“Tudo pode dar certo” (Whatever Works)
“Tudo pode dar certo” (Whatever Works)
O velho e bom Woody, ele te deixa um tanto atarantado(a) nas preliminares, chega-se a pensar no declínio irrevogável da verve, ou então que a tela exibe somente uma massa pasteurizada sem atrativo algum para jovens de antanho, reservando alguma serventia para jovens de agora e olhe lá, mas, cuide-se, o leão não está completamente banguela e a peça teatral proposta te surpreende.
Larry David faz Woody, cujo intelecto parece nunca ter envelhecido e ao mesmo tempo nunca ter sido jovem ou mesmo jovial, desde os 70 a hipocondria, o cinismo e a desilusão incorporam seu repertório, são fixações desse artista, mas aqui Woody sabe as respostas e finca os dois pés na Nova Era – transformação, ainda que tardia, é o melhor remédio.
O Larry David que personifica Mister Allen puxa uma perna, foi indicado para o prêmio Nobel de física, tem 58 anos, lava as mãos sistematicamente, tentou se matar 3 vezes, detesta sexo – “afinal, o que significa aquele malabarismo todo, só para procriar mais idiotas(?)” e o destino virá bater à sua porta na forma de uma bela jovem sem teto e culturalmente incompatível com seu saber majestoso.
Tudo é farsesco em “Whatever ...”, a metralhadora giratória de Allen, que começa nas cansativas teclas de cristianismo, judaísmo, racismo, etc., ganhou novos timbres nessa peça, que se sobressaem através de inocentes diálogos e por fim toda crítica proposta – seja ela sócio-cultural, econômica, religiosa, política, e o que mais seja permissível incluir no balaio, desemboca no patamar da existência.
David tem ataques de pânico, canta “parabéns à você” quando lava as mãos, Evan Rachel Wood, a sem teto, termina absorvendo o raciocínio ácido de seu mentor, eles se casam, um belo dia a sogra aparece e ao se deparar com o genro – careca, decadente, de camiseta regata e chinelos ela cai para traz. David indaga se ela preferiria que a filha tivesse se casado com o Campeão da Pesca de Bagre no Mississipi, ela retruca: seria melhor se minha filha tivesse se casado com o próprio bagre.
Todos os envolvidos na trama estão na toada de jogar fora velhos conceitos em nome da tão almejada felicidade. Allen propõe que essa mudança ocorra num piscar de olhos, afinal essa é uma comédia leve e não dirigida por um amador querendo o sucesso a qualquer preço, valendo lembrar em qualquer tempo que os altos e baixos do presente diretor estão acima do medíocre lusco fusco reinante.
Allen insiste em dizer que estamos sós na caminhada, que não existe nada além da nossa própria determinação (e sorte), o que vai na contramão dos adeptos da Convergência Harmônica, que pregam o contrário, que tudo é uma confluência de energias e que nossa realidade não passa de um sonho a ser desfeito de uma hora para outra.
Seja lá o que for, a premissa do diretor começa pelo título original, talvez seja o também músico Woody Allen dando o tom – qualquer coisa que você faça pela sua felicidade - e pela do próximo - vai funcionar.
Verdade infalível em qualquer plano.