Harry Potter e as Relíquias da Morte - parte 2

ATENÇÃO, ESTE TEXTO POSSUI SPOILERS.

Em 1997, quando a autora J.K. Rowling lançou o seu Harry Potter e a pedra filosofal, ela não fazia ideia do fenômeno cultural que viria a ocorrer em torno de sua série. Os livros acabaram em 2007, mas os filmes ainda mantiveram o fenômeno ativo, e eis que uma década depois do primeiro longa-metragem, a saga cinematográfica chega ao fim.

“Harry Potter e as relíquias da morte – parte 2” é sem dúvida o filme com mais ação de toda a série, revelando-se uma verdadeira catarse para os fãs. Todo o intimismo da primeira parte é deixado de lado aqui, e são raros os momentos em que não há correria. O ritmo do filme é acelerado, mas isso não é um ponto negativo, pois ele ganha um dinamismo que jamais é desculpa para enfiar cenas mal elaboradas goela abaixo do espectador. Aliás, as cenas de ação, sobretudo, são lindamente executadas. O filme em si é muito bom, apesar de não ser melhor que a parte 1, pois evidentemente não havia como valorizar tantos os diálogos, já que o fundamental era a ação.

A direção de fotografia de Eduardo Serra continua ótima como na primeira parte; seja nos momentos de diálogo (como no 360º usado na cena à beira do lago); seja nos momentos de mais ação (como nos planos que envolvem a batalha dentro do castelo), os movimentos de câmera sempre são usados com fluidez e bastante clareza (destaque para o plano utilizado na cena em que Voldemort destrói a proteção de Hogwarts, quando um travelling se aproxima por trás dele, se transformando num belo Plano Detalhe da varinha).

Os efeitos visuais são de grande qualidade e ajudam a construir toda a grandeza deste momento, que são ressaltados pelo 3D estereoscópico, que embora convertido, foi muito bem empregado; como assisti em Imax 3D, creio que a experiência que tive não foi e nem será a mesma de quem assistir ao filme em salas convencionais, pois vi muitas reclamações em torno do 3D, defeitos os quais eu sinceramente não vi em nenhum momento da projeção, que, aliás, me surpreendeu pela qualidade. Pra se ter uma ideia, em determinadas cenas eu era obrigado a desviar um pouco meu olhar do centro da tela para ver algo se projetando pra fora da tela lá no canto, como os dementadores por exemplo. Sem falar da profundidade insana presente nas cenas como King’s Cross.

A direção de David Yates é segura, como nos filmes anteriores que ele dirigiu, e apesar dele próprio confessar que não gosta de filmar ação, é inegável que ele soube muito bem conduzir toda a ação constante do longa. Seria bem possível Yates acabar trocando os pés pelas mãos, nos entregando uma ação suja, confusa, com cortes convulsivos... Mas não. Ele faz uma ação limpa, coerente, mantendo o mesmo ritmo até o fim.

As atuações nunca foram um ponto forte da série, pois os protagonistas nunca tinham talento suficiente, ou os coadjuvantes de luxo nunca tinham seu espaço devidamente aproveitado; ou ainda os personagens nunca eram explorados com mais profundidade. Na parte 1 já vimos que isso mudou bastante, e tal comprometimento e esforço do elenco é multiplicado aqui neste último. Daniel Radcliffe, Emma Watson e Rupert Grint conseguem transmitir uma humanidade em seus personagens como pouco se vê em adaptações literárias do gênero, demonstrando uma atuação natural, sóbria, até mesmo “elegante”. Já no elenco adulto, o destaque sem dúvida é Alan Rickman e seu Severo Snape, que dá um show de atuação tanto no momento de sua morte (um tanto quanto brutal, diga-se de passagem), quanto nas suas memórias. Rickman faz toda a solidez de seu personagem ruir, mostrando um Snape frágil, desolado, e acima de tudo um Snape mais humano, digno de compaixão.

Esta parte 2, por sinal, é repleta de momentos de emoção. A cena da invasão a Gringotts é espetacular, mesclando tensão, ação, e até humor; sendo talvez uma das sequências mais interessantes de toda a série. Toda a Batalha de Hogwarts é também muito bem executada, seja nos momentos iniciais, seja nos momentos finais, com os duelos ocorrendo incessantemente por todo o castelo. As cenas envolvendo Snape também possuem enorme carga emotiva, e as que envolvem a rendição de Harry na floresta também emocionam; ver Harry tentando tocar a mão da mãe e não conseguir é no mínimo triste. Mas confesso que a parte que mais me comoveu, nem foi uma cena épica, nem uma cena de elevada carga emotiva e com atuações extraordinárias... Não, certamente não. Uma cena simples, a cena do epílogo, quando o trio deixa seus filhos na plataforma 9 e Meia, conseguiu me dar um nó na garganta. Ver eles ali em King’s Cross, ao som da faixa “Leaving Hogwarts”, que fora tocada lá em 2001 no final do primeiro filme, me trouxe uma enorme nostalgia, e então a ficha caiu: Acabou. Não haverá outro.

Entre erros e acertos, é impossível negar a importância da série Harry Potter tanto no mundo da literatura, quanto no mundo do cinema. Durante uma década conseguiram manter o mesmo elenco - com breves exceções como Richard Harris -, e mesmo com as várias trocas de diretores, há uma coesão extremamente forte nesses 8 filmes, apesar de suas diferenças. Nunca na história do cinema conseguiu-se algo parecido.

Agora, tanto tempo depois, os personagens cresceram, os fãs e os atores também. O mundo literalmente mudou, mas algumas coisas se mantiveram intactas. E tudo isso se encaminhou de forma fascinante, para que ao final de Harry Potter e as Relíquias da Morte – parte 2, pudéssemos ver, infelizmente, o Expresso de Hogwarts partir pela última vez.

Jean Carlos Bris
Enviado por Jean Carlos Bris em 18/07/2011
Reeditado em 18/07/2011
Código do texto: T3102595
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