K-PAX Um olhar sobre a realidade e ficção
"O inconsciente é muito exatamente a hipótese
de que a gente não sonha apenas quando dorme."
J. Lacan, Une pratique de bavardage.
O que é real ou ficção? K-PAX é um filme de fato intrigante em sua totalidade e nos força a questionar acerca da linha ínfima que separa a realidade da ficção; nos leva a busca da nossa própria identidade através do entendimento da nossa existência e do que fazemos dela.
Prot, interpretado por Kevin Spacey, é um homem inofensivo que após uma confusão numa estação em New York foi detido ao tentar ajudar uma senhora vítima de assalto e encaminhado a um hospital psiquiátrico público por seu estranho comportamento ao falar da sua origem: o distante planeta K-Pax. No hospital ele conhece o Dr. Mark Powell (Bridges) com quem cria uma forte interação e relação de amizade. Prot explica que veio de K-Pax, um planeta distante mil anos luz da Terra, viajando através da poderosa energia da luz, e seus conhecimentos em astronomia e supostas contribuições nas curas dos outros pacientes insanos do hospital conseguem confundir o psiquiatra que acaba considerando-o como o mais convincente dos loucos (ou não?). O Dr. Powell recorre então a sessões de hipnose com Prot e consegue descobrir informações importantes sobre seu passado obscuro que podem esclarecer a verdade. Interessante observar que o próprio médico começa a achar que seu paciente fala a verdade.
A eterna dúvida sobre a real identidade de Prot permanece durante todo o filme, podendo ter uma dupla interpretação no final. Faltou ainda descobrir o segredo da real identidade do simpático Prot, alienígena ou louco? O que é normal e o que é patológico? São complexas inquirições que também são feitas no campo da vida.
Tudo é real a partir do momento em que existe crença no fato. Prot acreditava que era real toda a história que narrava aos outros e por isso falava com tanta convicção; Powell não cria, por isso para ele Prot era mais um paciente como os outros, porém quando começou a duvidar do que de fato era real ele abriu brechas em sua consciência para desconfiar que o mundo de Prot não era tão irreal, tão imaginário assim.
Para se ter uma idéia do quanto é fato tudo isso, basta olhar à volta e ver que tudo quanto existe hoje veio da mente imaginária de alguém que cria na possibilidade de concretizar suas idéias tornando-as parte da vida real como a energia elétrica: meios de transportes movidos a combustível (inevitável lembrar de Julio Verne como se estivesse preconizando a era moderna em suas obras), o telefone (hoje mais moderno e menor), o computador e tantas outras coisas que antes nem se imaginava ser possível existir. Tudo então depende da ótica utilizada para perceber o que se passa ao redor e processar as informações que farão parte da convicção ou não do que se é percebido.
Gilbert Durand, antropólogo e pensador francês, discípulo do filósofo Gaston Bachelard, influenciado pelos trabalhos psicanalíticos de Jung e Piaget, tratou com propriedade a temática do Real e Imaginário, resgatando a questão da desconsideração do simbolismo, do misticismo sem religiosismo. “A verdade estaria nos fatos – no real concreto. Como o real concreto é aquele que se apresenta materialmente à nossa percepção, há uma deslegitimação do simbólico, que fala do impalpável. (DURAND, 1998)”.
Diante destas colocações e relacionando-as com o filme exibido em sala de aula, conclui-se que o real e o imaginário, ou ficção, ou o que se queira definir, é algo que depende da percepção de cada um acerca da realidade onde se vive, onde se pensa, onde se constrói enquanto ser humano. Eu seria óbvia se falasse em ficção, partindo do pressuposto de que outros mundos habitados ainda não foram detectados, divulgados pela ciência, mas estaria negando a possibilidade de ser real, de ser um fato possível, mas que ainda não foi detectado pela ciência convencional. Portanto, creio que o que está na mente de um ser humano é tão real para ele quanto o que está diante de seus olhos e que um bom entendedor, compreenda essas palavras...