Possessão (Análise e Crítica)
Enquanto os anos 1980 transformaram o gênero terror/horror em sofríveis tragicomédias, os anos 1990, como herança disso, trouxeram histórias geralmente protagonizadas por um grupo idiota de adolescentes e vítimas de algum maníaco que sempre tinha uma justificativa: “Pânico”, “Lenda urbana”, “Eu sei o que vocês fizeram no verão passado”, entre outros. A virada do milênio trouxe de volta o sobrenatural às telas, com produções de sucesso de público, como “O chamado”, “O grito” e “Atividade paranormal”, cuja fórmula aparenta desgaste. Então, o que fazer? Que tal voltarmos aos clássicos do horror? É uma tendência forte e que está funcionando, trazendo o gênero de volta à sua dignidade perdida. E neste ínterim está “Possessão”, que lembra (e como não o deveria?) “O exorcista” e tem o clima tenso e ágil de “A profecia”.
Produzido também por Sam Raimi (diretor responsável pela primeira trilogia do Homem-Aranha e pelo clássico “A morte do demônio”), a trama de “Possessão” é simples: em um brechó familiar, Clyde (Jeffrey Dean Morgan) compra para sua filha mais nova Emily (Natasha Calis) uma caixa de madeira pela qual a menina se sente estranhamente atraída. Ninguém sabe, mas nela vive o demônio de origem judaica Abyzau, o possuidor de crianças. Percebendo isso, o pai, divorciado da mãe da menina (vivida por Kyra Sedgwick) fará de tudo para reaver a pureza de sua filha, inclusive sendo seu próprio exorcista e oferecendo sua própria alma à entidade.
Um ponto favorável à trama é o deslocamento da cultura cristã para judaica, que é tão milenar e mitológica quanto a outra. Enquanto é muito comum se ver em filmes de exorcismo a figura de um padre, neste se faz presente a de um rabino (interpretado pelo cantor de reggae judeu Matisyahy) que, em hebraico antigo, luta contra a onipotência do mal. Entretanto, as novidades param aí.
Embora falemos mal dos clichês, gostamos deles e sentimos falta de alguns, ao mesmo tempo em que também queremos ser surpreendidos. Ou seja: ansiamos pela tradição e pelo novo ao mesmo tempo. E “Possessão” não nos traz isso. O roteiro não chega a ser tão previsível, é apenas decente e coerente, mesmo com algumas apelações para justamente dar uma atmosfera de terror à trama. Porém, o pior é a fria direção de Ole Bornedal e a edição não muito correta de cenas: os cortes em algumas delas são grotescos e outras surgem do nada, descontextualizadas e sem um prelúdio, como se não pertencessem a uma sequência lógica de acontecimentos.
Ademais, a trilha sonora de Anton Sanko é o que podemos chamar de sensacionalista, pois, para enfatizar as tomadas principalmente do clímax, chega a volumes ensurdecedores e traz mais a vontade de tapar os ouvidos que os olhos. No mais, as tentativas de humor também não funcionam. Aliás, essa tendência de os próprios filmes de horror não se levarem a sério é um dos tristes legados da geração de 1980, e, no caso de “Possessão”, soa forçado e simplesmente não combina.
Apesar dos erros, a película tem uma narrativa bem contada e um bom time de atores, que conseguem levar ao espectador emoções na dose certa e sem caricaturas. Para quem gosta do gênero em sua levada mais clássica, sem sustos e sem festival de sangue, é uma boa pedida.
Nota: 7,0.