Três dias inesquecíveis
Em 2009, como parte das comemorações pelos 40 anos do Festival de Música de Woodstock, foi lançado o filme Aconteceu em Woodstock. Esse filme conta a história do responsável pelo evento ter acontecido: Elliot Tiber. Esse sujeito pouco conhecido, morava numa cidadezinha onde era o presidente da Câmara de Comércio e já tinha tradição em produzir eventos culturais (ainda que pequenos). Quando soube que o Festival não conseguiu ser realizado em duas cidades, por conta da pressão dos seus habitantes, ele tem uma idéia: chamá-los para sua cidade, onde ele, como membro importante da comunidade, pode arrumar uma licença muito fácil.
Além disso, Elliot estava precisando de dinheiro para pagar a hipoteca do hotel que sua mãe e seu pai tinham. Ele uniu assim a fome com a vontade de comer. Infelizmente, seu terreno não tem a estrutura para sediar o evento, mas ele convence os organizadores a fazerem na fazenda de um amigo seu e depois de algumas negociações o acordo é firmado.
Assim, Elliot Tiber salvou um dos movimentos mais marcantes da história norte-americana. Woodstock é tido até hoje como um dos momentos que definiu uma geração, não só pela música, mas pela atitude que esse festival trazia. No meio da Guerra do Vietnã, esses jovens foram á uma fazenda no interior dos EUA falar sobre paz, amor e música.
O filme, contudo, não mostra cenas dos shows, que contaram com a participação de Janis Joplin, Jimi Hendrix, The Who e muitos outros. Por quê? A intenção dos roteiristas e do diretor, o afiado Ang Lee, era fazer algo novo, que não ficasse na já habitual celebração do evento. O filme quer sim celebrar Woodstock, mas de uma maneira diferente. Tentando fazer quem não viveu aquele momento entender o quanto ele foi importante.
O jeito foi achar um personagem que teve sua vida radicalmente mudada pelo evento. Elliot era um rapaz que já tinha se formado, mas não tinha conseguido sucesso como pintor na cidade grande. Além disso, era homossexual, mas tinha medo de seus pais não aprovarem isso. Seus pais eram um tanto estranhos para ele: sua mãe era uma senhora mal-humorada que só pensava em dinheiro e seu pai um sujeito cansado de tudo que quase não falava com ele. Ele sente na obrigação de ajudá-los, mas percebe que ao ficar ali naquele hotel, agindo como um faz-tudo está apenas afundando mais na vida.
Quando chega o festival á cidade e Elliot entra em contato com o ideal de liberdade que os hippies pregam e começa a curtir intensamente o momento seja descendo uma ladeira de lama ou tendo uma "viagem" com um casal hippie dentro de uma kombi psicodélica.
Ao final do filme, após uma briga familiar, Elliot decide que é tempo de deixar sua vida estagnada para trás. Para seu próprio espanto percebe que conta com o apoio do pai que também parece ter sido ressuscitado com a energia do evento.
A grande mensagem é que esse festival conseguiu fazer o que fez com o Elliot e seu pai com toda uma geração. Milhões de jovens norte-americanos, sejam eles defensores dos direitos civis ás mulheres e aos negros ou pacifistas, tinham percebido que era possível mudar o mundo e estavam colocando as mãos na massa. Esperava-se superar as barreiras do conversadorismo e da paranóia que a Guerra Fria vinha impondo ao mundo e construir um mundo mais pacífico e mais livre. Se não conseguiram isso são outros quinhentos (os quais prometo abordar aqui outro dia), mas o importante é que o filme consegue passar essa mensagem, ele cumpre seu papel.
Ao fim e ao cabo, sente-se um pouco do que foi viver no "loucos" anos 60. Como diria um crítico de cinema, depois de ver o filme dá vontade de ser hippie. Isso só foi possível com o bom roteiro, a direção firme de Ang Lee, a ótima fotografia de Eric Galtier e as interpretações fantásticas do elenco, principalmente de Demetri Martin que faz Ellito e Imelda Stanton como sua mãe. Faltou um pouco de profundidade á outros personagens, como o travesti Vilma e o amigo de Elliot, Billy, mas mesmo assim o filme ficou realmente "beautiful". O final em especial dá uma sensação de que "o sonho não acabou". Recomendo para os interessados em música ou história e, principalmente, para quem gosta de um bom filme.