“O preço do amanhã – In time”
Em tempos de ciberespaço, redes sociais e aprimoramento contínuo da tecnologia, é necessário adaptar-nos enquanto “educadores” a esse universo. Professores precisam adequar-se ao mundo atual, atualizados, antenados e abertos a todo tipo de informação. Para tanto venho me dedicando a encontrar filmes que despertem o interesse, a curiosidade e prendam a atenção de meus alunos, há muito tempo desisti de exibir em sala filmes como Germinal, Danton etc., hoje venho buscando no estilo Blockbuster, nos campeões de bilheteria, algo que sirva para exemplificar os temas e conceitos que preciso trabalhar em sala de aula e ao mesmo tempo busco algo capaz de prender a atenção dessa geração.
O filme “O preço do Amanhã – In time”(2011) é perfeito para utilização em sala de aula no ensino médio por dois motivos: Tem um protagonista que chama a atenção das meninas e tem ação, o que desperta o interesse dos meninos. Sem querer generalizar ou criar estereótipos, é assim que acontece. O filme tem como protagonista Justin Timberlake, queridinho das moças desde os tempos de N’Sync, e roteiro e direção de Andrew Niccol, trata das relações entre o Capital e o Trabalho, em um mundo em que o Tempo é a moeda corrente.
Em um futuro distante, em uma realidade alternativa, a ciência evoluiu tanto na genética que conseguiram realizar o maior desejo dos seres humanos, a imortalidade, no filme, ao completarem vinte e cinco anos todos sem exceção param de envelhecer e uma espécie de relógio implantado sobre a pele começa a funcionar nessa época da vida, e os muitos desprivilegiados, desfavorecidos, precisam trabalhar para ganhar a vida, literalmente, e para que poucos privilegiados sejam imortais muitos precisam morrer.
O filme conta a História de Will Sallas (Justin Timberlake), um jovem do gueto, que vive a correr, pois como membro da classe desfavorecida dessa sociedade fictícia ele não tem tempo a perder, precisa pagar com o seu tempo sua moradia, alimentação, vestuário e tudo mais, logo de início esse conflito, essa tensão é explicitada. Will Salas vive com sua mãe na área mais pobre da cidade, trabalha muito, ganha pouco e divide o que ganha com sua mãe, neste mundo alternativo, o dinheiro não existe mais, o que se ganha ou perde é o tempo. Conforme citado, assim que esse relógio passa a funcionar as pessoas possuem apenas um ano de vida a se contar, e o que se ganha de tempo vai sendo acumulado, logo quando passa a contar o tempo normalmente as pessoas já não tem exatamente um único ano, podendo ter mais ou menos, e se esse tempo chegar a zero, a pessoa morre instantaneamente. No caso de Will Salas, obter tempo é muito difícil e, pois faz parte de uma classe social que é excluída dos processos, impedida do direito de progredir economicamente, ele precisa dividir o que ganha com sua mãe, que logo no início do filme, ao completar seu aniversário de cinquenta anos com aparência de vinte cinco, diga-se de passagem, desejo da maioria das mulheres, manifesta seu desejo de ser avó e Will a responde dizendo não ter tempo para namorar e manter uma relação.
Todos nós desejamos tempo e dinheiro – Nossas ações estão intimamente ligadas a este anseio, trabalhamos além do que gostaríamos, até estarmos extenuados, para um dia aproveitarmos o conforto proporcionado com o que supostamente ganharemos com o nosso trabalho. Logo, acabamos por nos tornar imediatistas, ambiciosos, superficiais, mal humorados e “sem tempo”, na ânsia de aproveitar melhor nosso tempo, não medimos esforços para conquistar mais bem-estar e, assim, gastamos mais dinheiro do que deveríamos. Nessa equação o que conseguimos alcançar é uma vida sem tempo e sem dinheiro, pois quanto menos tempo temos, mais gastamos, nesta produção podemos destacar essa relação entre tempo e dinheiro, só que os detentores do tempo, neste contexto, não vivem como deveriam, não aproveitam seu “tempo”, temem, exploram e tornam-se infelizes.
Neste filme podemos trabalhar com os conceitos de estratificação econômica e de certa forma política, pois ao observarmos uma sociedade, inclusive a deste filme, podemos concluir muitas vezes que os aspectos econômicos são muito mais importantes do que os outros tipos na caracterização dessa sociedade. Sendo assim, quando um indivíduo possuí um poder aquisitivo maior, fatalmente sua posição de poder será valorizada, ele ocupará os melhores cargos e sua profissão será também mais valorizada dentro da sociedade, verificamos dessa forma, a desigualdade social. No filme “o preço do amanhã”, isso é evidenciado, embora se trate de uma história de ficção vários elementos contidos nela assemelham-se propositalmente a nossa sociedade, no filme tudo gira em torno do tempo, tempo que temos para trabalhar, comer, andar, a moeda corrente é o tempo. Nesse mundo tempo é dinheiro. Mas isso seria uma característica dessa sociedade fictícia apenas?
Ora, claro que não possuímos um relógio, ou contador em nossos pulsos, e que não trabalhamos para ganhar tempo, não recebemos em horas ou minutos, mas podemos relacionar as dificuldades enfrentadas por esses indivíduos nessa sociedade com as que enfrentamos na nossa, uma ligação telefônica, por exemplo, nos é cobrada de acordo com o tempo que levamos telefonando, certo? Um professor recebe o equivalente a hora/aula trabalhadas, não é verdade? Bem como vários outros trabalhadores. De uma forma ou de outra somos reféns do tempo... Pagar um milhão de reais mensais a um jogador de futebol e dividir esse valor pelo salário mínimo nacional significa pagar o equivalente a 1.607,72 salários que a maioria dos brasileiros ganha por seu trabalho, R$ 622,00 a este jogador e quanto tempo de suas vidas cada um deles “gasta” trabalhando? O salário mínimo em nosso pais é calculado por horas trabalho certo? Se estimularmos um debate acerca disso em sala de aula acredito que será muito produtivo, pois se pararmos para analisar nosso cotidiano, verificaremos que muito embora nossa moeda não seja o tempo, moradores e moradoras de bairros distantes dos grandes centros nervosos não possuem muito tempo para despender, em sua grande maioria saem de casa antes do sol nascer e regressam tarde da noite, não possuindo tempo para conversar com sua família, divertir-se, descansar adequadamente etc., muitas vezes sem tempo de cuidar da própria saúde.
No mundo de Will um café custa alguns minutos, ligações telefônicas, refeições, diárias em hotéis, enfim tudo custa tempo, que é descontado por uma espécie de máquina de débito onde as pessoas colocam seus pulsos para serem descontados, ou receberem créditos. Os valores impressionam, 1 ano de vida é igual a uma noite em uma suíte de um hotel luxuoso; 59 anos equivalem a um carro importado e se calculássemos quanto teremos que trabalhar (horas/meses/anos), de acordo com nossa profissão, para adquirirmos algum bem que desejamos?. A exploração do capital pelo trabalho fica clara nesta produção, a acumulação da mais valia, do que deveria ser pago de forma justa pelo trabalho semiescravo do trabalhador.
O filme também é riquíssimo para realização de debates em aulas de filosofia, podendo suscitar a reflexão, o questionamento acerca de questões como liberdade, imediatismo, o próprio tempo etc.
Em se tratando de mobilidade, podemos observar que não é algo ordinário e aceitável nessa sociedade de “o preço do amanhã”, como em nossa sociedade capitalista, que embora seja difícil conseguir “passar” de uma classe social a outra, temos essa possibilidade, afinal, como dizem por aí, em nossa sociedade “ O sol nasce para todos” assim que Will ultrapassa as fronteiras que dividem o “mundo dos ricos” do mundo dos pobres os “guardiões do tempo” que seriam o correspondente aos nossos policias são avisados que alguém não autorizado e não pertencente aquele núcleo social transpôs suas “protegidas” fronteiras , além disso não aceitam o fato de Will ter recebido uma grande quantidade de “tempo” de um homem centenário cansado da hipocrisia, ganância, demagogia, enfim dos males existentes nessa sociedade, e o incriminam pelo “roubo do tempo” e pela sua morte. Curiosamente, ou não, Will sente-se atraído pela filha de um homem que possui mais de um milhão de anos, um milionário e ela corresponde, a moça, cansada de temer, cansada de viver na “gaiola” encanta-se com a vontade de viver, com perseverança e com a esperança de Will, e ao conhecer o gueto de onde Will veio, e a população local une-se a ele contra seu pai e os dois juntos empreendem uma missão no melhor estilo de Robin Wood pós-moderno, roubam tempo e distribuem nas chamadas “filas do tempo” que seriam correspondentes aos nossos abrigos, restaurantes populares dentre outros centros sociais e ações que visam atenuar a fome e o sofrimento de milhares, seguem o filme fugindo , roubando e distribuindo tempo, conseguem roubar um milhão de anos do pai da moça e distribuem pelas “filas” ocasionando um verdadeiro “caos” na ordem vigente, invertendo a hierarquia, a segregação e as fronteiras estabelecidas.
E assim podemos concluir que tanto na sociedade em que Will vive e a nossa, a classe dominante tem mais oportunidades de fazer sua história como deseja, pois tem o poder econômico e político nas mãos, ao contrário da classe proletária que, por causa da estrutura social, está desprovida de meios para tal transformação. Podemos também pensar em “segregação socioespacial” ao assistir “o preço do amanhã” devido a existência de fronteiras e níveis neste “universo”, indicando que a cada nível existe um população correspondente vivendo ali, de acordo com o seu poder, com o seu status, prestígio e com a quantidade de “tempo” que possuem.
Tanto na sociedade quanto nos indivíduos, o que importa é como se dá a distribuição dos bens. Em uma sociedade industrial urbanizada, a distribuição dos bens se dá de acordo com a posição ou status do indivíduo, sobretudo se ele possuí uma profissão que lhe garante algum status. A sociedade possuí diversos estratos organizados hierarquicamente conforme o poder, propriedades, valorização e satisfação psicológica, também podemos falar sobre isso baseando-nos no referido filme.
Enfim, é importante despirmo-nos dos preconceitos relacionados a esse tipo de produção, pois podem nos ser muito úteis, “O preço do amanhã” é uma valiosa aquisição no acervo de qualquer professor que busque suscitar a reflexão e o debate em sala aula acerca dessas questões tão urgentes em nossa sociedade, vale a pena compartilhar, vale a pena assistir e usufruir o que essa produção hollywoodiana pode nos oferecer.