhecer o personagem, também age de maneira satisfatória, uma vez que procura conhecer um pouco a condição de seu novo amigo, buscando compreende-lo melhor.

Já o pai de Beth age de maneira preconceituosa, como fica evidenciado em algumas de suas falas, como ‘’ ele não é para você, será sempre uma criança’’ Nessa cena, fica claro que o personagem não tem conhecimento sobre a síndrome, pois transforma características típicas em meras falácias a respeito de Adam.

Quando os personagens começam uma relação amorosa, a personagem o leva para conhecer seus amigos. Percebe-se então o desconforto que um portador de síndrome de Asperger causa em reuniões de indivíduos “normais’’.

Por ser muito literal e repetitivo na fala, Adam causa uma impressão estranha nos amigos da namorada. Em momento algum alguém procura conversar com ele sem olhar estranho, sem julgar. Nesse momento, o filme faz os telespectadores pensarem o porquê de pessoas diferentes sempre causarem desconforto ao se relacionar com indivíduos aparentemente sem problemas, já que em um mundo tão diverso deveria ter espaço para todos.

Outro aspecto positivo do filme é a abordagem da questão amorosa. Ao se relacionar, o indivíduo projeta no objeto amado (de forma inconsciente ou não) seus anseios, suas inúmeras expectativas. Fica evidente essa questão na trama, quando Beth pergunta a Adam se ele a ama, e os motivos para ela ir embora com ele. Ela espera uma resposta romantizada para suprir sua necessidade de segurança, já que havia acabado de sair de um relacionamento frustrado.

Porém, sabe- se que portadores dessa síndrome possuem dificuldades de expressar seus sentimentos, ela, como pesquisou a respeito da sua condição, deveria saber que aquele momento as expectativas dela falaram mais alto, Adam nunca daria uma resposta satisfatória. Esse fato foi o que culminou no término dos dois.

Para analisar a relação amorosa apresentada no filme, não se pode romantizar, é preciso analisar os dois lados. Primeiramente para dar certo, a pessoa precisa pesquisar e conhecer todos os aspectos da condição do outro, para analisar se é capaz ou não de se adaptar. Para ela, significaria aprender a lidar com possíveis crises, com as estereotipias, e acima de tudo, entender que quando estivesse triste, ou almejando carinho, não teria uma devolutiva como era acostumada.

A personagem também deveria se acostumar com os olhares preconceituosos e julgamentos alheios, pois para a sociedade ainda é difícil aceitar que uma pessoa com condições diferentes também é capaz de amar, se relacionar e ter uma vida normal. Precisaria lidar também com a negação do pai, figura que ela era muito apegada, e que tinha suas expectativas para os relacionamentos da filha, o que é contraditório, já que ele, em sua condição de homem “normal” não honrou a sua própria relação.

Porém, apesar das dificuldades fica o questionamento: uma relação com um homem sem síndrome de Asperger, não teria suas dificuldades também? Obviamente sim. O ser humano é complexo e está sempre em situação de mudança. Ninguém conhece o outro totalmente. Toda relação amorosa precisa ter adaptação, se o indivíduo julgar que vale a pena.

Adam era muito amoroso com Beth, mesmo com suas limitações buscava sair de sua rotina na medida do possível para agrada-la, mesmo que não soubesse expressar seus sentimentos como ela era acostumada, ele conseguia demonstrar interesse naquela relação, como demonstra a cena em que ele caminha na neve até a casa da família da namorada.

Nota- se na história de amor dos dois que uma pessoa em condição especial carrega consigo uma carga imensa de estigmas, Beth poderia ter tentado um pouco mais, e com certeza tentaria se fosse com um indivíduo sem condições especiais. Mas o que ele, como portador de uma síndrome poderia oferecer a ela? Se nem ao menos conseguia expressar em falas o quanto a amava?

Pode se perceber nessas questões o quanto o amor é algo cultural, ele só teria valor para a personagem se fosse expresso em palavras bonitas ou demonstrações de carinho, como abraços. Ela estava tão acostumada a um padrão amoroso que não percebeu as pequenas, porém singelas adaptações e esforços que ele foi capaz de realizar para manter o namoro.

Fica claro que ao se relacionar amorosamente com algum portador de síndrome a pessoa precisa separar suas expectativas do que realmente o outro é capaz de fazer. É necessário levar em consideração aquele velho conselho clichê: dê valor as pequenas coisas. Talvez se Beth tivesse aprofundado mais sobre a síndrome de Asperger, não exigiria tanto de Adam. O conhecimento seria o primeiro passo para manter aquela relação entre indivíduos tão diferentes.

No final do filme, Adam se mudou sozinho para a Califórnia para trabalhar, o que foi uma conquista enorme, já que para o indivíduo asperger sair da rotina é algo muito difícil. Beth decidiu não acompanha-lo, uma vez que se sentiu usada pelo namorado, pois como foi dito anteriormente, ele não conseguiu expressar seu amor em sua fala e sua praticidade e sentido literal das palavras magoaram a personagem e suas expectativas.

O desfecho da trama é incrível, seu final em aberto não romantiza e não torna o filme um mero clichê romântico, cabe ao telespectador imaginar o final que o convém. Adam estava em seu novo emprego, fazendo algo que gostava e possuía habilidade, onde nem mesmo a sua comunicação diferente o atrapalhava. É perceptível suas pequenas mudanças, como na cena em que ele se oferece para ajudar sua colega a carregar caixas pesadas, coisa que ele não fazia antes.

Na cena final, que se passa em um ano depois, ele recebe uma encomenda que era o livro infantil que Beth estava escrevendo quando estavam juntos, onde a história era dos guaxinins que ele a levou para ver no Central Park, e o nome de um deles era Adam. Então o filme termina focado no personagem, que está em um misto de sensações. Ele sorri, como se estivesse lembrando dos momentos bons com Beth.

É um ótimo filme para se pensar na realidade de pessoas especiais, não só Adam, com síndrome de Asperger, mas em todos aqueles que apresentam algo que os diferenciam dos demais. Olhar por uma outra expectativa é necessário a todos para quem sabe, algum dia aqueles que apresentam suas diferenças possam amar, se relacionar e conviver livremente em um ambiente feito para todos, sem julgamentos, sem pré-conceitos, somente com aquilo que é direito de todos: o respeito.

Daniella Dantas
Enviado por Daniella Dantas em 27/09/2018
Código do texto: T6460913
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