Vale Proibido e as Sementes Espalhadas ao Vento

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“Quando você espalha suas sementes ao vento e segue adiante, nunca tem nada além de ervas daninhas. É preciso plantá-las, em fileiras certinhas e cuidar de cada uma delas, como se fosse a única.”

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Viver seria mais agradável se pudéssemos acreditar em contos de fada sem medo. Mas, após desvendar o risco escondido por atrás de um sonho, quem conseguirá manter intocada a fé na inocência?

O Vale de San Fernando é uma área urbana, localizada ao sul da California (EUA), onde estão concentrados boa parte dos bairros periféricos da cidade de Los Angeles. Conta com cerca de 2 milhões de habitantes, sendo que grande parte deles são de origem caucasiana, armênia, latina e asiática. A região ainda conserva paisagens campestres bastante aprazíveis, embora também abrigue algumas das mais importantes empresas de entretenimento do mundo como a The Walt Disney Company, a Warner Bros, a Universal, entre outras. É esta área que serve de ambiente à história criada por David Jacobson.

Tobe e Lonnie Sommers (Evan Rachel Wood e Rory Culkin) são irmãos e vivem em companhia do pai (Wade, David Morse). Ela uma adolescente inquieta, desafiadora, de personalidade forte, uma jovem que está descobrindo o mundo e não aceita a autoridade de um pai que não é nada bom em comunicar-se com seus filhos. Seu irmão, ainda um menino, é um solitário, uma criança sensível buscando não ser um estorvo para os mais velhos, mas sem saber bem como se encaixar naquela realidade. Saindo de casa para um passeio na praia, Tobe e alguns amigos param em um posto de gasolina para reabastecer. São atendidos por Harlan (Edward Norton) que se vê atraído pela linda Tobe. Ela deixa evidente seu interesse por ele e Harlan, a partir daquele momento, se vê ligado a ela irremediavelmente. Lonnie também simpatiza com Harlan e passa a considerá-lo como amigo ao ver nele alguém que lhe oferece atenção e companhia. O envolvimento entre os três desagrada ao pai dos irmãos que inicialmente permite, mas depois proíbe seus encontros.

O que determina os acontecimentos é a atitude de Wade. Ele é autoritário, radical, age como um troglodita que adota a agressão e não o diálogo, não se dispõe a explicar aos filhos o perigo que eles podem estar correndo ao se ligarem a um estranho com hábitos esquisitos. Algumas pessoas tem um medo tão grande de monstros que acabam por gerá-los. É o que acontece com Wade, ele cria seu próprio monstro.

Norton tem um dom especial para interpretar personagens no estilo “bom moço” e empresta a Harlan essa característica. A primeira vista não há nada de errado com o personagem, mas para os observadores mais atentos algumas de suas ações já denunciam problemas. Harlan não é mau, pelo contrário, ele tem uma doçura e um sincero desejo de acreditar no melhor que há em si mesmo que tornam difícil não gostar dele mas, por outro lado, demonstra não ter muito senso de responsabilidade, não tem uma base ou um direcionamento para sua vida, não percebe a extensão de seus próprios atos, se veste de forma inadequada e não se relaciona bem com sua própria realidade. É um desajustado que vive na fronteira entre o real e a fantasia. À sua maneira, ele sofre com a própria situação e justamente por sofrer foge de si mesmo. Já Tobe e Lonnie acreditam em Harlan e fazem de Wade seu vilão preferido, enxergam no próprio pai um inimigo quando, na verdade, o inimigo vive, de forma inconsciente, em um amigo.

David Jacobson, logo após escrever a história, procurou entrar em contato com Norton e ofereceu a ele o personagem principal, mesmo sem muita esperança de que o ator se interessasse. Mas ocorreu o contrário, Norton apaixonou-se pelo projeto e não apenas aceitou ser o protagonista como tornou-se também o produtor e assumiu responsabilidade ativa em prol da realização e conclusão da obra. Criou um Harlan impecável, assim como fez Evan Rachel Wood cuja interpretação adaptou-se perfeitamente à problemática Tobe. Norton, em meio ao lançamento do filme, se disse encantado não só pelas nuances psicológicas de Harlan, mas também pela forma como ocorre o envolvimento entre ele e Tobe, além de seu efeito sobre a vida dos dois irmãos. São duas crianças que buscam se ajustar ao mundo, mas que por uma ironia do destino aprendem, de forma dolorosa, que as fronteiras entre o bem e o mal não são claras, que as coisas não são exatamente como se mostram, que para muitos acontecimentos simplesmente não há explicação, que ser pego em um armadilha é muito fácil e que não é culpa de ninguém. Interessante notar que Tobe, Lonnie e Harlan têm o mesmo problema: o pai que os abandona. Wade está presente fisicamente, mas não toca a alma dos filhos. O pai de Harlan, ao abandoná-lo, determinou seu destino.

Vale Proibido é um filme sensível, inteligente e que deixa uma meia sensação de nó na garganta! Merece destaque a seqüência que mostra um passeio noturno de Tobe e Harlan. Parece mesmo um sonho! E é comovente notar a sensibilidade demonstrada por Norton ao mencionar, em entrevista nos extras do DVD, essa passagem como a sua preferida. Essa seqüência retrata uma dessas coisas malucas que simplesmente acontecem uma vez na vida e nunca mais, quando para viver algo especial é preciso não levar a vida tão a sério, se despir das defesas e abraçar a oportunidade de ser feliz. Nesses momentos, inocência e experiência não são garantia para coisa alguma e o risco é o único caminho para quem está vivo.

Título Original: Down in the Valley

Lançamento: 2005 (EUA)

Site Oficial: http://www.downinthevalleyfilm.com

Direção: David Jacobson

Roteiro: David Jacobson

Música: Peter Sallett

Elenco: Edward Norton (Harlan); Evan Rachel Wood (Tobe Sommers); David Morse (Wade); Rory Culkin (Lonnie)