The Company – Uma pintura

The Company – Para além de ‘Intocáveis’e de ‘360’

Dois dias atrás vi um filme sobre balé. Mais precisamente sobre a vivência atrás dos bastidores. ‘The Company’, um dos últimos últimos filmes do Robert Altman. Para quem não sabe ele é um dos grandes diretores americanos. Tem uma obra profícua e marcante. Vi ao menos quatro filmes dele dos quais de quase todos gostei bastante. Tenho muita dificuldade de escrever sobre este filme pois por um lado poderia descreve-lo com bastante propriedade em apenas um parágrafo. Por outro lado poderia escrever páginas e páginas e não esgotar o assunto. Ok, a maioria dos filmes é um pouco assim, mas sinto isto muito mais intensamente em relação aos filmes de Altman.

Em ‘The Company’ Altman pinta em cores suaves e delicadas o panorama de uma companhia de balé: A bailarina que é uma grande estrela mas para quem a idade já pesa um pouco, mostra a bailarina ascendendo para fazer o papel principal pela primeira vez, mostra o diretor delicado, mostra o diretor estranho, mostra o diretor mal educado. Mostra os bastidores de bailarinas que mesmo tendo que se dedicar tanto tem que trabalhar como garçonete ou tem que morar em repúblicas abarrotadas de gente. Mostra o esforço em fazer algo bonito e o desespero de ter que lidar com improvisos. E mostra, é claro, muita dança. Tenho um problema em relação a filmes de dança. Depois que vi a espetacular cena de abertura de Cisne Negro (Aronofski) qualquer outra filmagem de dança perde bastante do brilho. Mesmo assim a cena do balé durante um temporal me encantou. Mais pela dança do que que pela filmagem. Era orgânica, os passos dos dois balarinos se misturavam ora como se fossem apenas um corpo, ora como se seus corpos se encaixassem perfeitamente.

O penúltimo filme sobre o qual escrevi foi ‘Intocáveis’, o último foi ‘360’ (Meireles, 2011). Intocáveis é um filme bem linear onde acompanhamos o desenvolvimento de uma história sobre a relação entre duas pessoas que desenvolvem uma amizade muito profunda. Tem apenas uma história principal bem amarrada por relações de causa e consequência. Se ‘Intocáveis’ fosse outra forma de arte seria uma música em que o desenvolvimento seria bem marcado com momentos fortes e um desfecho claro. ‘360’ é, neste sentido, muito diferente. São várias sub tramas cada uma com seu próprio desenvolvimento. Ao invés de amarradas as sub tramas (ou “plots”) são encostadas umas nas outras. Isto é, as histórias podem ser contadas independentemente umas das outras, elas dividem apenas personagens que participam como protagonistas em uma história mas participam apenas como casualmente da história subsequente. Se ‘360’ fosse outra obra de arte poderia ser um CD, com várias músicas mas com uma proposta estética bem definida, uma obra de arte em si mesma.

The Company, assim como os outros filmes que vi de Altman, seria um quadro. O que importa é uma atmosfera muito bem situada no tempo e no espaço. No caso a atmosfera da uma companhia de Balé. Ele a pinta muito delicadamente e com muito controle sobre as variações de tom, pinta em guache! Nesta pintura, ao contrário do que ocorre em uma música, a tempo não é uma variável importante. Emocionalmente o filme não tem um começo dramático, não tem uma cena que contém o conflito, não tem um desfecho apoteótico. A bailarina principal se machuca e não pode completar a peça, e daí? Altman se importa mais em mostrar como a companhia lida com o inusitado do que de fazer drama sobre isto. A cena seguinte é atrás do palco, o balé ainda está acontecendo, a bailarina diz para o seu namorado, “Nem sei como caí, o que aconteceu com seu braço?”

É isso. Recomendo. ‘The Company’ um filme leve para quem não está a fim de se entreter tranquilamente.