“Amantes” (Two Lovers)

“Amantes” (Two Lovers)

Preâmbulo para as moças:

Imagine se, na noite do reveillon, seu namorado aparecesse com um anel de noivado e, ao lhe dar, vertesse lágrimas e pegasse em suas mãos ardorosamente. Qualquer moça, inclusive essa, Vinessa Shaw, devidamente apaixonada, se derreteria mediante a surpresa do inusitado anel e do agora noivo Joaquin Phoenix.

Mal sabe ela.

Joaquim estava aos pés de Gwyneth Paltrow e de malas prontas para S. Francisco. O anel era para ela.

Para quem está assistindo, tudo parece funcionar bem com Joaquim, exceto uma coisa com 4 letras: cuca.

Joaquim tem umas descompensações.

Gwyneth Paltrow idem.

“Amantes” = nem água com açúcar, nem dramalhão, contando ainda com uma peculiaridade: você não fica se perguntando se eles seriam felizes em S. Francisco embora o filme tenha força suficiente para imprimir essa questão.

Com uma árvore de natal aqui, outra ali, mais a Isabella Rossellini como mãe do Joaquim – um sujeito que joga as toalhas no chão e tira belas fotografias, mais a vizinha Gwyneth Paltrow, com hábitos psicoativos e conseqüentes picos de euforia e tristeza, mais seu amante austero e abonado, o filme flui com linguagem moderna sem nenhum apelo e os elementos descritos não funcionam no pejorativo, apenas mostram a sintonia de cada um.

Que se diga de passagem, ama-se em qualquer sintonia.

Em hipótese alguma você vai encarar o Joaquim como um canalha ou um cafajeste mas, e tão somente mas, um cara que ao longo do breve curso perdeu um parafuso lá, outro acolá, carrega um semblante triste e esconde cicatrizes nos pulsos por conta de um amor desfeito.

Vinessa dará para ele um par de luvas e lhe dirá: você não é como essas pessoas que fingem ser o que não são.

O pai de Vinessa perguntará para ele: você é um fucked up?

(estúpido, confuso, incapaz de pensar com clareza).

Ele responde mais com os olhos e depois nega com a cabeça. Pessoas querem respostas sobre o óbvio na crença de que uma única palavra mudará o curso das coisas.

James Gray dirige, co-escreve e co-produz. Tiro o chapéu para James Gray, desenvolveu um entretenimento com boa plástica em NY e arredores, que se desloca como roda de bicicleta num piso aplainado.

“Two Lovers” não derrapa, cria uma única situação de tensão (sugerida) em virtude do emocional fora de prumo da dupla Phoenix/Paltrow, a sugestão passa e a tensão se dilui nas águas que Phoenix mais uma vez gostaria de ter saltado, para se livrar das emoções agigantadas. Algumas pessoas sentem, ou tem uma maior percepção desse agigantamento. Quem pode responder?

É quando ele acha a luva, momento em que espectador e personagem fazem a mesma indagação: que objeto é esse? À noite, na beira da praia, o objeto ganha contornos e traz Joaquim para a realidade. Naquele instante em que nada faz sentido, algo havia caído de seu bolso.

Biscoito fino, esse elemento de linguagem. Usado, sim, porém não surrado. Pouca gente faz isso acontecer com essa apurada simplicidade.

Gwyneth Paltrow desempenha como se espera: nota 12.

A sinopse oficial noticia tratar-se do filme de despedida de Joaquin Phoenix. Se vero for, o público perde um talento.

Enfim, ele acha a luva, encara-a por uns instantes, e volta para a festa de reveillon. Amigos, pais, futuros sogro e sogra e Vinessa Shaw estão por lá. Nem perceberam que ele havia dado uma saída.

Pois é como se diz, longe dos olhos, longe do coração.

Bernard Gontier
Enviado por Bernard Gontier em 16/12/2009
Reeditado em 24/01/2013
Código do texto: T1981518
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