Moonrise Kingdom

Dir: Wes Anderson

Ano: 2012

Minha avaliação: Muito bom, exatamente o que se deve esperar de um grande diretor como Wes Anderson, nem mais nem menos.

Pontos fortes: Os mesmos da maioria de seus filmes, boa direção, roteiro cheio de interessantes, a boa direção de arte e, principalmente, o modo como trata as relações familiares.

Pontos fracos: Primeiro a virada de intenção dos escoteiros (muito brusca). Também não gostei de uma cena em que os amigos de Sam pareciam estar longe (próximo a um barco) em seguida aparecem à sua frente.

Meses atrás um grande amigo me passou o treiler de um filme protagonizado por pré-adolescentes ambientado na década de 60. Fiquei ansiosíssimo para vê-lo primeiro porque o trailer é muito bom, segundo porque é o filme de um dos diretores que mais gosto na atualidade. Meu caso de amor pelo Wes Anderson não se deu no primeiro olhar. Quando vi pela primeira vez ‘Os Excêntricos Tenenbaums’ (não sei onde, deve ter sido na Globo) fiquei meio irritado, sempre fico quando não entendo bem um filme. Não que eu não tivesse entendido a trama, não entendi foi o humor, o olhar tão específico deste diretor tão marcante. Felizmente anos mais tarde o Leo (meu irmão) me falou dos ‘Excêntricos’e eu lhe dei uma segunda chance. De fato, passei a amá-lo, como amo outros filmes do Wes. O que mais gosto é ‘Viajem a Dargeeling’, mas também amei ‘Vida Marinha com Steve Zizu’, (o único filme que achei mais fraquinho foi o ‘Fantástico Sr Raposo`)de modo que quando o Pedro S. postou no face o trailler de Moonrise Kingdom, fiquei animadíssimo.

Vamos ao filme. Laura Bishop e Sam são dois pré-adolescentes que se conhecem em uma apresentação de teatro e começam a se corresponder por cartas (o filme é ambientado na década de 60, se não me engano). Talvez por ambos viverem diversos conflitos eles se identificam um com o outro e decidem embarcar em uma grande aventura: passar dez dias refazendo a trilha que os índios faziam. Obviamente tudo à revelia dos adultos.

Sam foge de seu acampamento de escoteiros e deixa uma cartinha para o escoteiro chefe (interpretado por Edward Norton). A carta o eximia de qualquer culpa. De fato o escoteiro chefe se mostra um profissional atensioso e dedicado. Em uma cena diz que é professor de matemática, mas sua principal profissão é ser escoteiro.

Laura ao sair de casa deixa apenas uma cartinha para o irmão dizendo que vai levar o toca discos por dez dias e que não deve dizer nada aos pais. Quando dão falta dela, a mãe procura pistas em sua casa, e acha um monte de cartas (são a correspondência que ela troca com Sam). O que nos leva para uma sequência maravilhosa! A conversa dos meninos através das cartas é toda cortada. Sugere que há muito em cada uma, apesar de vermos apenas o mínimo para entender que a fuga foi consensual e planejada por ambos.

Sam se mostra um intrépido aventureiro. Sabe ler mapas, sabe truques para não sentir sede (embora a garrafinha de água funcione melhor do que os truques), sabe mascarar o caminho que percorrem. Infelizmente as pessoas que o seguiam também eram exímios escoteiros, de modo que Sam e Laura são encontrados! É uma cena tensa. Um monte de escoteiros de doze anos armados com todo tipo de arma branca (como arco, tacape com pregos...), de outro lado Sam (com uma espingarda de ar comprimido) e Laura. Os escoteiros, prontos para capturar o casal, fazem o ataque trágico. Laura usa uma tesoura para desferir um golpe no menino que primeiro avançou, uma flecha acerta um cachorro inocente. O ataque não foi suficiente para capturar o casal de fugitivos, mas deixou o saldo de um morto (o cachorro) e um ferido. Para piorar, uma tempestade se aproxima. Será que Laura e Sam conseguirão sobreviver à tormenta?

Os adultos estão desnorteados e em polvorosa. Como achar os meninos? Felizmente o narrador do filme (sim, o narrador) aparece e diz que sabe onde encontrá-los. Além de narrador ele é cartógrafo e foi professor de Sam. Por isto sabe do desejo de Sam de refazer o caminho que os índios faziam durante as colheitas.

Laura e Sam estão vivendo felizes. Laura lê para Sam, coloca músicas, eles dançam, vivem um romance, Sam faz um par de brincos para Laura (dois anzóis com besouros pregados), eles furam as orelhas de Laura com os anzois e vão dormir de conchinha na barraca. Só romance. Até que os pais de Laura, o escoteiro chefe, o policial, o narrador e todos os escoteiros os encontram.... O pai (interpretado por Mill Murray) levanta a barraca e deixa o casal em roupas íntimas exposto a todos. Logo são separados. Laura vai viver com a família, Sam vai passar a noite com o policial (que em seguida deve entregá-lo à assistente social). Isto se dá mais ou menos na metade do filme. E agora? O filme não era sobre a fuga de ambos? Como o filme vai se desenrolar a partir de agora? O casal vai de fato ser separado?

Gente, este é um filme de Wes Anderson e tem todos os elementos que estão em todos os seus filmes. O início é como em outros: tem uma casa, uma ambientação característica, a apresentação das pessoas que lá vivem, uma música legal e uma narração. Só o que muda é a fonte da letra usada para apresentar as pessoas. Depois é um filme sobre a família. Tem uma mãe forte, um pai marcante e menos forte, tem a menina loira problemática... caramba, tem até o Bill Murray!

Nos filmes de Wes Anderson, em TODOS os filmes de Wes o filme tem um problema principal que é lido pelas personagens. Nos ‘Excêntricos Tennembowns’ o problema é aceitar de volta o pai (que se apresenta como alguém à beira da morte), no ‘Viagem a Darjelling’ é fazer uma viagem mística e ver a mãe na Sibéria, no ‘Vida Marinha com Steve Sizu’ é (se bem me lembro) gravar um programa para a TV. No Moonrise Kingdom o problema é como resolver o enlace romântico de Sam e Laura. Mas em TODOS os filmes do Wes tem uma questão que envolve o problema como é enxergado pelas personagens, mas que que vai muito além: as relações familiares. As famílias (assim como na vida real) estão cheias de questões que acumularam ao longo de suas vidas. São conflitos, afetos, rancores, amores, alguns sentimentos sórdidos às vezes escondidos atrás de uma máscara de normalidade, alguma ternura que aparece depois de cada conflito. Este caldeirão de sentimentos torna as personagens não apenas interessantes, mas também faz com que nos reconheçamos nelas.

Laura e Sam são separados pelos adultos. Sam – que é órfão e acabou de ser rejeitado pelos pais adotivos - vai para a casa de um melancólico e sensível policial (interpretado pelo Bruce Willis, engraçado, né?). Em seguida será mandado para uma instituição que cuida de meninos sem lar, quiçá para ser alvo de tratamentos de choque. Laura é recebida com amor pelos pais. Ela recebe um banho com todo carinho da mãe, mas expressa apenas raiva por ser separada de seu amor. A “família” de Sam (os meninos escoteiros) se compadece do casal que estava disposto às maiores loucuras para ficarem juntos. Todos (óbviamente à revelia do escoteiro chefe) os meninos resolvem promover a fuga e o casamento de Sam e Laura.

O clímax ocorre na igreja durante o temporal que anualmente assola a ilha. É muito legal que vários personagens contribuem efetivamente para o desenlace. Laura e Sam fogem pelo telhado e sobem para a torre mais alta (o lugar mais perigoso para se estar em uma tempestade). O policial vai atrás deles, o escoteiro chefe sugere que leve uma corda... tudo muito tenso. Enquanto caminha em direção à torre, amarrado no telhado, o policial pergunta pelo walk talk se pode adotar Sam. A assistente social o considera incapaz e recusa a proposta. O policial pergunta as perspectivas legais aos pais de Laura, eles dizem que em um caso semelhante alguém conseguiu a guarda de um garoto. Ou seja, ele conseguirá adotá-lo! Agora só falta conseguir convencer os meninos a não pularem da torre em uma tentativa desesperada (talvez mortal) de fugir. Ele persuade os meninos exatamente meio segundo antes de um raio atingir a torre!