Tropa de Elite 2 - O inimigo agora é outro

Quando José Padilha confirmou uma continuação para o seu sucesso “Tropa de Elite”, confesso que me desanimei. Acreditava eu, que se tratava de mais uma tentativa mercenária de lucrar dinheiro em cima do sucesso e da qualidade do primeiro filme, e eu duvidava que o resultado poderia ser bom, apostando em um segundo episódio totalmente fracassado. Porém, depois de assistir ao “Tropa de Elite 2 – o inimigo é outro”, tenho o prazer de admitir que eu estava totalmente enganado.

Na trama desse segundo filme, mais de uma década depois do primeiro, encontramos um Roberto Nascimento que agora é Tenente-Coronel do BOPE, que se separou de sua mulher e vive uma relação difícil com seu filho adolescente. Em meio a tudo isso, ele tem que encarar de frente o problema da segurança pública no Rio de Janeiro, mas agora de uma outra perspectiva: como Sub-secretário de segurança.

Tropa de Elite 2 é acima de tudo um filme mais maduro que seu original. Não se trata de uma mera continuação, mas sim de uma evolução, de uma virada de mesa em tudo que Padilha tinha exposto no primeiro filme. E boa parte disso se deve ao belíssimo roteiro escrito pelo próprio José Padilha em parceria com o genial roteirista Bráulio Mantovani (Cidade de Deus). Se antes tinhamos certeza do caminho a se seguir para combater a criminalidade, agora aquele caminho se torna mais incerto.

A parte técnica é sensacional, se igualando (e até ultrapassando) vários filmes americanos do gênero. A direção não poderia ser mais segura, com cenas sólidas que trazem um tom severamente real. Os efeitos especiais dão outro show – Padilha chamou a equipe de efeitos de “Falcão Negro em Perigo” de Ridley Scott – e toda a ação mostra um nível raro de se conseguir no cinema nacional. Além disso, outro aspecto que deve ser elogiado é a bela fotografia, com seus planos sempre bastante esclarecedores e seus belos sobrevoos de câmera.

Vários personagens retornaram do Tropa de Elite original e mais um punhado deles é adicionado na trama, entre eles o personagem Diogo Fraga, interpretado de forma impressionante pelo ator Irandhir Santos, que cria um personagem com várias camadas de profundidade. Fraga é na realidade o contra-ponto ao Coronel Nascimento; ele é um homem que busca por meio da legalidade, sem violência, combater as mazelas da nossa sociedade, e é um ferrenho crítico da polícia, em especial do Batalhão de Operações Especiais. Diogo Fraga é apresentado ao público como um “intelectualzinho de merda”, como diz o próprio Nascimento, mas com suas atitudes consegue ir aos poucos ganhando o gosto do espectador - principalmente na parte final - por ser uma saída limpa no meio da sujeira que cerca o longa.

Mas não pensem que esse filme é um exemplar “politicamente correto”, longe disso! Ele mantém as suas convicções, mas tudo é elevado a um patamar bem maior, em todos os sentidos. Vemos a carnificina dentro de Bangu I, a ação sanguinária da milícias dentro das favelas e claro, as atitudes traiçoeiras do meio político.

Alías, concordo quando dizem que esse filme deveria ter sido lançado antes das eleições para deputado estadual e federal, pois o impacto que o longa causa em quem assiste poderia ser capaz de mudar o rumo das votações.

Mas em Tropa de Elite ninguém é melhor que o maior anti-heroi do cinema brasileiro. Wagner Moura mais uma vez encarna o policial problemático, mas desta vez ele faz tudo com uma maestria digna de aplausos. Se no primeiro viamos um Capitão Nascimento de postura ereta e voz viva e agressiva, agora vemos um Coronel Nascimento de postura curvada e voz cansada. Nascimento está mais velho, mas seus questionamentos sobre o Sistema e seus problemas pessoais estão maiores ainda. Ao jogá-lo fora de sua área de trabalho, colocando-o como Sub-secretário da segurança carioca, o personagem ganhou mais complexidade e passa mais complexidade para o longa, pois suas próprias ideologias são montadas e desmontadas durante todo o filme. Com uma teia de tramas muito bem tecidas, Tropa de Elite 2 vai crescendo a cada minuto, até que no terceiro ato o Coronel Nascimento gera um instante de catarse ao povo brasileiro, ao espancar um político corrupto. Ali sentimos toda a intensidade do personagem, sentimos vir à tona a raiva que ficara contida todo aquele tempo. Uma atitude que sem hipocrisia, todo brasileiro comum gostaria de tomar.

Ao final temos cenas geniais que terminam de abrir os olhos até do espectador mais alienado, e a cena da câmera sobrevoando brasília, com a narração em off de Nascimento é um exemplo disso. Diante da constatação sombria do personagem, sentimos a mesma impotência que ele, mas também aguçamos nosso senso crítico.

Tropa de Elite 2 é sem dúvida o melhor filme do cinema brasileiro e uma das grandes produções no cenário mundial. Um filme cru, direto e verdadeiro, que toca na maior ferida de uma nação. Depois de uma sessão de Tropa de Elite 2, vale também fazermos uma outra constatação – esta bem mais animadora: o cinema brasileiro nunca foi tão bom.

Jean Carlos Bris
Enviado por Jean Carlos Bris em 17/10/2010
Reeditado em 30/10/2010
Código do texto: T2562249
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