A Origem dos Guardiões (Análise e Crítica)
Mais que presentes debaixo de uma árvore e cestas com ovos de chocolate e bombons, do que nunca devemos nos esquecer é que o Natal e a Páscoa representam, acima de tudo, família, união, alegria, início, recomeço... Esses e outros valores andam meio perdidos nesta sociedade cada vez mais materialista, porém “A Origem dos Guardiões”, a mais recente animação da DreamWorks, tem a proposta de trazê-los de volta, ou de pelo menos nos fazer refletir sobre a sua importância.
Baseado na série de livros infantis “The Guardians of the Childhood”, de William Joyce, a história pode, a princípio, não ser muito familiar aos brasileiros. Isso acontece porque seu protagonista é Jack Frost, uma entidade mitológica referida nos países do norte, quando estes se veem envolvidos pelo frio. Apresentações feitas, a existência de Frost se tornará relevante quando o mesmo for nomeado a guardião e, junto com ícones conhecidos mundialmente como Papai Noel e Coelho da Páscoa, terá de salvar o mundo das crianças da influência maligna do Bicho-Papão, o antagonista do filme, que escapou dos confins da escuridão e pretende assolar o sono delas com pesadelos e medo.
Nesse momento, com a recusa de Frost ao cargo, entra em cena aquela típica fórmula da construção involuntária do herói, que a princípio se assusta com as responsabilidades tamanhas mas que depois acaba se dando conta de que elas sempre estavam dentro da sua essência.
Em termos de roteiro, o fator mais positivo de todos é o fato de os personagens ditos secundários terem destaque como protagonistas. Embora perceptivelmente o fio narrativo é desenrolado por Frost, o longa-metragem se vale da linguagem do videogame e ao espectador apresenta, repletas de um delicioso e ingênuo humor, as magias dos mundos do Papai Noel, do Coelho da Páscoa e da Fada-do-Dente. Mesmo talvez Sandman sendo tomado como o mais figurante entre todos, é justamente o guardião dos sonhos infantis o responsável pela vitória na luta contra o mal. Assim, essa mensagem de equivalência é mais uma das belas lições passadas pela produção.
Em contrapartida, o lado vilanesco não foi desenvolvido o suficiente. Em um excesso de maniqueísmo, o Bicho-Papão não é um personagem carismático e suas justificativas não chegam a convencer. Tudo bem que existiu toda uma intenção de mostrar que aquele que emprega o mal sempre está sozinho e não tem amigos, porém aliados contraporiam a balança e envolveriam mais o público, além de transmitir a mensagem de que o bem sempre vence, mesmo contra forças perversas se exercendo sobre ele.
Tecnicamente, todavia, é um espetáculo primoroso, pois realmente ficamos assustados (no bom sentido) com o nível extraordinário ao qual a computação gráfica vem chegando. Misturando fantasia com uma incrível realidade visual, a direção de Peter Ramsey é minimalista e emocionante, inclusive dando aos efeitos em 3D um destaque à parte, pois existe a tão esperada interatividade, aquilo de que tanto gostamos. A trilha sonora de Alexandre Desplat dialoga com as emoções trabalhadas em cada cena, e ainda com um feliz atributo: nas de ação, que são muitas, as canções não se sobrepõem aos efeitos sonoplásticos, ao mesmo tempo permitindo se fazer presente e se respeitar a magia daqueles momentos.
Em suma, é um filme que vale a pena conferir, posto que diverte tanto a crianças como a seus pais, que não se sentem obrigados a estarem ali somente por causa dos pimpolhos. O fato de o roteiro ser previsível e embebido nos mais básicos clichês inerentes ao gênero decepciona um pouco àqueles que aguardaram tanto pela animação ou que simplesmente buscam algo fora do trivial, mas não desmerece a obra nem tampouco a empobrece. Além das lindas mensagens aos pequenos, refletimos e nos sensibilizamos, rimos e também choramos. Afinal de contas, que há de ruim em adultos nostálgicos embarcarem nessa viagem de sonhos, se lembrarem de sua infância e se emocionarem?
Nota: 8,0.