Bollywood Dream e o Sonho do Cinema Livre
“A Índia é um país em crise existencial há 5000 anos.” Essa frase, de autoria da própria diretora Beatriz Seigner, acaba por definir bem não só a situação do país como também a de seu filme. Porque, tanto quanto sonhos, Bollywood Dream – O Sonho Bollywoodiano pode ser também um filme sobre crises. Primeira produção cinematográfica em parceria Brasil-Índia, e exibido nesta terça-feira (06/03) no SESC-Bauru como parte do festival “Grito Rock 2012”, ele segue a história de Ana, Luna e Sofia, três brasileiras que deixam para trás toda sua vida no país natal para correrem atrás do sonho de se tornarem atrizes de cinema, mudando-se para a Índia pois “lá eles fazem mais de 800 filmes por ano”. Mas, ao se depararem com a realidade do país, sua mitologia e cultura, elas começam a ter dúvidas de se estão realmente fazendo a coisa certa, principalmente quando percebem que as coisas lá não são assim tão diferentes daqui...semelhanças que ficam bem evidentes já nos primeiros minutos de filme, como no ritual ao deus Ganesha, que se mostra bem parecido com nossa já tradicional oferenda à Iemanjá. Mas a maior semelhança mesmo se dá no tratamento de “mulher-objeto” que elas recebem da indústria de cinema indiana, muito parecido com aquele que haviam deixado para trás no Brasil. E, num movimento um tanto irônico em seu significado, é justamente essa grande semelhança com o país de origem que acaba por criar o tom dramático da adaptação das personagens ao novo mundo em que se encontram.
Apesar de uma produção independente de baixo orçamento (“peguei um empréstimo de R$15000,00 do banco, com a justificativa de comprar um carro, para conseguir fazer o filme. De qualquer jeito, o que eu queria fazer era mesmo dirigir, só que não necessariamente um carro” conta a diretora em bate-papo com os espectadores após a exibição de seu filme), Bollywood Dream nos mostra que somente a falta de verbas não serve como desculpa para se fazer um filme ruim: com uma pós-produção e fotografia caprichadas, fica difícil perceber que tudo aquilo foi feito com um orçamento de pouco mais que dez mil reais. Soma-se a isso uma câmera em estilo documentário em parceria com um roteiro bastante original e o espectador logo se vê imerso no filme, de um modo que só as grandes produções ou clássicos conseguem. O único ponto baixo fica por conta de alguns diálogos; normalmente fluidos e bem realistas, eles tem uma queda brusca quando tentam se tornar mais filosóficos, em certos momento chega a ser até “broxante” de tanta pseudo-intelectualidade rasa. A não ser que a ideia original tenha sido fazer com que as personagens parecessem adolescentes fãs de Bieber e Crepúsculo se achando extremamente intelectuais porque assistem programas como CQC e Globo Repórter, nesse caso os diálogos se tornam assustadoramente convincentes.
Para fechar o evento, após a exibição da película rolou um bate-papo da diretora Beatriz Seigner e o Edgar do Enxame Coletivo (grupo responsável pela distribuição do filme em território nacional), contando sobre como foram as filmagens na Índia, de onde veio a inspiração para o filme e tantas outras histórias, além de abrirem uma discussão sobre cineclubes e a distribuição de filmes no Brasil, incutindo na cabeça de todos os presentes as desigualdades na indústria do cinema nacional e o sonho de uma exibição mais democrática, não só em gêneros, mas também em custo, lugares e qualidade das produções.
Um sonho esse que, ao ser confrontado com a realidade, acaba por nos lembrar das três meninas que se mudaram para a Índia porque queriam ser atriz...
Esperemos que ele não acabe do mesmo jeito.