“Amor à primeira vista” (Falling in love)
“Amor à primeira vista” (Falling in love)
Ulu Grosbard dirigiu essa obra que prima em 1984. Pensa um pouco, 26 anos atrás, de lá para cá o manancial inesgotável do cinema foi lavado, passado, desbotado, triturado e lançado no caos tantas vezes quanto seja possível imaginar e mesmo assim ainda nos reserva surpresas, cândidas surpresas.
Robert De Niro e Merryl Streep protagonizam o par perfeito do amor perfeito, numa América ainda livre do ranço do coturno instituído e o próprio mundo ainda acreditava na possibilidade da levitação por meio de um beijo, um abraço e um aperto de mão.
Ulu vem da Bélgica e do teatro, a lista de sua filmografia é do tamanho de um colibri, seu último filme – “Nas profundezas do mar sem fim” foi rodado há 11 atrás. Muito oportunamente dizemos, Ulu realizou um trabalho prestimoso sobre o roteiro do craque Michael Cristofer, responsável, entre outras, por “Fogueira das Vaidades” e “As Bruxas de Eastwick”. Detalhe, tais peças são as de evidência comercial, pois esse dramaturgo/roteirista, ator e produtor já faturou Pulitzer e outras faturas em trabalhos de alto teor cultural.
De Niro e Streep trocam um aperto de mão numa livraria em NY. Vão trocar um abraço três meses depois. Com mais três meses vão consumar um beijo e não passarão dessa etapa. Sentirão falta um do outro sem saber o motivo.
Pensa um pouco. Houve um tempo em que crenças descabidas gostavam de tagarelar que “dicionário é o pai dos burros” e que o amor está dentro da gente, as pessoas são apenas um pretexto. Quaisquaisquais. Então você é burro se não sabe o que significa açafate, e seu coração é apenas um bombeador de sangue e sua contrapartida etérea funciona como um estomago: ora, se não tem anchovas como lambari e está tudo acertado.
De Niro e Streep são casados com outros cônjuges, vivem suas vidas com os respectivos na temperatura Tropical Médio, ambos atuam como profissionais liberais, ele tem dois filhos, ela perdeu uma garotinha após o parto, os trens que ligam Nova Iorque aos subúrbios nunca esbanjaram tanto viço, há uma doçura em Streep que não é interpretação, faz parte dela e não se perdeu no decurso.
A pedra de toque de “Falling in love” está na maturidade do tratamento. Apelações voltadas para exploração do adultério e suas conseqüências passam ao largo da paleta da dupla Ulu/ Michael, muito em virtude de se tratar de dois veteranos devidamente educados. Ulu nasceu em Antuérpia em 1929. Chegou na Universidade de Chicago depois de ter sido cortador de diamantes por um bom tempo. Na década de 60 ele ganharia o premio Tony de melhor diretor da Broadway. Em 84 ele angariava a tarimba certa para abordar a coisa mais misteriosa de todos os tempos, o vulgo amor.
De Niro e Streep passeiam, almoçam e jantam, conversam. Sentem uma saudade um do outro inexplicável. Ficarão juntos pelo melhor dos motivos: a nossa nada vã necessidade de acreditar num amor que comece e termine no lado esquerdo do peito.