O Menino Selvagem
CEFET – Diretoria de Graduação - Departamento de
Linguagem e Tecnologia - Curso de Letras
Disciplina: Estudos de Linguagem I
Profa.: Juliana Sabino
Autor da resenha: Luís Antônio Matias Soares
Resenha do Filme:
O Menino Selvagem
Os 83 minutos de O Menino Selvagem, drama filmado em 1969 pelo diretor Francês François Truffaut, traz como elenco principal Jean Cargol (Victor, o menino selvagem), Françoise Seigneur (a governanta Guerin), e o próprio Truffaut (na pele do professor e psiquiatra Jean Itard).
A questão central do filme – a possibilidade ou não de socialização de um indivíduo criado fora da comunidade humana – traz para discussão um tema muito debatido por pesquisadores e cientistas desde o final dos anos sessenta. Bastante se questionava na época a respeito da possibilidade de reinserção social e linguística de um ser humano que não houvera vivenciado qualquer espécie de convivência com outras pessoas.
Na elaboração do filme, Truffaut se baseou na história real do garoto Victor de Aveyron, descrita pelo psiquiatra Jean Itard. O menino fora encontrado por caçadores numa floresta da França, o Cantão de São Sernin, em 1798. Ele aparentemente não experimentara nenhum tipo de socialização. Afastado de toda a convivência, Victor não aprendera a falar ou a andar na posição ereta, tendo sido inicialmente considerado deficiente ou surdo-mudo. É neste contexto que o professor Itard solicita do governo a possibilidade de levar o jovem para sua casa em Paris e - com a ajuda da governanta Guerin e com os dois praticamente assumindo os papéis de pai e mãe do garoto – buscar socializá-lo e reintroduzi-lo na ordem da cultura humana. Tem início então o lento processo de aprendizagem da fala, da escrita e da utilização de outros signos representativos da realidade, como os desenhos. Tudo isso certamente faz recordar as pesquisas de Charles Sanders Peirce, na qual os signos sempre guardam a função de representar algo para alguém, dividindo-se em três categorias ou tipos: o ícone, que se refere ao objeto pela semelhança do signo, como no caso do desenho de uma árvore e conforme se apresenta em determinada cena do filme; o índice, que traz à lembrança indiretamente um objeto como no exemplo do fumo que se faz índice e recordação do fogo; e, finalmente, do símbolo em si mesmo, referindo-se a um objeto que ele designa ou simboliza.
O filme, em preto e branco, é interessante tanto por este aspecto quanto pela excelente atuação de Cargol – o garoto - transmitindo uma idéia bastante precisa sobre o comportamento do verdadeiro menino selvagem.
Cabe destacar, finalmente, o debate teórico que se pode estabelecer a partir das muitas questões abordadas no filme: a possibilidade ou não de integração de um indivíduo isolado ao mundo humano a partir da convivência e da socialização; a discussão entre teorias que entendem a aquisição da linguagem a partir de uma base genética própria e característica da espécie humana – no qual se destacam, por exemplo, as ideias do pesquisador Noam Chomsky - e aquelas que supunham tal aquisição como decorrente do simples contato dos indivíduos nas relações interpessoais, seja por meio da imitação ou de resposta a estímulos, próprias de pesquisadores behavioristas como B. F. Skinner; por fim, cabe citar as discussões geradas a partir de abordagens mais recentes, com a lingüística da enunciação de Roman Jakobson e Émile Benveniste.
Por todos os motivos expostos, este é decerto um filme que eu indicaria não apenas para os demais colegas do curso de Letras do CEFET (Centro Federal de Educação Tecnológica), mas para todos aqueles que se debruçam sobre tais questões em qualquer das áreas das Ciências Humanas e/ou Sociais: a antropologia, a sociologia, a psicologia, as ciências políticas, etc.