RESENHA SOBRE O FILME CRASH - NO LIMITE

Introdução

O filme Crash está inserido no contexto americano pós-atentado de 11 de setembro, contexto esse marcado pela insegurança e também pela perda da credibilidade no governo Bush. Esses ingredientes geram na população uma enorme desconfiança, que se materializa sob a forma agressiva de preconceito, xenofobia e segregacionismo.

No referido filme, o grupo étnico que define os padrões de nobreza social continua sendo o branco; protótipo que, sem dúvida alguma, ocasiona em alguns elementos - que não se enquadram aos padrões genéricos impostos, uma sensação de frustração por se verem excluídos desse modelo social.

O sentimento de insegurança é perfeitamente percebido nessa sociedade de excelência branca, quando surge a necessidade de contratação de mão-de-obra e de serviço de outros grupos étnicos, é nesse momento que surgem as maiores expressões de tensão, medo, intolerância e racismo.

O longa-metragem mostra várias demonstrações de agressividade e intransigência em suas cenas. Trata-se de um filme forte, polêmico, enérgico e, sobretudo, realista e reflexivo. Um filme que mostra como atitudes isoladas se entrelaçam e tendem a se refletir, afetando, por conseguinte, a toda coletividade.

Como a trama se entrelaça

Crash é subdividido em tramas independentes que se unem no desenrolar do filme como um quebra-cabeça. Nesses termos, para melhor esclarecimento do que foi dito, é imprescindível a lembrança da cena em que um diretor, negro, de cinema e sua esposa - que também é negra, são abordados por policiais brancos em uma operação de revista realizada em uma via pública. Nessa operação, um dos agentes, agindo completamente fora dos padrões éticos e morais exigidos para o cargo, molesta a esposa do diretor de cinema – que acompanha furioso tal procedimento, mas nada pode fazer contra a atitude do policial. Após a chegada do casal em sua casa, a mulher, muito nervosa, questiona o marido sobre sua apatia diante do ocorrido, pois ela queria que ele a defendesse dos abusos do agente de polícia.

Após algumas cenas, esse mesmo policial, que molestara a esposa do diretor, a salva de um acidente automobilístico – acidente que fora ocasionado pelo abalo emocional que a mulher estava sofrendo.

Indispensável, ainda, o retorno à cena da abordagem policial ao casal negro (diretor de cinema e sua esposa), para trazermos à tona a perplexidade do parceiro de serviço do policial agressor – que condena a atitude do colega; mas que infelizmente, logo em seguida, comete um assassinato motivado por racismo.

Conclusão: O Crash da vida real

Apesar do enredo do filme ter se desenrolado em Los Angeles, nos EUA, os temas que por ele foram abordados podem ser claramente percebidos em nosso cotidiano, aqui no Brasil. A ausência de ética, a intolerância e a inalteridade têm aumentado o clima de tensão. Movimentos separatistas – que difundem o racismo, a xenofobia e a discórdia; corrupção e/ou abuso de poder por parte da polícia – que deveria servir à sociedade; escândalos envolvendo nossos representantes – que têm a obrigação de zelar pelo povo, acarretam perdas à população e proporcionam um “engessamento” em toda e qualquer política inclusiva, solidária, pluralista, ética e justa.

Em nossa sociedade real, assim como no filme, a atitude de um componente pode influenciar a vida de outro, como por exemplo: se parte do dinheiro que é desviado de nossos cofres públicos, por políticos inescrupulosos, fosse empregado de forma correta – em prol da sociedade, não teríamos tantos analfabetos, desabrigados, assassinatos nas ruas e mortos nas filas dos hospitais. Igualmente, se todos aprendessem a lidar com o outro, com o “diferente”, viveríamos em uma sociedade mais igualitária, justa, ética. O exercício da alteridade, da tolerância e do pluralismo proporciona o aprendizado entre os “diferentes”, consubstanciando as relações interpessoais e tornando possível, de forma pacífica e construtiva, o convívio com os díspares. Brancos e negros, homossexuais e heterossexuais; ricos e pobres; homens e mulheres, todos convivendo de forma pacífica e harmoniosa. Como imaginar um Estado Democrático de Direito, sem o devido respeito às diferenças? Como idealizar um governo para o povo, sem que haja pluralismo político? Como cogitar tempos de paz, sem ética nas relações políticas, particulares e sociais? Como sonhar com justiça se não existe tolerância? Portanto, pode-se concluir que a carência de ética produz um vácuo no qual se propaga uma onda de intolerância, corrupção, tensão social e desarmonia.