“Fogo contra Fogo” (Heat)

“Fogo contra Fogo” (Heat)

 

 

 

 

Avisando aos navegantes que nunca viram ou esqueceram essas palmeiras (donde não cantam sabiás), a cena do café entre o crime e a lei foi inspirada em evento real do mesmo gênero, ocorrido na época em que Michael Mann ganhava riachos de dinheiro com a série Miami Vice. Com o showbizz acontece assim, ou bem os riachos deságuam em rios caudalosos ou morre-se à mingua.

 

Os bandidos possíveis de Heat são de arrepiar justamente pelo fato de serem possíveis. Eles não se comportam, por exemplo, como os desperados de Soderbergh, (“Onze Homens e um Segredo”), dotados de benevolência e habilidades sobre humanas. Os bandidos de Mann representam o fruto de uma sociedade capaz de produzir seres com algum estofo para, a partir daí, fazerem uso do conhecimento adquirido centrando energia para arquitetar e executar roubos.

 

Lançado em 95, tudo é extremamente correto em Heat, o que o torna singular no gênero e, de acordo com editores experientes de listas cinematográficas Top de Linha, a presente obra tornou-se um cult. Ver para crer.

 

Al Pacino, Robert De Niro, Val Kilmer, Jon Voight, Tom Sizemore e Ashley Judd destacam-se no elenco grande entre nomes menores, figurantes e profissionais reais que desfilam na tela propiciando o entretenimento que se espera do naipe bandido&mocinho. De Niro é o chefe dessa mini máfia onde a violência fortuita não tem lugar, a menos que seja imprescindível e Pacino o policial workaholic encarregado de detê-lo. Tipos manjados em 2011, todavia é a performance de cada um nesse ponto específico da linha do tempo que consagra o trabalho como um todo.

 

O design do primeiro assalto (que já tentaram por aqui, há um par de anos, sem sucesso), o café entre De Niro e Pacino, a maneira como De Niro decide exterminar um membro que fora recrutado de última hora e assassinou um segurança de carro forte sem o menor motivo – a cena acontece num estacionamento e o sujeito desaparece por debaixo dos carros.

 

Os significados de Heat, no dicionário Webster, vão a mais de 30 e atiram para vários lados, sendo talvez, o mais acertado deles “ponto culminante de qualquer ação”.

 

É sabido que Michael Mann pesquisa exaustivamente os tipos enfocados na trama, ninguém ali é de primeira categoria, tampouco de quinta, são seres medianos que vivem na onda do “ou dá ou desce”, e o cinema nesse caso não verte sobre a corja glamour algum, somente joga uma lente de aumento em situações pertinentes a cada um deles.

 

Este policial Pacino, dos melhores que ele já fez, tem problemas pessoais de sobra e vive absolutamente focado em montar o quebra cabeças da vez.

 

Jon Voight, a eficiência personificada, ele vende com maestria o gajo de pouca fala e muita perspicácia. Sizemore, o bom ladrão e Kilmer, o ladrão com sérios problemas domésticos. Mann humaniza essas figuras de modo que os lados A e B apareçam para a platéia com milimetrada harmonia. Coisa de artista.

 

A L.A. de 1995, seus subúrbios, viadutos, vicinais, metrôs e restaurantes está arqui documentada nos 140 minutos de filme, bem como o misto de filosofia perene com jargão caminhoneiro, pelo menos para esse estilo de vida – “não crie vínculos que não possam ser desfeitos em 30 segundos”.

 

Bom cinema sempre tem coelhos na cartola, e mesmo envelhecidos pelo inexorável só caem em desuso se o artífice fez de qualquer jeito. Não é o caso. O clima cinematográfico de Heat, do começo ao fim, é uma célula isenta de pecados.

 

Bernard Gontier
Enviado por Bernard Gontier em 30/05/2011
Reeditado em 06/11/2021
Código do texto: T3003719
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