"Sherlock Holmes"
A Madonna será sempre a Madonna, não interessa com quem esteja casada ou deixe de estar, mas o Guy Ritchie só voltou a ser o Guy Ritchie de "Snatch" depois do divórcio com a rainha do pop e da cartilagem. A crítica não é unânime mas eu acho que finalmente temos um bom filme do senhor que nos trouxe "Porcos e Diamantes" e ainda por cima num produto que é claramente de estúdio. Já com trezentos milhões de bilheteira arrecadados, preparem-se as pipocas para uma trilogia. "Sherlock Holmes" é acção, humor, aventura, mistério, faltando-lhe talvez um romance com maior substância para completar o pentagrama evocativo do blockbuster perfeito.
E, apesar de tudo, Ritchie mantém o protagonista bastante fiel à criação literária do seu autor. Difícil dizer se Sir Arthur Conan Doyle aprovaria a escolha de Robert Downey, Jr. para desempenhar o detective de Baker Sreet, porque o Sir está morto há bastante tempo e desde então se tornou parco de palavras, mas Downey, Jr. é hoje em dia uma aposta ganha à partida. A pronúncia inglesa podia ser mais cerrada. Nada a temer, até porque para aquela pronúncia mais genuína temos Jude Law, um actor que me lembro de ver sempre em papéis irritantes e que aqui rouba todas as cenas em que entra, e mesmo algumas em que não aparece, como Dr. Watson, o fiel sidekick de Holmes. Rachel McAdams é Irene Adler, ex-amante americana de Holmes, esse ex agora já bem esfriadinho, e o elo mais fraco do filme. A moça não tem grande presença ou carisma, mas ainda não descolou da testa o selo de "estrela em ascenção", e o ter entrado neste filme talvez ajude a manter bem pespegado esse epíteto durante mais algum tempo. Mark Strong (actor inglês que aqui faz lembrar Andy Garcia), é o vilão de serviço, Lord Blackwood. Mas por trás dele movimenta-se nas sombras a nemesis de Holmes, o terrível professor Moriarty, cujo rosto nunca chegamos a ver na esperança que os executivos têm de contratar um nome bem sonante para interpretar a personagem numa futura sequela. Pessoalmente faço figas para que contratem Hugh Laurie.
Este primeiro filme anda à volta da caça implacável que Holmes dá a Lord Blackwood, um assassino em série envolvido em rituais sobrenaturais a fazer lembrar os horrores de Jack, o Estripador. O enredo é algo simples mas dispõe deliciosos momentos de puzzle solving bem conseguidos com montagens rápidas a fazer lembrar flashes CSI-escos (menos do meu agrado mas que servem como engenho exposicional válido). Os segmentos de flashbackward e flashforward na narrativa exemplificam de forma inteligente os meandros da mente analítica do detective de Conan Doyle graças a técnicas de slow motion - speed motion (muito chegadas ao coração do realizador). Embora o ritmo do filme seja muitas vezes interrompido por diálogos extensos, as cenas de luta e perseguições são mais que muitas e Guy Ritchie volta a provar que sabe filmar sequências de acção, conseguimos perceber o que está realmente a acontecer. Até porque momentos há em que Holmes explica volta e meia o que vai fazer a um adversário antes de realmente fazê-lo (toque genial).
As grandes cenas de "Sherlock Holmes" espalham-se por isso ao longo do filme até chegarmos a um final sem grande alarido, quase anticlimático, mas que dá a deixa para a continuação do que se quer seja mais uma trilogia. Se ao menos eu gostasse de pipocas...