“A Dama de Ferro” (The Iron Lady)
“A Dama de Ferro” (The Iron Lady)
Que fique claro aos navegantes (clareza traz resultados) que Phyllida Lloyd (diretora) fez um trabalho paradoxal.
Durante boa parte do filme você sente imensa saudades daqueles roteiristas que conseguiam aglutinar uma penca de informações em poucos minutos e assim fazer o espetáculo singrar o mar dos seus sentidos com a graça oriunda da agilidade.
Phyllida deve ter se sentado com os editores dizendo corta a cada 5 segundos para realizar uma chatice descomunal a fim de destacar a senilidade de Margaret Thatcher num contraponto com a sua trajetória, da juventude (Segunda Guerra Mundial) às eleições gerais de 1959, quando foi eleita parlamentar pela região de Finchley. Isso, para começo de conversa.
Phyllida dirigiu “Mamma Mia!”.
Aqui, sua direção gasta um sem número de imagens para destacar, também, o fato de que Thatcher foi a primeira mulher a ser primeira-ministra do Reino Unido. E dá-lhe edição. Todavia, a obra não seria paradoxal se contivesse apenas aspectos por assim dizer negativos. Phyllida compensa noutras cenas, vide a bomba no quarto de hotel, o filho saindo de dentro da TV e a postura austera da soberana “Margaret Streep” explicando que as Falklands são inglesas.
Meryl Streep, deixando claro, (clareza surpreende) não é deste mundo e o conjunto de sua obra deve causar às noviças a mesma sensação que os tocadores de sax sentiam ao ouvir o saxofonista Charlie Parker – alguns jogavam o instrumento no lixo.
The Iron conferiu a essa atriz a terceira estatueta de sua carreira. Meryl, para quem não sabe, é a que mais tem indicações ao prêmio. Aqui ela faz duas Margaret Hilda Thatcher – a poderosa, que resolveu quebrar os ovos para fazer a omelete, e a senil, que passa as horas tateando o passado como um cego procura os móveis da casa, sem contar as incontáveis conversas com o falecido marido, Jim Broadbent na pele de Denis Thatcher. Não se sabe se é um fantasma de fato ou uma mera alucinação e, cá entre nós, isso é irrelevante.
No final de contas uma redundante conclusão acossa o espectador - “A Dama de Ferro” conta uma história interessante.
Dado instante, o médico diz para a velha Thatcher:
- Você tem uma tendência a sentir...- e não completa a frase.
- O que? – ela retruca – o que tenho tendência a sentir? As pessoas não pensam hoje em dia, elas sentem. Um dos maiores problemas da nossa geração é sermos governados por quem liga mais para sentimentos do que para pensamentos e idéias. (...) Cuidado com seus pensamentos, podem se tornar palavras. Cuidado com suas palavras, podem se tornar ações. Vigie suas ações, podem se tornar hábitos. Cuidado com seus hábitos, podem se tornar seu caráter. E cuidado com seu caráter, pode se tornar seu destino.
A Baronesa Thatcher nasceu em 13 de outubro de 1925 e seu pai já lhe desfiava esses ensinamentos, ou seja, como sempre, (mais claro é impossível), não há nada de novo sob o sol.
Durante onze anos e meio – 1980 a 1991 – Thatcher lidou com a caixa de pandora da política britânica, palavra que a envergadura da sua história, desde o básico “uma mulher entre homens”, passando pelas bombas do IRA, recessão, desemprego, greves, privatização, crise do petróleo, Malvinas, sem mencionar seus pares na contradança da política internacional – os xaropes de carteirinha Leonid Brejnev e Ronald Reagan, em suma, tal elipse merecia um trabalho a la “JFK”, com o velho Oliver Stone conduzindo a massa de informação. Como sempre, nem tudo é perfeito.
Mas, os iluminados que nos assistem aconselham o seguinte decreto, diariamente - “Tudo está bem em toda a criação”, e assim, por tabela, Phyllida Lloyd garante o seu território no reino do cinema.
A questão das Malvinas, ventilada entre nós, na época, como alhos disfarçados de bugalhos ganha na verve de Meryl Streep, seu real tamanho:
- Não vou negociar com criminosos e assassinos. A junta militar argentina não passa de uma gangue facista, invadiu nosso território e isso não pode ser tolerado.
Dá gosto ver a verdade ser verbalizada de modo tão firme e natural. Como em todo encargo, há sempre alguma satisfação a ser dada, no caso de Margaret a conversa que ela precisava jogar fora não era para o leiteiro ou para o vendedor de amendoim. Tão logo a frota inglesa desce o atlântico, chega em Londres o secretário de estado norte americano:
- A senhora está pensando entrar em guerra por essas ilhas? Estão a milhares de quilômetros de distância, tem poucos habitantes e são política e economicamente insignificantes.
- Assim como o Havaí – respondeu ela.
Thatcher também era clara.
Cerca de um quarto de século depois (2002), por falta de lucidez, médicos e familiares lhe desaconselharam a falar em público.
Por mais que a indústria do entretenimento insista em dopar as massas com filmes ditos de terror, onde monstros de duas cabeças e dezoito caninos atormentam (ou encantam) a mente abestalhada, o grande e inexorável bicho papão continua sendo a degeneração física do ser humano, conhecida por velhice.
De ferro, de aço ou de marmelo, faz parte do jogo e só acontece com os afortunados.
“A Dama de Ferro” (The Iron Lady)
Que fique claro aos navegantes (clareza traz resultados) que Phyllida Lloyd (diretora) fez um trabalho paradoxal.
Durante boa parte do filme você sente imensa saudades daqueles roteiristas que conseguiam aglutinar uma penca de informações em poucos minutos e assim fazer o espetáculo singrar o mar dos seus sentidos com a graça oriunda da agilidade.
Phyllida deve ter se sentado com os editores dizendo corta a cada 5 segundos para realizar uma chatice descomunal a fim de destacar a senilidade de Margaret Thatcher num contraponto com a sua trajetória, da juventude (Segunda Guerra Mundial) às eleições gerais de 1959, quando foi eleita parlamentar pela região de Finchley. Isso, para começo de conversa.
Phyllida dirigiu “Mamma Mia!”.
Aqui, sua direção gasta um sem número de imagens para destacar, também, o fato de que Thatcher foi a primeira mulher a ser primeira-ministra do Reino Unido. E dá-lhe edição. Todavia, a obra não seria paradoxal se contivesse apenas aspectos por assim dizer negativos. Phyllida compensa noutras cenas, vide a bomba no quarto de hotel, o filho saindo de dentro da TV e a postura austera da soberana “Margaret Streep” explicando que as Falklands são inglesas.
Meryl Streep, deixando claro, (clareza surpreende) não é deste mundo e o conjunto de sua obra deve causar às noviças a mesma sensação que os tocadores de sax sentiam ao ouvir o saxofonista Charlie Parker – alguns jogavam o instrumento no lixo.
The Iron conferiu a essa atriz a terceira estatueta de sua carreira. Meryl, para quem não sabe, é a que mais tem indicações ao prêmio. Aqui ela faz duas Margaret Hilda Thatcher – a poderosa, que resolveu quebrar os ovos para fazer a omelete, e a senil, que passa as horas tateando o passado como um cego procura os móveis da casa, sem contar as incontáveis conversas com o falecido marido, Jim Broadbent na pele de Denis Thatcher. Não se sabe se é um fantasma de fato ou uma mera alucinação e, cá entre nós, isso é irrelevante.
No final de contas uma redundante conclusão acossa o espectador - “A Dama de Ferro” conta uma história interessante.
Dado instante, o médico diz para a velha Thatcher:
- Você tem uma tendência a sentir...- e não completa a frase.
- O que? – ela retruca – o que tenho tendência a sentir? As pessoas não pensam hoje em dia, elas sentem. Um dos maiores problemas da nossa geração é sermos governados por quem liga mais para sentimentos do que para pensamentos e idéias. (...) Cuidado com seus pensamentos, podem se tornar palavras. Cuidado com suas palavras, podem se tornar ações. Vigie suas ações, podem se tornar hábitos. Cuidado com seus hábitos, podem se tornar seu caráter. E cuidado com seu caráter, pode se tornar seu destino.
A Baronesa Thatcher nasceu em 13 de outubro de 1925 e seu pai já lhe desfiava esses ensinamentos, ou seja, como sempre, (mais claro é impossível), não há nada de novo sob o sol.
Durante onze anos e meio – 1980 a 1991 – Thatcher lidou com a caixa de pandora da política britânica, palavra que a envergadura da sua história, desde o básico “uma mulher entre homens”, passando pelas bombas do IRA, recessão, desemprego, greves, privatização, crise do petróleo, Malvinas, sem mencionar seus pares na contradança da política internacional – os xaropes de carteirinha Leonid Brejnev e Ronald Reagan, em suma, tal elipse merecia um trabalho a la “JFK”, com o velho Oliver Stone conduzindo a massa de informação. Como sempre, nem tudo é perfeito.
Mas, os iluminados que nos assistem aconselham o seguinte decreto, diariamente - “Tudo está bem em toda a criação”, e assim, por tabela, Phyllida Lloyd garante o seu território no reino do cinema.
A questão das Malvinas, ventilada entre nós, na época, como alhos disfarçados de bugalhos ganha na verve de Meryl Streep, seu real tamanho:
- Não vou negociar com criminosos e assassinos. A junta militar argentina não passa de uma gangue facista, invadiu nosso território e isso não pode ser tolerado.
Dá gosto ver a verdade ser verbalizada de modo tão firme e natural. Como em todo encargo, há sempre alguma satisfação a ser dada, no caso de Margaret a conversa que ela precisava jogar fora não era para o leiteiro ou para o vendedor de amendoim. Tão logo a frota inglesa desce o atlântico, chega em Londres o secretário de estado norte americano:
- A senhora está pensando entrar em guerra por essas ilhas? Estão a milhares de quilômetros de distância, tem poucos habitantes e são política e economicamente insignificantes.
- Assim como o Havaí – respondeu ela.
Thatcher também era clara.
Cerca de um quarto de século depois (2002), por falta de lucidez, médicos e familiares lhe desaconselharam a falar em público.
Por mais que a indústria do entretenimento insista em dopar as massas com filmes ditos de terror, onde monstros de duas cabeças e dezoito caninos atormentam (ou encantam) a mente abestalhada, o grande e inexorável bicho papão continua sendo a degeneração física do ser humano, conhecida por velhice.
De ferro, de aço ou de marmelo, faz parte do jogo e só acontece com os afortunados.