NINGUÉM DESEJA A NOITE
O sol adormece, a luz e o calor escorregam-se pelos corredores da penumbra. Vozes e ruídos aos poucos são engolidos pela palidez desse céu outra vez virado do avesso. Apenas vultos e sombras insistem em mostrar que a vida ainda passa por esse lugar. Vidas agora encabuladas por falta de cor, de brilho, de sonhos. Cores antes vivas e atrevidas dão lugar à opacidade; brilhos antes reluzentes e gananciosos ficam arrefecidos; sonhos, estes mal resolvidos ou totalmente protelados para um outro dia, para um outro sol, para um outro amanhecer. E quando, às vezes, essa espera passa a ser demasiadamente penosa, o olhar que antes refletia vontades se torna incrédulos ao deparar-se com o frio da noite.
_ E até quando irá perpetuar essa paisagem invadida por seres de sombras?
A noite chega com a sua sombra assustadora e magnífica, destruindo como uma avalanche toda a visão horizontal. Desnorteia sem piedade qualquer tipo de rumo, aprisiona intenções de segmentos de buscas de novas trilhas pautadas na necessidade de novas conquistas, novos horizontes, novos nortes. A visão que é permitida pontua a falta de mobilidade, aquieta o desatino, desacelera as batidas dos impulsos, só restando delírios e pesadelos. Nesse cenário de penumbras e frio, a morte avizinha. A dor grita impaciente e constantemente chega a cruel realidade, a dura possibilidade de não mais ver a luz, de não mais sentir o calor, de não mais abrir os olhos.
_ Será que ainda existe uma possibilidade?
O sol adormece, a vida cessa, a cortina de luz se fecha. Seres antes mortos aparecem em diversas formas, mas sem cores. Não há cores no escuro e no frio não há cores. O frio revela apenas o branco e de negro pinta-se o céu como se ele não estivesse mais ali, como se ele nunca mais fosse aparecer. Na verdade o céu pertence ao sol, eles sempre andam na mesma direção. E quando o sol adormece, o céu simplesmente desaparece. Foge, se esconde em algum sonho antigo e não faz mais barulho, não deixa pistas nem pegadas. Enquanto o sol está acordado, o céu faz barulho, faz muito barulho. Mas agora há um silêncio de morte, há um silêncio de trevas, há um silêncio em preto.
_ Mas, e as estrelas, onde estarão as estrelas?
A noite chega com seus fantasmas e traumas e pedaços de sonhos enevoados em um céu sombrio. E essa névoa densa de medos ofusca cada último brilho dessas estrelas já mortas. A escuridão que vem do infinito penetra em cada cômodo da mente, invadindo cada pensamento, enfraquecendo a ideia de esperar novos rumos, melhores rumos ou novos sonhos. Sem a possibilidade do “esperar”, a realidade inunda qualquer tipo de sentimento, e essa realidade vinda sem sonhos, só pesadelos impregnam nessa mente. E quando tudo isso acontece, a noite vai se rompendo cada vez mais escura e fria. Todos os reflexos de luz e do calor já se foram, não há mais nenhum vestígio. Só resta uma noite sombria e fria que poderá durar para sempre.
_ Será que existirá algo além dessa noite?