QUEM QUER SER UM MILIONÁRIO?

A História da Índia não se parece nem um pouco com a do Brasil. A cultura também. Há diferenças fundamentais entre o que os hindus e brasileiros pensam e querem da vida. Mas há muitas coisas que parecem semelhantes. Quem assistiu o filme Quem quer ser um milionário? não pode deixar de notar certas similitudes entre os dois países. Por exemplo, as favelas. Outro exemplo, o preconceito da gente bem com quem nelas vive. Outro exemplo; os programas de televisão.

Quem quer ser um milionário é um programa tipo Poço dos Milhões, que Silvio Santos apresentava nos anos oitenta. Um programa de perguntas sobre cultura geral, que á medida que vão sendo respondidas vai aumentando o valor do prêmio para a pessoa que dá as respostas. O problema no caso é: como é que um menino da favela, supostamente ignorante, conseguiu entrar no programa e pior, dar as respostas chegar para chegar ao topo do jogo televisivo que confere o prêmio máximo do programa. O apresentador não acredita. Os produtores não acreditam. A polícia acha que o garoto tem algum esquema criminoso que lhe fornece as respostas. Daí que, à poucas respostas do prêmio máximo, ele é preso e torturado para confessar o suposto esquema.

Jamal é o garoto da favela que consegue levar os telespectadores ao delírio e os produtores e a polícia ao desespero. Todavia, o “esquema” de Jamal é simplesmente uma pilha de âncoras que ele vai disparando ao longo do programa, âncoras essas constituídas de associações que ele faz com fatos de sua sofrida vida as perguntas que lhe são feitas. Nascido numa família muçulmana, juntamente com seu irmão, ficou órfão logo na infância. É das traumáticas experiências da sua vida de infância e adolescência, se utilizando dos mais diversos e bizarros expedientes para sobreviver, muitas vezes resvalando para a marginalidade, que ele vai vivendo, como uma espécie de Forrest Gump hindu, os acontecimentos da sua vida e associando-os com fatos da política, da História e do jet set internacional, de uma maneira geral.

Os expectadores brasileiros não poderão deixar de sentir, pelo menos no começo do filme, uma certa semelhança com o nosso Cidade de Deus. Mas é apenas uma impressão inicial, provocada talvez pelos flashes backs mostrados rapidamente, como no clássico do cinema brasileiro. Aqui também a pobreza é apresentada através de uma forma que não provoca repulsa, pois equilibra humor, drama e violência com muita naturalidade.
A violência, não por acaso, vem da polícia. Ela quer saber como foi que um moleque como aquele conseguiu chegar tão longe no programa onde ninguém, salvo o próprio apresentador, jamais conseguira chegar. Seria apenas sorte? Ou o garoto é um gênio? Ou, o que eles realmente acham, um trapaceiro? Interrogado com violência e tortura, Jamal responde as perguntas dos policiais usando a mesma fórmula utilizada para responder no programa de TV. Ele conta a história da sua infância. Sua vida de órfão muçulmano, ao lado de Salim, seu irmão e a pequena Latika, sua grande paixão desde a infância. Os policiais jamais acreditariam que para responder às perguntas da TV e da polícia, Jamal está contando a sua própria história de vida.
Como em Forrest Gump, cada momento da sua vida está associado a um acontecimento no mundo. Ele é como um joguete do destino. E através dessas associações ele vai respondendo e acertando as respostas, e ao mesmo tempo, deixando os policiais cada vez mais confusos.

Embora todo o enredo do filme gire em torno do programa e da emoção que vai aumentando á medida que o jovem favelado vai se aproximando do cobiçado prêmio de 20 milhões de rúpias, o prêmio máximo do programa, que anteriormente só havia sido atingido pelo próprio apresentador do programa, o filme não é uma espécie de conto de fadas tipo Cinderela, ou Aladim, onde o menino pobre consegue afinal, o seu tesouro. Na verdade, trata-se de uma história que fala de amor e destino. Uma aventura kármica bem própria da cultura oriental, onde o destino é implacável, ainda que percorra os mais estranhos e difíceis caminhos para realizar seus propósitos.
Como diz o próprio Jamal a um turista (pois que até guia de turismo o menino foi. A cena em que ele conta a história de amor do sultão que construiu o Taj Mahal é realmente hilária), Quem quer ser um milionário é um passeio pela verdadeira Índia moderna, com seus contrastes, sua história, sua cultura, suas dificuldades e suas esperanças. Mereceu os oito Oscars que ganhou, pois é realmente um senhor filme.


João Anatalino
Enviado por João Anatalino em 18/01/2011
Reeditado em 18/01/2011
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