A PELE QUE HABITO, de Pedro Almodóvar
A cada dia fica mais complicado falar do e sobre o Amor e, no entanto, é a razão primeira da existência de toda história contada. Os ardis da narrativa evoluem no sentido contrário, na busca da simplicidade se imiscuem até o cerne em busca de conforto para a condição humana de existir. Assim é que, desde a mais bela e mais difundida história de amor, a do deus que entrega seu único filho em sacrifício pelo amor à humanidade, até a de João que por amor edípico a sua mãe acredita no milagre dos feijões, vemos as peripécias de personagens nos labirintos das histórias inventadas que dão suporte a nossa nem sempre benvinda, realidade.
No filme A pele que habito, o mais recente de Pedro Almodáovar, comprova-se o que foi dito. Em resumo é a história de amor entre o design e dono de uma boutique e a vendedora que trabalha pra sua mãe. Ela é gay e ele heterossexual, o que torno inviável a relação. Como resolver esse impasse que só é abordado em alguns segundos de projeção e que pode passar desapercebido mesmo sendo a questão. O diretor mergulha no universo do transplante: operação cirúrgica que consiste na implantação no corpo humano órgão extraído de outro ser humano para nos levar até o ponto de vista dos personagens e sentir, na pele, os paradoxos e contradições do Amor.
O corpo masculino é transformado sem consentimento, com violência e de forma traumática em corpo feminino pelas mãos do cirurgião que perdeu a esposa e a filha numa tentativa de vencer a morte e o "nunca mais" do corvo do poeta. Poe faz seu personagem
dialogar com um corvo numa noite sinistra em que está mergulhado diante do busto de sua finada mulher enquanto busca respostas para a perda. Amor e perda, falta e permanência são os instrumentos ardilosos dessa narrativa cirúrgica. O próprio Amodóvar parece estar no corpo de outros diretores de cinema, despiu-se dos cenários fabulosamente coloridos e decorou suas cenas com réplicas de outros olhares mas, mesmo estando em outros corpos o diretor revela-se mais maduro e em si e nos conta, não apenas uma, mas várias história de amor.
Baltazar