Batman x Super Homem – Filme x Quadrinho
Aprendi a gostar de quadrinhos achando revistas deixadas abandonadas lá em casa (na época em que eu morava com minha avó). Elas não eram guardadas com especial zelo em um lugar específico, ao invés ficavam espalhadas pelos cômodos. De modo que eu não procurava quadrinhos, de repente eu os achava sem querer. Um dos que mais me envolveu foi a série Cavaleiro das Trevas. O traço do desenho é diferente de tudo que eu vira: um desenho composto por traços duros e confiantes. Abusava da silhueta e do uso do contraste entre o preto e cores frias com alguns elementos coloridos. Realmente incrível.
Assim quando saíram os primeiros filmes do Batman inspirados nos quadrinhos do Frank Miller fiquei entusiasmado. Eu sabia que no fim iria me decepcionar, mas tinha que conferir de qualquer modo. Impressionantemente amei Batman - o Cavaleiro das Trevas. Tive lá minhas críticas, mas o filme me surpreendeu positivamente demais. O filme que se seguiu, Batman – O Cavaleiro das Trevas Ressurge não me entusiasmou, mas manteve um Batman forte em um mundo apocalíptico.
E como foi este terceiro filme, “Batman x Super Homem”? Encontrei um primo meu e lhe falei que assisti o filme. Ele falou: deixa eu adivinhar, o Batman e Super Homem começam inimigos, daí aparece um vilão mais forte e eles se aliam. Gente, o filme não é exatamente isto, mas é quase. Não é decepcionante?
Frank Miller escreveu Sin City (A cidade do pecado), escreveu Robocop, escreveu 300 de Esparta, entre outros. O que estes quadrinhos têm em comum? Em todos eles o Estado é uma máquina corrupta e os heróis surgem a despeito do Estado para salvar as vitimas de vilões ou para lutar em causas muito difíceis.
No filme Batman parece um menino mimado (segundo minha namorada ele tem idade mental de uma criança de 12 anos). Na parede do quarto aparecem jornais colados, uma manchete: Batman salva uma pessoa, Super Homem salva um ônibus lotado. No filme parece que o Batman é um menininho mimado. Seu grande argumento para lutar contra o Super é “Vai que um dia ele vira bandido....” Batman e Super lutam e o Batman – com ajuda de criptonita – está ganhando. Daí ele descobre que o nome da mãe do Super tem o mesmo nome de sua mãe, daí se sensibiliza com o super e vira seu aliado. Estou caricaturizando demais? Talvez um pouco, desde o começo da luta o Super quer dizer que só está lutando porque o Lex Luthor tem sua mãe como refém, mas Batman só escuta quando percebe que a mãe do Super tem o mesmo nome da sua mãe.
Outro ponto que não gostei foi o vilão. Lex Luthor é até bem interpretado e um vilão legalzinho. Mas, apesar de ter o nome “Lex Luthor” ele parece mais os vilões malucos do Batman do que qualquer outra coisa. Odeio estes vilões que de alguma maneira conseguem antever todos os movimentos dos seus opositores. Luthor manipula Batman a pegar criptonita e lutar contra o Super antevendo todos os movimentos do Batman... Mais um ponto em que Batman fica um personagem bem fraquinho.
Após se perceberem que tem a mãe com o mesmo nome e se aliarem Super e Batman (e a Mulher Maravilha também) passam a lutar contra um monstro que Luthor faz. Esta luta é o clímax do filme – que termina com o Super morto.
A motivação para a briga entre os heróis no filme é um ciuminho e uma manipulação do vilão. Mas qual a motivação da briga entre os Heróis no quadrinho? Batman é o personagem central e o típico herói de Miller. Um homem que vive em um mundo podre. Nestas condições o certo e o errado se confundem e para ser um herói é preciso viver fora da lei. Já o Super Homem é o oposto, é o típico herói que percebe que o Estado erra e têm suas falhas, mas que não é possível viver fora do Estado de Direito. Se por um lado Batman luta fora das leis contra o Estado (que é corrupto) Super Homem luta pelo Estado de direito – mesmo percebendo suas falhas. Percebam, no quadrinho a luta dos dois heróis é uma luta por dois modos de ver as coisas, é uma luta entre duas éticas diferentes.
No quadrinho Batman é contra o Estado e termina morto (ou se fazendo de morto, mas este é o plano desde o começo). No filme Batman luta com a leniência da polícia (ou seja, ao lado do Estado) e quem termina morto é o super. No filme o Super (por conta de manipulações do Luthor) é colocado contra o Estado (ou seja, o oposto do que ocorre no quadrinho). E quem morre no final não é o Batman, mas o Super.
Enfim, o elemento mais interessante do Batman x Super é a disputa entre visões de mundo (um embate do modo de ser, do ethos). Este elemento é suprimido no filme e a motivação para a briga de ambos é pífia e sua aliança é tão ruim quanto (enfrentar um inimigo comum). Já o papel à margem do Estado é desempenhado, no filme, pelo Super (no quadrinho é pelo Batman). E quem termina morto no quadrinho de Miller é o Batman, quem termina morto no filme é o Super. Percebem que o filme tira o que é mais interessante do quadrinho e, além disso, inverte o papel do Batman e do Super?
De qualquer modo o filme é bem dirigido, tem bom ritmo, não entedia, tem bons efeitos... Assista, mas leia o quadrinho depois, ok?