"Tropa de Elite 2 – O inimigo agora é outro"
"Tropa de Elite 2 – O inimigo agora é outro"
Palavra que se eu fosse tradutor de títulos de filmes brasileiros que chegassem na América, pagaria na mesma moeda, entregando o conteúdo logo de cara. Assim, lá “Tropa...” se chamaria The Departed, que significa “O Morto”. Só que, desta feita, o BOPE coloca no caixão ninguém mais ninguém menos que o mau político brasileiro.
Quem seria o culpado deste curioso fenômeno?
Em suma, essa é a nota de 100 (cem), sem mancha de tinta, que o filme dá ao espectador, e chega a ser espantoso que um trabalho com tal conteúdo de denúncia tenha atingido o mais alto grau de satisfação para o artista do meio, desde que inventaram a roda da moviola – ser assistido por um grande número de pessoas. “Tropa...” já tem o selo de MAIOR SUCESSO DO CINEMA NACIONAL DE TODOS OS TEMPOS.
Esse mito com rachaduras interpretado por Wagner Moura – o coronel Nascimento, surfa com destreza no roteiro perspicaz de Bráulio Mantovani e José Padilha e Padilha pratica sem demérito o filme de ação cujo maior mérito é colocar em ação os neurônios da massa de manobra.
Infelizmente os segredos do bangue-bangue ainda estão em mãos ianques – isso deve ser tecnologia de ETs que eles começaram a cambiar em Roswell, já que ninguém no mundo consegue chegar perto, entretanto, o trabalho de José Padilha, seja na direção, seja no co-roteiro, faz um gol de placa filmando com agilidade vigorosa os bastidores da Cosa Nostra tupiniquim, algo sem a finesse do tempero italiano e sem a obrigação quiçá religiosa de, mesmo com as mãos ensangüentadas, dar alguma migalha para os reféns.
Coronel Nascimento abre a película expelindo uma série de conceitos duvidosos sobre eficiência policial e perto do final retoma o diagrama dizendo “matei mesmo, só não sei para quem e em nome de que”.
O lado brilhante da história, ou se preferir o lado artístico, está em como as coisas são apresentadas, praticamente na contra mão da ética para, gradualmente, trazer à baila que os bem intencionados às vezes quebram mais ovos que o necessário e os de intenções tortas são de fato a pior escória que já se viu, dentro e fora das telas.
The Departed... (título original de “Os Infiltrados”) começa no palácio, termina na assembléia e entre um e outro irriga a secretaria de segurança e praticamente toda a PM carioca.
De início o roteiro evoca um personagem difamado pelo Herói Nascimento, o professor de história Fraga, dotado daquilo que os antigos se referiam como retidão de caráter, e ele nos dá uma meia aula tenebrosa sobre a progressão geométrica do sistema carcerário brasileiro, desfiando entre outras que em 2083 teremos 510 milhões de presos – noventa por cento da população. A razão disso o filme vai contar... A metade da aula que faltou vez por outra aparece na mídia: o lúgubre, triste, perverso Brasil Auschwuitz, com suas prisões que são sentenças ao inferno sem direito a morte.
Didaticamente o enredo explica – com atores, locações, figurantes, etc., sobre a implantação das milícias nas comunidades cariocas, seus motivos (yes money, no escrúpulo), seus profissionais (agentes de segurança do estado), retirando qualquer margem de dúvida de que há algo assaz apodrecido no reino.
Enquanto a tela mostra imagens do planalto o Herói de Padilha encerra seu discurso dizendo que o sistema é mais poderoso do que se imagina e que pelo andar da carruagem muitos inocentes ainda irão morrer.
Inda que tudo de mentirinha, em filme americano quem vai pra vala comum são os gringos, item indolor para o olhar estrangeiro, mas em território nacional quem cai pelas tabelas são brasileiros e querendo ou não, a percepção emotiva é outra.
Padilha e Cia. deram ao público 3 valiosos predicados. Primeiro, teceram um trabalho que leva a mil conjeturas, nenhuma delas salutar, sobre os ocupantes de cargos públicos atrelados a votos e mandatos. Depois, inventaram dois heróis impossíveis, (Fraga e Nascimento), mas extremamente bem vindos. Por fim, realizaram um espetáculo digno de nota.